Neste artigo, exploramos como os atos falhos se manifestam na era digital, revelando aspectos do desejo reprimido e da linguagem do inconsciente nas redes sociais. A partir de conceitos freudianos e lacanianos, discutimos como o ambiente online expõe deslizes que dizem muito sobre os conflitos internos do sujeito contemporâneo.
Atos falhos e vida digital
Vivemos uma era em que a vida se desenrola diante de telas. Publicamos, curtimos, comentamos e compartilhamos em tempo real tudo aquilo que pensamos, sentimos e, por vezes, até o que preferiríamos não deixar escapar.
A rotina digital se transformou em uma extensão do nosso mundo interno, e é curioso perceber como, mesmo em meio a tanta racionalidade aparente, o inconsciente encontra caminhos sutis para se manifestar.
Neste contexto, os chamados atos falhos, que Freud analisou com tanta profundidade no início do século 20, continuam vivos. Só que agora ganham novas formas, adaptadas ao ambiente das redes sociais.
Desejo reprimido e censura psíquica
Freud já nos dizia, em A Psicopatologia da Vida Cotidiana, que o inconsciente se expressa não apenas em sonhos ou sintomas neuróticos, mas também nas pequenas falhas do dia a dia: um nome trocado, um objeto esquecido, uma palavra engolida ou mal colocada.
Esses deslizes, ao invés de simples erros, carregam significados profundos, pois nascem da tensão entre o desejo reprimido e a tentativa de controle da consciência.
Hoje, quando alguém “curte sem querer” a foto do ex, envia uma mensagem comprometida no grupo errado ou publica um desabafo fora de hora, estamos diante de novas roupagens desses velhos conhecidos da psicanálise.
Redes sociais como palco do inconsciente
O mais interessante é que as redes sociais potencializam esse fenômeno. A rapidez com que nos comunicamos, aliada à impulsividade típica do mundo digital, faz com que a censura do ego nem sempre tenha tempo de barrar o que o inconsciente deseja dizer.
E não falo aqui apenas de usuários comuns. Artistas, políticos, influenciadores e empresas também protagonizam gafes que, sob um olhar psicanalítico, estão longe de ser meros descuidos técnicos.
O famoso “foi sem querer” muitas vezes revela algo que, lá no fundo, queria sim ser dito, mesmo que de forma disfarçada.
Psicanálise e escuta dos deslizes
É claro que nem tudo pode ou deve ser interpretado como um ato falho. Mas a psicanálise nos convida a escutar além da superfície, a buscar sentidos onde normalmente vemos apenas ruído. E, nesse sentido, o mundo digital oferece um prato cheio.
Basta pensar na quantidade de “posts impulsivos” que depois são apagados, nas indiretas que escorrem pelos stories ou nos comentários atravessados que geram conflitos.
O inconsciente, como já nos ensinou Lacan, é estruturado como uma linguagem. E nas redes, ele continua falando, mesmo quando achamos que temos o controle total do que estamos dizendo.
A persona idealizada e os deslizes
Essa exposição constante também tem implicações importantes na construção do nosso ego. O desejo por aceitação, curtidas e validação externa alimenta uma imagem idealizada que muitas vezes está em desacordo com quem realmente somos.
Isso cria uma tensão interna que pode facilitar ainda mais o surgimento de deslizes. Ao tentar manter uma persona perfeita, o sujeito acaba permitindo que o inconsciente encontre brechas.
E quando o erro aparece, seja em forma de post inapropriado, seja numa resposta atravessada, surge o mal-estar, a vergonha ou até o “cancelamento”.
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Negação e responsabilidade psíquica
Nesses momentos, o que se vê muitas vezes é a negação: “não fui eu”, “alguém hackeou minha conta”, “foi a assessoria que postou”. Em outras palavras, tentativas de afastar a responsabilidade por aquilo que foi dito ou revelado.
Mas, se levarmos a psicanálise a sério, sabemos que esses deslizes não são por acaso. Eles falam de nós. Falam dos nossos desejos, das nossas angústias, dos nossos conflitos não resolvidos.
Superego punitivo e sofrimento psíquico
Além disso, o ambiente digital também modifica a relação com o superego. A cobrança por desempenho constante, a comparação com os outros e a exigência de coerência absoluta alimentam um superego punitivo, que não dá espaço para o erro ou para a ambiguidade.
Isso gera sofrimento, ansiedade e, muitas vezes, bloqueios criativos. Em vez de estimular a reflexão, o medo de errar paralisa. E mesmo assim, erramos, porque somos humanos e porque o inconsciente insiste.
A demanda de amor no sujeito digital
Outro ponto importante é que, muitas vezes, por trás de uma postagem polêmica, de uma exposição exagerada ou de uma agressividade disfarçada de opinião, está uma demanda de amor: conceito tão bem explorado na fase inicial do processo analítico.
Assim como na entrevista preliminar em psicanálise, onde o analisando chega com uma demanda de cura, mas muitas vezes está apenas querendo ser ouvido, o sujeito digital também pede escuta. Mesmo que esse pedido venha disfarçado de provocação.
Escutar o inconsciente online
Vivemos num tempo em que todos querem falar, mas poucos estão dispostos a ouvir. E o inconsciente sofre com isso. Ele grita nas entrelinhas, nos erros de digitação, nos posts apagados, nas frases contraditórias.
Cabe a nós, enquanto psicanalistas ou aprendizes da escuta analítica, saber ler esses sinais. Não se trata de julgar, mas de compreender. De transformar o erro em possibilidade de sentido. De acolher a falha como parte do sujeito.
Atos falhos como linguagem do tempo
Em resumo, os atos falhos continuam a existir, só mudaram de palco. Se antes estavam restritos à fala e à escrita privada, hoje estão expostos publicamente, sujeitos à interpretação (e ao julgamento) de milhares de pessoas.
A psicanálise segue sendo uma ferramenta poderosa para compreender essas manifestações, nos ajudando a perceber que, mesmo em meio à tecnologia e à pressa do mundo digital, o inconsciente continua operando, criando suas próprias formas de dizer o que não pode ser dito.
Atualidade do inconsciente
E talvez essa seja a grande beleza da teoria freudiana: sua capacidade de atravessar os tempos, de se reinventar junto com a cultura, sem perder a essência.
O inconsciente, como força estruturante da subjetividade, segue encontrando caminhos, mesmo que hoje esses caminhos passem por redes wi-fi, aplicativos e hashtags.
Escutá-lo, mesmo em sua linguagem torta, segue sendo um desafio. Mas também, talvez, uma das chaves para compreender o sujeito contemporâneo em sua complexidade mais profunda.
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Esse artigo foi escrito por AMANDA BONEQUINI FAVORATTO, possui 19 anos de experiência no varejo e nos últimos 12 anos atuou como gestora de grandes marcas a nível nacional, com diversas formações em desenvolvimento humano, Administração de empresas e experiência do cliente, sendo multiplicadora do método Disney no Brasil com a formação oficial em Liderança de Excelência pelo Disney Institute de Orlando, atualizada em 2023 e já atuou também como staff de Anthony Robbins. Ela é mentora, Palestrante, treinadora e também detentora dos métodos exclusivos do CICLO DO ENCANTAMENTO e COMO TRANSFORMAR SEUS CLIENTES EM FÃS®