Vamos falar sobre a educação e formação da personalidade, representados pelo id, ego e superego. São representações da impulsividade, da racionalidade e da moralidade; bem como o conceito de aprendizagem baseado na Psicologia Cognitiva a fim de fazer uma relação de como a formação – em específico do ego – influencia positivamente ou negativamente na construção da aprendizagem do sujeito.
A educação e formação da personalidade
Este aspecto é relevante porque na sociedade atual percebemos que muitos problemas de aprendizagem não encontram justificativas em transtornos do neurodesenvolvimento, trazendo à tona discussões de como a escola deve proceder para ajudar o aluno a alcançar êxito em sua aprendizagem escolar, bem como qual seria a origem da dificuldade escolar.
Como hipótese, partimos do princípio que a aprendizagem do sujeito pode sofrer interferências da formação do ego, a partir dos significados que o sujeito atribuiu aos eventos vivenciados, baseado em suas fantasias formadas no aparelho psíquico, levando em conta a participação do meio familiar e social em que vive. Buscaremos nesse trabalho relacionar a formação do ego e a aprendizagem do sujeito.
Na primeira parte do trabalho, abordaremos o conceito de formação da personalidade. Na segunda parte, focaremos no conceito de aprendizagem segundo a Psicologia Cognitiva. Na terceira parte faremos a correlação entre a formação do ego e os desdobramentos com a aprendizagem do sujeito e na quarta parte faremos a conclusão do estudo apresentado.
Formação da Personalidade: como se forma nossa psique?
O pai da Psicanálise Sigmund Freud, por meio de seus estudos da mente, anunciou um novo olhar na compreensão do ser humano. Suas teorias elucidaram a ideia de que o ser humano nada mais era que um animal dotado de uma razão sem perfeição e instruído por desejos e sentimentos. Dentre várias outras teorias – tais como os mecanismos de defesa -, Freud desenhou o que seriam os pilares da formação da personalidade de qualquer sujeito.
Um modelo estrutural da psique composto de três construtos teóricos, ou seja, formado não propriamente de estruturas físicas, mas de interações e atividades mentais. Seriam eles o id, um conjunto de tendências de instintos sem coordenação; o ego sendo uma porção realista e coordenada e, por sua vez, o superego desempenhando um papel crítico e moral. Freud percebeu que o homem era movido por várias forças instintivas, ocasionadas por impulsos naturais.
O bebê é id pleno que em contato com o mundo, vai aprendendo por identificações, como um espelho e o mundo vai mostrando como ele é. Neste contato, o sujeito também vai entendendo como ele deve ser com a educação. A aceitação de tudo isso se dá como forma de manter aqueles que lhe protegem, como a genitora e o genitor.
A educação e formação da personalidade e os impulsos
Posteriormente, esse sentimento é apreendido e os impulsos não são mais voltados somente para o laço dos genitores, mas para seu próprio cuidado. “Para eu me amar eu devo fazer isso”, internaliza o sujeito. Dessa forma, passa a formar-se um padrão interno e externo de valores morais e sociais, formando portanto, o superego.
O superego, além das manutenções morais que “reprimem” o id, também se ocupa do que o indivíduo espera do eu “ideal”: “eu deveria ser uma boa advogada”, “por que não me formei ainda”, “como não estou na pirâmide do sucesso” etc.
Não raro, as pressões do superego trazem demandas muito severas que ocasionam conflitos e um cansaço exacerbado. Sendo assim, é muito importante conhecer-se bem e ter esclarecidos quais os impulsos que temos e por que os temos e, a partir daí, passar a ter uma relação corpo/mente mais afinada.
O id: impulsividade arredia à educação
Na Psicanálise, o Id é responsável pelos instintos, impulsos da parte orgânica e os desejos do inconsciente. O id não tem contato com a realidade, se satisfazendo na fantasia, mesmo que não desempenhe uma ação de fato sobre aquele desejo. Os impulsos do id podem revelar necessidades primárias do indivíduo e que foram reprimidas, por exemplo, o instinto sexual gerado na infância, e que várias vezes são inconscientes de tão reprimido que se encontra.
No id é guardado tudo o que o indivíduo não deixa vir à tona, todas as suas necessidades que não foram realizadas. Chamamos o id de o “princípio do prazer“. Percebemos muitas formas em que os instintos inconscientes são exteriorizados, a mais comum é chamada de “ato falho”, que pode trazer à tona os sonhos e os segredos mais guardados dentro do ser humano.
Os sonhos são outras formas do desejo se tornar consciente, onde é elucidado o que o indivíduo deseja, mas que seria repelido pela sociedade. O instinto sexual é o mais reprimido, uma vez que a religião e a moral da sociedade agem de forma preconceituosa. O Id, Ego e Superego, têm funções diferentes, segundo a Psicanálise.
O ego: a consciência de si e nossa porção “educável”
O Ego é a consciência, o que define a personalidade de cada sujeito. A definição de ego é bastante utilizada em discussões relacionadas à psicanálise. De acordo com a teoria psicanalítica, o ego faz parte da tríade do modelo psíquico, formado pelo ego, pelo superego e pelo id.
O ego é conceituado como o “defensor da personalidade”, é responsável por bloquear os conteúdos inconscientes para que os mesmos não passem para o nível da consciência, despertando assim os seus mecanismos de defesa. Uma das principais atribuições do ego é pôr em sintonia os desejos do id com os valores morais do superego.
Assim, o ego reprime as vontades inconscientes do id com “medo” dos castigos e sanções que lhe podem ser direcionados. O ego é responsável pela diferenciação que o sujeito é capaz de fazer entre seus próprios processos interiores e a realidade que se lhe mostra.
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O superego: interiorização de valores sócio-morais
O superego é a última instância do aparelho psíquico a constituir-se e tem como objetivo reprimir os impulsos que vêm do id, sobre as ações e pensamentos do ego. Essa repressão é percebida pelo ego, por um sinal pequeno de angústia. O que ocasiona a formação do superego e rege os seus primeiros sinais são os impulsos destrutivos e a angústia que florescem.
Apesar de se ir formando na caminhada da vida com princípio nas identificações com os objetos, principalmente com os pais, têm um desenvolvimento maior na fase do desenvolvimento psico-sexual do Complexo de Édipo. E vem a ser o herdeiro do Complexo de Édipo, quando este se dissolve. É o arquétipo formado que nos impede de seguir o princípio do prazer e que nos determina certas regras e certo ideal, pois traz em si as leis morais, as normas parentais e as limitações e as regras impostas pelas figuras parentais, e a noção do bem e do mal.
As figuras parentais são configuradas pelas crianças que aspiram a ser como elas. Assim, durante a fase edipiana, a criança deseja ser como o pai, mas não pode estar no lugar dele. Como se ouvisse “tu deves ser assim”, mas a função de repressão acrescentasse “tu não podes ser assim”. O superego vai determinar comportamentos e barreiras ao ego e funciona como se o superego fosse o ideal de ego.
A educação e formação da personalidade e o superego
As relações do superego com o ego são relações do tipo pai e filho. O superego reprime e pune através de sentimentos de culpa, mostrando o que não se pode e não se deve fazer. É importante os pais possuírem limites e exercerem algumas proibições, aos filhos, se os pais usam de pouca rigidez, o superego não se vai organizar bem e desenvolve-se mais frágil. O contrário também acontece, com pais que usam de uma rigidez exacerbada o sujeito vai ter um superego fortíssimo mas que é manifestado fundamentalmente como defesa.
Freud aponta três funções do superego: consciência, auto-observação e formação de ideais. Na consciência pessoal, o superego é acionado tanto para restringir, proibir ou julgar a ação consciente, porém, ele também pode ser acionado inconscientemente. As restrições inconscientes não são diretas e podem aparecer sob a forma de compulsões ou proibições. O superego é capaz de avaliar as ações da pessoa, ou seja, da auto-observação, independente das pulsões do id para tensão-redução e independente do ego, que também está absorvido na satisfação das necessidades.
O superego de uma criança é desenvolvido segundo os protótipos não dos seus pais, mas do superego dos seus pais; os conteúdos que nele contem são os mesmos e torna-se canal da tradição e de todos os julgamentos de valores que dessa forma se transmitiram de geração em geração.
A realidade e a educação para a vida e transformação
Então, em educação e formação da personalidade, percebemos que id, ego e superego compõem a chamada tríade do modelo psíquico. O Ego, como dito, é a parte consciente dos indivíduos e se desenvolve a partir da interação do ser humano com a realidade. Ele age de acordo com os valores morais e o que a sociedade espera sem ignorar seus próprios desejos.
Ao mesmo tempo, busca satisfazer as necessidades do id (pulsões e instintos) sem extrapolar os valores morais presentes no superego. O Id é o instinto nato do indivíduo, ou seja, os desejos, vontades e pulsões primitivas das pessoas que são filtrados pelo Ego e Superego. O Superego é o “repressor” do Ego.
Desenvolve-se a partir da interação do indivíduo com a realidade e representa os valores morais e culturais que são ensinados e assimilados pela pessoa. O superego é o “eu ideal” adequado aos costumes, princípios e valores morais da sociedade.
A educação e formação da personalidade: Função da aprendizagem
Percebemos a aprendizagem como um processo que vai muito além da aprendizagem que se passa no seio escolar e que não é exclusiva na criança. Nesse processo, encontramos dois atores: o sujeito que aprende, constituído de seus significados e o sujeito que ensina, também constituído dos seus significados. Quando a criança nasce, ela é um feixe de possibilidades, de ferramentas que possibilitam a atração, a captação do conhecimento que tem que ser transmitido e reconstruído nela.
Sabemos que o ser humano tem história e que cada geração tem acumulado conhecimentos sobre a geração anterior e o humano vai se tornar humano porque aprende. Desde o início até o fim, a aprendizagem passa pelo corpo. A nova aprendizagem é absorvida pela aprendizagem anterior; ainda quando aprendemos o sistema de numeração decimal, temos o corpo presente no tipo de numeração e não se absorve somente como ato, mas também como prazer; porque o prazer está no corpo.
O corpo coordena e a coordenação resulta em prazer, prazer de domínio. Quando falamos de aprendizagem e nos reportamos à inteligência, falamos de uma estrutura lógica, enquanto que a dimensão desejante é simbólica, tem significado e é alógica (sem lógica alguma). A estrutura lógica, segundo Piaget, é uma estrutura genética. O conhecimento é construído.
Desenvolvimento e progresso
Piaget permite-nos entender que a aprendizagem ocorre de uma forma particular, em que as diferentes respostas da criança ante a realidade, não como erros, como eram consideradas e julgadas na lógica do adulto, funcionam como uma outra forma e outra lógica diferentes. O conteúdo de um conhecimento advém de um ensino sistemático ou assistemático, mas a possibilidade de desenvolver e processar esse conteúdo depende do sujeito, da sua estrutura cognitiva e de um vínculo que possibilite-o representar esse conhecimento.
O desenvolvimento e progresso da estruturação da inteligência, embora não possam ser alcançados através de um ensino organizado, vão levar em conta especificamente a experiência do sujeito. Se a criança não realiza ações com os objetos, se não tem possibilidade de ver, tocar, mover-se, provar seu domínio sobre as coisas, vai ter muitas dificuldades para organizar a sua inteligência. Uma aprendizagem normal requer uma modalidade de aprendizagem onde encontramos um equilíbrio entre os movimentos assimilativos e acomodativos, segundo Piaget.
No processo de assimilação, a criança apresenta o repertório dos conhecimentos que construiu ao longo da sua jornada e no processo de acomodação, a criança tem contato com um conhecimento novo, recorre às informações que já possui e adapta o conhecimento antigo- transformando-o em novo conhecimento, ao integrar ao antigo as informações novas.
E assim entra em equilíbrio novamente
E nesse processo de aprendizagem, encontraremos a estrutura da personalidade do sujeito, que fará interferências nesse processo de aprender. Aprendemos o que é um banco, por exemplo, não só a partir do conceito de banco, ainda que precisemos do conceito, mas a partir também da história de trocas com o banco que cada um teve, das imagens, das lembranças e das fantasias criadas no psíquico sobre esse objeto.
A formação do ego e os desdobramentos com a aprendizagem do sujeito
As modalidades de aprendizagem estão intrinsecamente correlacionadas com a estrutura da personalidade. Percebemos que a estruturação do ego, atrelada às demandas do superego, poderão influenciar na forma de aprender da criança. Alícia Fernandez (1990) aponta que “O problema de aprendizagem que constitui um ‘sintoma’ ou uma ‘inibição’ toma forma em um indivíduo, afetando a dinâmica de articulação entre os níveis de inteligência, o desejo, o organismo e o corpo, redundando em um aprisionamento da inteligência e da corporeidade por parte da estrutura simbólica inconsciente”.
Em determinada situação a enurese pode significar um descontrole como resposta a um controle em excesso; em outro caso poderia estar significando um desejo de permanecer infantilizado, sem crescer. Para chegar ao significado do sintoma, haverá necessidade de conhecer a história dessa criança. No caso da enurese, a enurese em si é o “signo”, mas o que a faz acontecer, faz parte do simbólico, que será dado pela história original e única de cada um.
Quando buscamos uma alteração na aprendizagem da criança, e na educação e formação da personalidade, devemos estar atentos no ponto especial de articulação entre a elaboração subjetivante e objetivante. Uma criança com uma elaboração de superego muito rígido pode apresentar dificuldades na flexibilização cognitiva, ou mesmo apresentar dificuldades em lidar com os seus erros no momento em que tem contato com o conhecimento escolar.
Conclusão sobre a educação e formação da personalidade
Da mesma forma que uma criança com o superego frágil, sendo levada pelas demandas do id, pode ter dificuldades com as regras e com o convívio social, apresentando comportamento sem limites no convívio com o grupo e como alguns conhecimentos requerem regra para o seu uso, também pode ter dificuldade de entendê-los.
Entender o processo subjetivante construído, até aquele momento na criança, auxilia muito na compreensão dos processos de aprendizagem que a criança apresenta. Como Alícia Fernandez diz: “Todo conhecimento tem uma história que se vincula com o esquematismo da ação, e por aí ao organismo”.
A inteligência e o desejo seguem de uma indiferenciação no sentido a uma maior diferenciação, para uma melhor articulação. Sendo assim, é necessário entender a formação da personalidade psíquica que se desenha na criança, para poder entender o seu processo de aprendizagem.
Bibliografia
Fernandez, A. A Inteligência Aprisionada, Porto Alegre: Artes Médicas, 1990. Freud, S. O Eu e o Id. 1923-1925, Companhia das Letras. Freud, S. O Mal Estar na Civilização.
Este artigo sobre o ego, a aprendizagem e a formação da personalidade foi escrito por CLÁUDIA CORREIA SILVA, concluinte do Curso de Formação em Psicanálise.
2 thoughts on “Psicanálise, Educação e Formação da Personalidade”
Texto muito bom e necessário! Me fez lembrar também de Vygotsky, para quem o aprendizado dos signos e significados se dá pelo meio social. Além do Wallon, segundo o qual a afetividade é quem faz a mediação da aprendizagem e o desenvolvimento da pessoa. Seria muito interessante termos mais estudos que relacionassem educação e psicanálise, como o seu texto propõe.
Muito bom artigo, parabéns! Precisamos ter mais texto acerca a Educação infantil, pois o assunto é muito importante!