Benedictus de Spinoza (1632-1677) foi um filósofo holandês da Idade Moderna, que pelo seu conceito de Conatus se opôs à separação entre corpo e mente como coisas distintas. Também negou a ideia de Deus enquanto uma entidade transcendente que governa e controla o mundo de um plano superior.
Por ser considerada uma reflexão inovadora para a época e central no pensamento de Spinoza, a ideia de Conatus é revisitada até os dias de hoje tendo forte influência nas Ciências Humanas.
Exploraremos neste artigo as possíveis contribuições que a noção de Conatus pode oferecer ao campo de estudo da Psicanálise para um melhor entendimento da vida psíquica.
Corpo-Mente são uma expressão da Natureza
No olhar de Spinoza, Natureza e Deus são a mesma coisa. As duas palavras se referem à substância única, com atributos infinitos e ilimitados, das quais são produzidas todas as outras coisas (inclusive o Corpo e a Mente). Desta forma, tanto o Corpo quanto a Mente seriam modos de expressão da Natureza (ou de Deus), de seus atributos.
Corpo-Mente são inseparáveis! Por serem modos de expressão da Natureza, o Corpo e a Mente não podem ser separados pois os dois têm origem em uma substância única. Corpo e Mente são um só: expressões diferentes mas de uma mesma Natureza. Por isso, para Spinoza, todo indivíduo é um sistema conectado de Corpo-Mente.
Nos dias de hoje a Psicanálise tem uma concepção semelhante a de Spinoza. Ela entende o sujeito como uma unidade psicossomática (psico + “soma”/corpo). Tudo o que afeta o Corpo afeta a Mente, assim como tudo o que afeta a Mente afeta também o Corpo.
Conceito de Conatus
Segundo o filósofo holandês, cada indivíduo em sua unidade Corpo-Mente possui um Conatus. Essa é uma palavra em latim que significa “esforço de” ou “esforço para”. Seria a “força vital” ou “esforço” pelo qual cada indivíduo busca preservar e perpetuar a própria existência.
Através do Conatus, o sujeito faz o necessário para manter sua vida. Em outras palavras, Conatus significa a potência que cada ser possui para agir no mundo. O Conatus move o sistema Corpo-Mente e pode ser observado através das ações do indivíduo. Por meio de suas ações o sujeito busca sempre aumentar a potência de seu Conatus, ampliando sua capacidade de agir sobre o mundo.
Para a Psicanálise o Conatus funciona como a pulsão de vida: é o impulso natural para a autoconservação, a força psíquica e somática que mobiliza o sujeito a garantir sua segurança, satisfazer suas necessidades básicas e buscar suas realizações pessoais.
Desejos em Spinoza e Conatus
Para Spinoza, conseguimos provar que o Conatus existe em um sujeito pois observamos que ele possui desejos. Os desejos expressam essa força vital que impulsiona o indivíduo a viver. Enquanto temos desejos estamos vivos. Através dos desejos que se expressam no nosso Corpo e na nossa Mente vemos que a pessoa é constantemente movida pelo Conatus.
O desejo é o Conatus dizendo para o sujeito agir na direção de algo que lhe traga prazer. O Conatus se expressa por meio do desejo para indicar que o sujeito deve alimentar-se, buscar ser acolhido, encontrar amigos, relacionar-se com alguém, desenvolver positivamente seu trabalho, ser reconhecido, etc.
A Psicanálise contemporânea vai de encontro com a noção de Spinoza sobre o desejo. Na Psicanálise o desejo é o motor do ser humano. O desejo move a pessoa para ela agenciar sua vida no meio social. Como todas as pessoas estão desejando e sendo movidas a construírem suas vidas em sociedade, pode-se dizer que o desejo produz a realidade social em que vivemos.
Conatus e os Afetos
Segundo Spinoza, quando o desejo do Corpo-Mente é realizado ou frustrado são gerados os afetos. Afetos são tensões provocadas no Conatus. Os afetos têm influência direta no Conatus, aumentando ou diminuindo sua potência.
A afetividade são de grande interesse para a Psicanálise pois ela explica como funciona a vida psíquica.
Para Spinoza existem três categorias de afetos:
- Alegria Ativa: Sentimos Alegria Ativa quando agimos de forma autêntica para realizar nosso desejo. Ex: buscamos nos expressar por meio de uma arte, por mais simples que ela seja, ter bom desempenho no trabalho, promover encontros em família. A Alegria Ativa que sentimos aumenta nossa capacidade de existir e de pensar. Há um aumento da potência de agir.
- Alegria Passiva: Sentimos Alegria Passiva quando não dependemos apenas de nós para alcançar nosso prazer. Ex: praticar bullying, diminuir emocionalmente outra pessoa, ficar contente com o time que não simpatizo sendo derrotado ou em saber que a pessoa com quem não simpatizo não alcançou uma promoção no trabalho. A Alegria Passiva traz uma ilusão de que estamos felizes, quando na verdade elas escondem Tristezas.
- Tristeza: Sentimos Tristeza quando o nosso desejo é frustrado ou quando somos oprimidos por causas externas. Ex: a morte de um familiar, estar isolado da sociedade, ser demitido, ser maltratado, ter suas expectativas quebradas, adoecer. Na Tristeza nossa capacidade de existir e de pensar é reduzida. Há uma diminuição da potência de agir.
Conclusão
Sendo assim, apresentamos as bases para a compreensão teórica do Conatus, sua definição, além dos seus efeitos e expressões na vida psíquica e social dos indivíduos.
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Buscamos ainda correlacionar brevemente os termos e as ideias de Spinoza com os conhecimentos e interesses da Psicanálise a fim de traduzir para termos psicológicos e sociais a teoria de Spinoza.
O presente artigo foi escrito por Raphael Aguiar([email protected]) – Rio de Janeiro/RJ – Formando em Psicanálise Clínica pelo IBPC, Pós-graduando em Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem pela PUC e Terapeuta Ocupacional pela UFRJ. Atua na clínica com saúde mental de crianças e adolescentes.