autoanálise

A práxis restrita da Autoanálise

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Descobrir quem somos pela via da autoanálise requer muito trabalho, rigor para reconhecer os nossos próprios erros, acertos, atentar-se aos nossos sentimentos, nossas emoções, sem desprezá-las.

Ter a consciência, legítima, daquilo que nos deixa alegres, realizados, de nossas preferências, requer um desprendimento de muitas interferências externas. Como, por exemplo, a persuasão das mídias sociais em relação ao que é adorável, para ser aceito e admirado pelas pessoas.

Ou então, aquilo que apreendemos, introjetamos de nossos pais, cuidadores, pois seguir os seus ideais, acarretaria o olhar de apreço e amor.

A autoanálise do psicanalista: rumo ao autoconhecimento

Sigmund Freud, o pai da psicanálise, reservava algumas horas de seu dia para praticar a autoanálise. Analisou, interpretou seus sonhos, suas próprias vivências, questões, baseando-se nas experiências que obtinha com seus pacientes, durante as sessões de análise.

Além disso, Freud trocava correspondências com seu amigo Fliess (médico otorrinolaringologista), o qual tornou-se confidente por muito tempo. Em suas cartas, Freud contava sobre seus sonhos que o intrigava, relacionados à raiva pelo pai, ao amor por sua mãe( complexo de édipo), desenvolvendo muitas de suas teorias.

Então será possível desenvolvermos uma autoanálise, entendermos o que gerou os nossos sintomas, curarmos os nossos traumas, as nossas angústias, os motivos que fizeram escolhermos um caminho de vida que decidimos seguir, nossos padrões de repetição, os quais reclamamos por não sairmos do lugar?

Os entraves da autoanálise para um terapeuta

A maior parte dos profissionais da psicanálise ou de outras abordagens que envolvam saúde mental não enxerga a prática da autoanálise como uma possibilidade eficaz, com resultados plenos. Pelo fato de nosso ego poder fazer o uso de diversos mecanismos de defesa, os quais requer um autoconhecimento farto para identificar essa prática, pois são utilizados de forma inconsciente.

Ter um olhar profundo para as nossas emoções em situações que estamos inseridos, sem culpar o ambiente, outra pessoa pelos gatilhos que despertou em nós, é um desafio muito árduo e, dependendo da experiência em sessões de análise do indivíduo, torna-se uma condição impossível.

Exemplo de autoanálise

Um exemplo prático para elucidar a prática do mecanismo de defesa, chamado racionalização, atuando no momento de uma autoanálise: Um casal de namorados discute em frente aos seus amigos, o homem é extremamente agressivo usando palavras hostis com sua namorada e, todos ali presentes, demonstram não aprovar aquela atitude dele.

No entanto, a mulher se cala e começa a refletir, a autoanalisar-se, sobre o que ela poderia ter “feito” para que gerasse aquele abuso emocional. Então, chega à conclusão de que, seu namorado cometeu aquele abuso, pelo fato de ela ter dito algo que ele não gostou e, também, por ser uma atitude normal, pois para ela os homens são dessa forma.

Percebe-se, nesse caso, que a mulher utilizou o mecanismo de defesa chamado racionalização criou uma justificativa da atitude de seu namorado, pelo fato de ela ter presenciado em sua infância algo semelhante. Afinal, seu pai agia da mesma forma com sua mãe e, portanto, ela internalizou, introjetou, como uma forma natural de um homem agir com outra mulher.

O abuso emocional

Sabemos que abuso emocional contra a mulher é crime e, nesse exemplo, não foi possível pela autoanálise, a mulher entender, elaborar que essa reação de seu namorado não deve ser tolerada como algo banal, pois pode levar a muitos desajustes mentais em sua vida.

O cerne da autoanálise

Sentir-se angustiado, nervoso, triste em certas situações, às quais de pronto, conscientemente não sabemos explicar as causas, podem tornar-se um desafio para descobrirmos sozinhos, os “gatilhos” que nos levaram a essas circunstâncias. Como foi citado, no exemplo anterior, uma pessoa pode usar de mecanismos de defesa para, digamos, proteger-se de suas dores, de seus traumas e fazer uma interpretação incorreta de seus afetos. Podemos inferir que, somente a autoanálise, torna-se truncada no âmbito do autoconhecimento.

Por outro lado, toda análise bem sucedida, dentro dos padrões convencionados de uma sessão psicanalítica, parte do pressuposto do discurso livre, sem censura do analisando, em contrapartida o psicanalista colabora repetindo o discurso verbalizado, faz intervenções e pontuações cabíveis ao paciente.

Nesse sentido, podemos considerar que toda sessão de análise é uma autoanálise, pois quem dirige o discurso, expõe os sentimentos, traumas, angústias, afetos é o paciente. O momento é dele, assim como a simbolização de seus desejos, dores, em palavras.

Afinal, funciona a autoanálise?

Aqui darei o meu ponto de vista como psicanalista, sim e não. Uma dicotomia, porém com complementaridade. Conforme mencionei anteriormente, podemos considerar toda análise como uma autoanálise, contudo não tão somente a segunda, pois conta com a presença do analista. Esta que faz o papel de um terceiro, o qual não tem vínculo com seu analisando e que faz o papel de sujeito suposto saber (teoria desenvolvida pelo psicanalista Lacan).

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    O fato do paciente falar tudo que vier a sua cabeça a um estranho, que está ali para lhe ouvir e interceder a partir de seus saberes, provê um efeito significativo, real, além de apenas um ouvir-se.

    Em conjunto, pensando agora em um paciente que transcorre periodicamente em uma análise, intercalar períodos no decorrer de acontecimentos de sua vida com reflexões sobre seus sentimentos, suas atitudes, escolhas de caminhos, creio ser de grande valia momentos de autoanálise, pois o paciente terá mais condições, um maior conhecimento sobre si mesmo.

    Conclusão

    Finalizo com o seguinte pensamento, podemos considerar uma autoanálise satisfatória, se for incorporada durante e após uma análise, porém não de maneira sui generis.

    Este artigo sobre a práxis da autoanálise foi escrito por Camile Martins ([email protected]), psicanalista e escritora. Atendimentos online. Instagram: @camile.psicanalista.

     

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