Suicídio na Adolescência: causas, sinais e fatores de risco

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Você já parou para pensar sobre o suicídio na adolescência? Então, fique atento porque neste trabalho falaremos sobre as causas e sinais. Ainda, trataremos dos fatores de risco que cercam os jovens. Confira!

Morte versus suicídio

Para iniciarmos o assunto, é diferenciar a morte do suicídio. Nesse sentido, a morte é um fato natural na dinâmica da humanidade. Tal acontecimento sempre gerou desconforto, ainda que algumas culturas a enfrentem de maneira positiva.

Isso porque, muitas delas consideram a morte como a passagem para um estado melhor. Assim, o sofrimento gerado é pela dor da separação. Ou seja, pelo sentimento de perda e de rompimento dos laços afetivos.

Contudo, essa dor pode ser mais intensa quando a causa da morte é uma escolha da pessoa. Desse modo, o suicídio é um tema complexo que permite análises por diversas linhas de estudos.

Cultura do suicídio

No passado, algumas culturas tinham o suicídio como sinal de honra. Assim, como o sacrifício aos deuses e o ritual samurai Seppoku. Este teve início no século 12, mas foi interditado no século 20. Contudo, em sua maioria, as diversas culturas sofrem quando precisam lidar com tal decisão pela morte.

Desse modo, muitas perguntas ficam na mente dos familiares e amigos. Isso porque, eles procuram entender os motivos que levaram a pessoa a desistir da vida. Ademais, esses questionamentos aumentam quando os casos de suicídio são entre os adolescentes.

Dados sobre o suicídio

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, cerca de 800 mil pessoas já cometeram suicídio. Mas, não há registro das tentativas frustradas. Ainda, mais da metade dos casos (52,1%) está entre pessoas com menos de 45 anos.

Ademais, essa é a segunda principal causa de morte dos jovens entre 15 e 29 anos. Porém, enquanto o índice mundial diminuiu 9,8%, há um alerta para o Brasil.

Números preocupantes de suicídio no Brasil

Segundo as últimas estatísticas, houve um aumento de 7% de casos de suicídio no país. Ainda, há dados mais tristes. De acordo com um levantamento realizado pelo Ministério da Saúde, entre 2011 e 2016, os casos de lesões autoprovocadas foram de 176.226.

Sendo que, 65,9% dos casos foram entre as mulheres, e 34,1% entre os homens. Além disso, a pesquisa mostra um aumento das tentativas de suicídio, em especial, na faixa etária mais jovem, entre 10 e 39 anos.

Portanto, questiona-se quais as causas de suicídio na adolescência. E ainda, quais são os possíveis fatores de maior risco para os adolescentes. Desse modo, cabe-nos investigar as questões voltadas a essa fase da vida.

Complexidades da adolescência

A adolescência é conhecida como o período de desenvolvimento entre a infância e a vida adulta. Entretanto, devido às questões culturais, essa fase ainda é tratada de forma pejorativa. Assim, há muita discriminação e os adolescentes são vistos como rebeldes e confusos.

Por isso, segundo Peres & Rosenburg,

Tais generalizações, de um lado, levam muitos a “naturalizarem” o processo da Adolescência e, desta feita, dificultando identificar diferenças e desigualdades em adolescentes concretos. E, por outro lado, a realidade, não correspondendo a tais generalizações, pelo fato de não constituir um único bloco homogêneo. Ao contrário, ser constitutivamente heterogênea, eivada de contradições, desigualdades e diferenças, leva outros até à possibilidade extrema de questionarem a própria existência do processo, pelo menos em alguns grupos sociais ou em culturas específicas, no sentido instituído. (1998, p.55)

Por isso, essa visão distorcida acaba prejudicando a compreensão real das mudanças pelas quais os adolescentes passam. Ademais, impede um olhar mais amplo sobre tal período da vida. Este é caracterizado por intensas mudanças físicas, hormonais e mentais.

Aliás, a própria compreensão de sociedade, é carregada com as pressões de se posicionar como indivíduo. Logo, é difícil para os adolescentes lidarem com tantas transformações ao mesmo tempo.

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    A visão da Psicanálise sobre a adolescência

    A Psicanálise adota o termo puberdade, entre 10-19 anos, para tratar dessa faixa etária. Dessa forma, os psicanalistas consideram as diversas mudanças biopsicossociais que envolvem o jovem.

    No Brasil, este campo se volta para o adolescente a partir da década de 1960. Contudo, sua verdadeira evolução começou na década de 1990, quando o Ministério da Saúde desenvolveu programas voltados para a saúde da criança e do adolescente.

    Assim, foi na III Conferência Nacional de Saúde Mental (2001), que o campo da psiquiatria observou um atraso no cuidado dos jovens. Então, de modo tardio, houve a criação dos CAPSi – Centros de Atenção Psicossocial para a infância. Hoje, os CAPS atendem a diferentes públicos em todo o país.

    Portanto, esse despertar das políticas públicas aos cuidados mentais é um reconhecimento de que o período puberal é sensível e que merece a devida atenção. Assim, o acompanhamento adequado visa evitar diversos problemas tanto para o adolescente, quanto para a sociedade num todo.

    Freud e a puberdade

    Outro ponto que deve ser considerado é a questão sexual. Em seus Três Ensaios sobre a teoria da sexualidade (1905), Freud  afirma que na infância, a criança passa pelo período em que a sexualidade é autoerótica. Já na puberdade, essa sexualidade fica latente:

    Com a chegada da puberdade introduzem-se as mudanças que levam a vida sexual infantil a sua configuração normal definitiva. Até esse momento, a pulsão sexual era predominantemente autoerótica; agora, encontra o objeto sexual. Até ali, ela atuava partindo de pulsões e zonas erógenas distintas que, independende umas das outras, buscavam um certo tipo de prazer como alvo sexual exclusivo. (2016. p. 127).

    Então, a busca pelo prazer se volta para o mundo externo. Portanto, é nesse ponto que ocorre a preparação para a adolescência. Freud, ainda afirma que nessa fase se realizam novas combinações no organismo. Além de composições que levará o jovem a mecanismos complexos.


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    Por isso, esse período é marcado por perturbações patológicas, caso as combinações não se realizem. Segundo Freud, “todas as perturbações patológicas da vida sexual devem ser consideradas, de forma justificada, como inibições do desenvolvimento” (2016, 127).

    Vulnerabilidade

    Desse modo, na puberdade as transformações são muito intensas. De acordo com Raspanti (2000), os adolescentes são os mais vulneráveis diante dos novos problemas. Nesse sentido, questões relacionadas à violência, abondono e desintegração familiar marcam, de forma profunda, as suas vivências.

    Logo, há uma busca por se encaixar em determinados grupos. Porém, como resultado, o adolescente, sem idéias definidas, se submete a experiências que o colocam em risco. E , como afirma Borges,

    “na busca de uma solução para seus problemas, estes jovens podem, por exemplo, recorrer a comportamentos agressivos, impulsivos ou suicidas” (2006, p. 345).

    Por isso, a fase da adolescência acaba sendo marcada por escolhas e decisões profundas. Assim, muitos se jogam com toda impulsividade. O que corresponde, na linguagem psicanalítica, a agressividade.

    Agressividade e suicídio na adolescência

    Como foi observado, o caminho percorrido pelo indivíduo durante a adolescência é longo e acentuado pelos sentimentos. Por isso, podemos relacioná-lo à agressividade. Desse modo, Birman, em seu artigo Arquivo da agressividade em psicanálise, afirma que

    A problemática da agressividade enunciou-se desde os primórdios no discurso freudiano. Assim, na “Psicoterapia da histeria”, de 1895, essa problemática já se enunciara, pelo viés da questão da resistência (Freud, 1971), no registro estritamente clínico. Porém, nas experiências analíticas de Dora (Freud, 1971) e do pequeno Hans (Freud, 1971), a agressividade foi inscrita no registro do sintoma, sendo então responsável pela produção e pela reprodução desse.

    Sendo assim, o suicídio causa impactos profundos na família e sociedade. Isso porque não carrega apenas a morte em si, mas a forma como ela se dá. Ou seja, uma agressividade contra a própria pessoa. Mesmo porque, o termo suicídio tem origem latina, sendo a junção de sui (a si mesmo) e caedere (golpear, matar).

    Agressividade para Freud

    Para Freud, a agressividade estava ligada às pulsões instintivas primitivas. Desse modo, ele desenvolveu duas teorias sobre as pulsões. Enquanto a primeira se volta ao ego e impulsos sexuais, a segunda trata da vida e da morte. Assim, nesta segunda teoria está a agressividade, o sadismo e o masoquismo.

    Por isso, em Luto e Melancolia (2010, p.143), Freud apresenta o desânimo penoso e o fim do interesse pelo mundo externo. Ainda, a incapacidade de amar e o desinteresse por qualquer atividade. Portanto, a agressividade pode se direcionar para a própria pessoa como uma força de autodestruição e acusação contra seu ego.

    Agressividade para Lacan

    Segundo Lacan, a agressividade não ocorre pelo instinto animal, mas deve ser analisada pela sua relação com a  linguagem. Dessa maneira, ao romper com a perspectiva biológica do instinto, Lacan buscou formular os fundamentos da agressividade.

    Assim, ele desenvolveo a Teoria da identificação, encontrada no artigo “A agressividade em psicanálise” (1948). Desse modo, a identificação do “eu” passaria pela identificação imaginária a um “outro”. Logo, o único caminho para que este outro não ocupe o lugar do “eu” seria a destruição do outro. Para Lacan,

    há nisso uma espécie de encruzilhada estrutural onde devemos acomodar nosso pensamento, para compreender a natureza da agressividade no homem e sua relação com o formalismo de seu ‘eu’ e de seus objetos” (1998, p.116).

    Então, a perspectiva de Lacan é ontológica e, por isso, de conflito originário.

    Agressividade para Winnicott

    Já para Winnicott, a agressividade é uma reação às frustrações das experiências. Ou seja,  à medida que se o ser humano se desenvolve, também aprimora seu mecanismo de elaboração frente às frustrações. Nesse sentido, o humano é considerado um ser portador, tanto de sentimentos bons, quanto ruins.

    Assim, o reconhecimento da agressividade como uma tendência humana, torna importante compreender como ela surge. Além de seu modo de funcionamento no processo de desenvolvimento da criança. Desse modo, Winnicott defende a ideia de que mesmos os bebês experienciam os sentimentos de ódio e amor.

    Por isso, desde o princípio de suas vidas devem encontrar formas de lidar com esses sentimentos. Ademais, a agressividade constitui uma reação direta ou indireta à frustração. Logo, ela atua como uma das muitas fontes de energia das pessoas.

    Frustrações e conflitos

    Em diferentes culturas, o conflito é um importante aspecto para o amadurecimento. Isso porque, o conflito gera questionamentos e uma busca de respostas mais concretas. Além de estabelecer regras e condutas, a fim de que haja equilíbrio no espaço social.

    Dessa forma, os indivíduos precisam lidar quando os seus desejos não sãoatendidos. Então, a frustração, deve ser vista como algo positivo, já que contribui para estabelecer:

    • limites;
    • autonomia;
    • concordância;
    • autoafirmação;
    • pertencimento.

    Entretanto, o problema se dá quando uma frustração é ignorada. Assim, quando não se dá a devida atenção, não há um desenvolvimento saudável. Por isso, a enfermidade é um estado de frustração, pois não se espera encontrar alguém que sinta prazer contrair uma doença.

    No entanto, a frustração pode ser tão bem elaborada que a saúde mental permanece em ótimas condições no período da enfermidade física. Portanto, a não elaboração de forma positiva de uma frustração pode gerar traumas. Logo, eles permanecerão no inconsciente de maneira recalcada.

    Risco de suicídio na adolescência

    Nesse sentido, os fatores que levam um jovem a ter pensamentos suicidas, até a tentativa de fato são variados e complexos. Contudo, apresentaremos os principais sinais de suicídio na adolescência:

    • transtornos mentais,
    • sentimento de solidão;
    • deficiência no rendimento escolar;
    • dificuldade de aprendizagem;
    • baixa autoestima;
    • consumo de substâncias psicoativas;
    • estresse;
    • histórico de abuso físico ou sexual;
    • perda de um ente querido;
    • orientação sexual;
    • conflitos familiares;
    • doenças médicas.

    Ansiedade e risco de suicídio na adolescência

    Além dos fatores de risco já mencionados, os casos de autoagressividade têm a ansiedade como base. Assim, os temores descontrolados e o imediatismo instigado resultam nesse transtorno. Ademais, há uma permanente insatisfação com a dinâmica do ritmo social.

    Sendo assim, a ansiedade se tornou algo característico das últimas gerações. Não por acaso, são os jovens que vêm sofrendo cada vez mais com esses sintomas.

    Suicídio como fato social

    Nesse sentido, Émile Durkheim, em O suicídio (1897), afirma que quando os casos de suicídios acontecem em determinado período numa sociedade, são considerados um fato social. Isso porque “a taxa de suicídios constitui, portanto, uma ordem de fatos única e determinada” (p. 14)

    Dessa forma, o sociólogo relaciona os casos de suicídios com os diferentes meios sociais. Isso inclui a religião, o sistema político, por exemplo. Contudo, o autor não faz uma acusação a um modelo social específico, e nem mesmo busca responsabilizar a sociedade por isso.

    Assim, Durkheim considera o suicídio como um fato individual e ao mesmo tempo ligado às ocorrências sociais. Portanto, que não deve ser ignorado, já que tal questão é responsabilidade de todos. Ainda, como ressalta Freud, ao tratar do suicídio entre alunos da escola secundária:

    [a escola] deve lhes dar o desejo de viver e devia oferecer-lhes apoio e amparo numa época da vida em que as condições de seu desenvolvimento os compelem a afrouxar seus vínculos com a casa dos pais e com a família. (1910, p. 141).

    As relações familiares e os casos de suicídio na adolescência

    Tratando dos vínculos familiares, nem sempre a introjeção dos pais na infância se solidifica. Então, não permitem o sustento de novos caminhos construídos pelos filhos. Nesse sentido, para o adolescente, há sempre uma falha nos pais. E esta precisa ser reelaborada.

    Nesse sentido, os conflitos na adolescência são intensos. Ademais, os jovens querem romper com as falhas do outro, rompendo os laços familiares. Assim, ele deseja ocupar seu próprio espaço na sociedade. Ou seja, fazer suas próprias escolhas e alcançar seus próprios objetivos.

    Contudo, segundo Freud, quando esses objetivos inconscientes não são elaborados, ocorrem as limitações da função do eu. É nesse ponto que beira a possibilidade da depressão e do desinteresse. Assim, o adolescente opta para a fuga, pois não quer lidar com as frustrações.

    Portanto, a formaçãoe manutenção de um lar saudável é responsabilidade dos pais. Pois, são eles as principais bases para o desenvolvimento emocional e psicológico dos filhos. Aliás, a responsabilidade é de todos.

    Suicídio na adolescência é questão de saúde pública

    Nesse sentido, percebe-se que o suicídio trata-se de uma questão de saúde pública. Isso porque, a saúde mental merece tanta atenção quanto qualquer outro assunto relacionado à saúde.

    Segundo a OMS, a saúde mental é um estado de bem-estar. Dessa maneira, o indivíduo consegue lidar com as tensões normais e produzir positivamente para o seu próprio desenvolvimento e de sua comunidade.

    Portanto, é preciso estimular que todos, familiares, amigos e educadores, incentivem os jovens a buscar acompanhamento psicológico. Para isso, todos precisam estar atentos aos sinais de suicídio na adolescência.

    Além de buscar ser compreensíveis com as angústias e aflições dos jovens. Portanto, entenda que julgamentos só piorarão a situação.

    Considerações finais sobre suicídio na adolescência

    Os últimos 20 anos têm sido marcados pela grande ascendência dos avanços tecnológicos. Como resultado, exigi-se uma aceleração no desenvolvimento dos indivíduos. No entanto, o desenvolvimento humano tem a sua peculiaridade de ser, de acontecer no tempo natural.

    Nesse sentido, as mudanças pelas quais os jovens passam aumentam os fatores de risco nos casos de suicídio. Por isso, percebe-se que os adolescentes são o grupo mais vulnerável. Eles estãovivendo uma fase de intensos conflitos, decepções, frustrações e pressões sociais.

    Ademais, as contribuições da Psicanálise sobre a agressividade contribuiram para uma melhor compreensão dessa fase na vida. E assim, chamam a atenção para um assunto que por muito tempo foi menosprezado. Por fim, o presente trabalho ressalta a importância do desenvolvimento de políticas públicas.

    Ainda, a necessidade de uma abordagem interdisciplinar, a fim de que haja um tratamento sério para os jovens. Desse modo, o objetivo é evitar que mais vidas sejam perdidas em silêncio.

     

    Este conteúdo sobre suicídio na adolescência foi escrito por Jeremias Alves para o Curso de Formação em Psicanálise Clínica.

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