Nas suas várias pesquisas e investigações levadas a cabo com diversos pacientes, Freud observou que cada um deles apresentava uma subjetividade que era sempre predominante e que perseguia cada paciente ao longo da sua vida, dando a cada psique uma maneira, uma forma, e, por assim dizer, um modo, quase que definido, de determinar as suas relações, tanto intrapsíquicas como nas interações com outras pessoas. Observando o funcionamento das neuroses
Observou que que cada uma dessas subjetividades fazia surgir, em forma de mecanismo, defesas mensuradas como específicas, o que, num complexo desejos/defesas, gerava um conflito psíquico e um tipo de sofrimento na pessoa.
O funcionamento das neuroses
Freud, então, estabeleceu e separou todos esses elementos de interação, as situações e modos de interações dos pacientes com o mundo, e estabeleceu organizações psíquicas. Essas estruturas são as perversões, as psicoses e as neuroses.
As neuroses se constituíam no principal objeto de estudo de Freud. Sua psicanálise marcou, naquela época, o real início de concepção psíquica, eis que se tratava somente as “doenças dos nervos”.
Como se dá o Funcionamento das Neuroses?
Preambularmente, nesse trabalho, vamos trazer uma definição e conceitos de neuroses, vamos explicar como se dá a real dinâmica tida como neurótica e como atuam seus diversos mecanismos de defesa.
Também vamos apresentar e caracterizar especificamente cada uma das principais psiconeuroses, as chamadas neuroses de transferência, como a fobia, a obsessão-compulsão e a histeria.
Por definição, uma neurose, atualmente, é considerada como uma doença, ou, melhor dizendo, uma patologia, da ordem das psicogênicas, na qual todos os seus sintomas vão expressar de forma simbólica determinada situação conflitiva cuja raiz está na infância, retratando sempre uma luta entre o eterno desejo e a súbita defesa, e que, quando isolada e especificada, vai indicar inclinações para uma das três formas clínicas: obsessiva, histérica ou fóbica.
Freud e as neuroses
Freud enquadrava as neuroses, simbolicamente, sempre como uma defesa da mente das pessoas tidas como sintomáticas, contra as próprias ideias, ideias estas que lhes causavam verdadeiros conflitos e, que eram, por assim dizer, tremendamente insuportáveis para elas. Nesse sentido, teríamos a maioria dos indivíduos sofrendo de neurose, e, consequentemente, perdendo a sua valiosa qualidade de vida.
E todos nós estamos mesmo às voltas com a vida cotidiana, que, atualmente, é muito estressante. Aos seus contemporâneos, Freud também fazia essa crítica da vida cotidiana, e, em muitos estudos publicados, fez muitas e diferentes abordagens nesse sentido, relacionando o cotidiano às neuroses.
Um neurótico se diferencia da pessoa não neurótica, pela intensidade comportamental, pelo que o neurótico não é capaz de resolver, satisfatoriamente, esses conflitos internos, e, também os externos, enquanto o não neurótico consegue lidar de maneira satisfatória com tal conflito. A pessoa que está acometida de neurose vai apresentar sofrimento e não vai se adaptar bem na sua vida, em alguma das áreas, seja sexual, familiar, profissional ou social.
Como a neurose funciona segundo a psicanálise
Assim, a neurose está presente na maioria das pessoas, gerando uma infelicidade. O neurótico se utiliza de defesas, digamos, mais bem elaboradas do que as dos psicóticos, que são mais arcaicas e primitivas. Esses mecanismos, verdadeiras defesas, vão explicar, por assim dizer, como vai funcionar toda a dinâmica na neurose.
Essa repressão, o recalcamento, vai, assim, emergir de uma divergência, melhor, um conflito, justamente entre:
- a)- o Id, com suas exigências impetuosas, primitivas e arcaicas, naturais do ser humano, Id este sob tutela de um princípio o “do prazer”;
- b)- uma censura, sendo como uma autoridade moral interna, do Superego.
Nesse caso, o Ego, este obedecendo ao princípio de realidade, vai atuar como defensor e, por assim dizer, proteger esta mente das energias destrutivas, daquelas representações, dos afetos, por assim dizer, atuais ou mesmo mnêmicos, intoleráveis, havidos no inconsciente.
O ego e o funcionamento das neuroses
Todo esse trabalho do Ego, como mediador, tem o objetivo de justamente fugir ao desprazer causado pela existência da situação conflituosa. A regressão, assim, vai se dar, naturalmente, quando o Ego for muito incapaz de manter o pretendido, buscado, controle de uma determinada situação na qual lhe foi apresentada uma ameaça à sua integridade. Assim, haverá tal regressão àqueles chamados pontos de fixação.
Deve ser lembrado que essas relações nem sempre são simples de lidar, acontecendo sempre da mesma maneira. Aqui, cabe ao psicanalista clínico fazer uma avaliação dentro da especificidade do caso, de cada paciente.
Na conversão chamada orgânica acontecerá uma defesa na qual os conflitos psíquicos surgidos de um determinado impedimento na realização de um desejo ou um trauma proveniente de algumas experiências, até mesmo de fantasias consideradas aflitivas, vai reivindicar no corpo a possibilidade de descarregar esse estímulo contido, essa pulsão que está reprimida.
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Uma pulsão que está reprimida
Esse sintoma de natureza física vai apresentar, de forma simbólica, justamente um correspondente que vai estar associado ao fato tido como traumático, que tem a ver sempre com a sexualidade.
Num exemplo, Freud até relata que uma sua paciente, mulher tida como histérica, ficava sem a visão, temporariamente, sem estar comprometida na sua fisiologia, num claríssimo sinal de que seu Ego estava lutando contra algumas lembranças traumáticas de ordem visual, indiretamente afetando o lado permanente e útil da sua visão.
Uma projeção vai consistir na transferência do que, por meio do conflito interno da pessoa, não seria aceitável pelo seu Ego. Dessa maneira, essas pulsões, agressivas ou mesmo de sua sexualidade, seriam lançadas, projetadas, para o exterior, atribuindo-se, por assim dizer, todas essas características consideradas intoleráveis aos outros, ou mesmo às coisas.
A relação da projeção e repressão
Um exemplo de projeção seria uma pessoa que joga toda a sua raiva ou um seu desejo reprimido “no outro” como que canalizando o seu impulso ou instinto, naturalmente agressivo, mas que, por assim dizer, não pode ser lançado ou direcionado a uma causa, que seria a original, como por exemplo, ao pai, irmão, ou à mãe.
Num deslocamento, temos que este é quase uma variante da projeção. Os impulsos, aqui, os da energização da libido e de uma determinada agressividade, surgidos numa relação objetal, e que por alguma razão não podem ser canalizados ou direcionados a esse objeto, são deslocados sempre a outro objeto, como pessoas e coisas, que acabam virando alvos certeiros dessas descargas que acabaram não sendo realizadas.
A racionalização se traduz num determinado mecanismo no qual haveria uma defesa numa elaboração, aqui considerada lógica, tanto a de determinados eventos, como de algumas percepções ou mesmo das experiências que não podem, por assim dizer, ser aquilatadas, mensuradas, nem compreendidas qualitativa e quantitativamente pelo psiquismo.
A construção racional do funcionamento das neuroses
E, assim, em resposta a isso, toda uma construção racional vai acabar sendo elaborada para, justamente, dar vazão a esse conteúdo da mente e que não foi compreendido. Um exemplo de racionalização se dá quando há uma situação de insuportabilidade na fase chamada fálica.
Na formação reativa haverá a manifestação que, outrora, foi bastante recalcada em virtude de um sofrimento intenso, sendo, no agora, substituída por uma reação diametralmente contrária como uma forma de lidar com essa dificuldade de enfrentar, de novo, esse sentimento que lhe fez sofrer.
Assim, por exemplo, uma pessoa cruel e violenta, porque foi bastante reprimida na infância, inconscientemente vai justamente escolher, ou ter preferência, por uma determinada profissão que envolva ter que cuidar de outras pessoas, e que acaba por apresentar um excelente comportamento. É zelosa, cuidadosa e vigilante, um “doce” de pessoa tratando outras pessoas.
A sublimação
Na sublimação, o último mecanismo de defesa aqui referenciado, vai ocorrer a modificação das pulsões destrutivas, com essas passando a adquirir uma realização contrária, positiva, e que é bem aceita pela sociedade. Uma energia pulsional, por exemplo, com potencial bastante destrutivo, aqui, vai ser transformada pelo Ego da pessoa, como um trabalho numa obra artística, uma pintura, uma escultura, por exemplo, ou seja, numa atividade de utilidade social.
Ao passar de um tempo, diante de casos novos e dos sintomas em diversos e incansáveis estudos sobre as organizações psíquicas, Freud, então, passou a dividir a neurose sob dois aspectos, as neuroses atuais e as classificadas como psiconeuroses, “neuroses de transferência”, que seriam a fobia, a histeria e a obsessão-compulsão.
Trataremos aqui somente as psiconeuroses, porque passíveis de análise pelo método freudiano.
Entendendo a relação da fobia
A fobia, vale lembrar, também chamada e conceituada por Freud de histeria de angústia, vai se caracterizar por uma combinação de vários sentimentos, de diversas reações, um tanto de pulsões, de muitas fantasias, de tantas angústias, e também das diversas ações de defesa do ego, além de inúmeras identificações consideradas de origem patógena.
A fobia sempre vai apresentar uma delimitação da circunstância em que se manifestar, seja um objeto, um local, um cenário ou um contexto. Pelos estudos empreendidos a respeito da fobia, esta fará alguma referência às experiências vividas durante a fase psicossexual chamada fálica, nos conflitos edipianos.
Um exemplo seria uma pessoa ter medo do escuro, temor que estaria associado ao genuíno sentimento de perda do amor de mãe ou da própria perda da mãe. Inevitavelmente, são as experiências subjetivas e a relação que o infante tem com os sentimentos e vivências que lhe são proporcionadas que vão certamente oferecer uma nefasta contribuição para o enraizamento e o desenvolvimento dessas várias fobias.
A obsessão-compulsão
A obsessão-compulsão, conhecida por neurose obsessiva, se constitui como um dos principais quadros psicopatológicos com ocorrência dentro da clínica psicanalítica. É o TOC da Psiquiatria. A obsessão vai apresentar algumas características socialmente positivas, tais como ordem, disciplina, ética, respeito e moral.
Isso, até um seu “aprisionamento” dentro da obstinação e repetição de rituais, além de atos considerados compulsivos e eternos, no que acaba por incapacitar o indivíduo na sua vida. A histeria, ou neurose histérica, é a subestrutura considerada neurótica que mais vai aparentar “normalidade”.
Etiologicamente, na histeria, a fixação libidinal estaria relacionada, predominantemente, na fase fálica. Num certo sentido, o “trauma sexual” seria, por assim dizer, vivenciado passivamente, sendo de maneira real ou fantasiosa.
A histeria no funcionamento das neuroses
Na histeria, distinguem-se a histeria chamada de “conversão” e a histeria denominada “dissociativa. Na primeira, histeria de conversão, os conflitos psíquicos são “convertidos” ao corpo, sejam num ou mais dos órgãos dos sentidos, uma cegueira ocasional ou mesmo uma súbita surdez, por exemplo, (aqui lembrando uma determinada paciente histérica que Freud tinha), como no próprio sistema neuronal, originando-se, por exemplo, uma paralisia de algum membro ou mesmo uma contratura muscular.
Já na segunda, dissociativa, o estímulo resulta num sentimento de verdadeiro pavor, gerando atitudes que não são entendidas de acordo com um sentido lógico, sendo, assim, dissociadas, e que podem levar a pessoa a um estado extremo de despersonalização, como desmaiar, por exemplo. Um exemplo, tido como clássico na psicanálise, seria o pavor de barata.
A sensação extrema e repulsiva sentida por esse bicho e o proceder da pessoa, com gritos, subindo nas cadeiras, camas e mesas, é certamente proveniente de uma vivência passada, fixada no inconsciente da pessoa.
Conclusão do funcionamento das neuroses
Concluindo, vimos que a neurose é, por definição, uma afecção psicogênica cujo sintoma é um conflito psíquico desejo/defesa, que tem raiz na infância e, quando isolado este, se consegue identificar 3 tipos clínicos, ou seja, a fobia, a obsessão-compulsão e a histeria. Foi fornecido o conceito de neurose, cunhado por Freud como uma das três organizações psíquicas de uma pessoa, e que tem no recalcamento o seu mecanismo de defesa central, e num certo sentido, pode acometer todos nós, devido ao estresse do cotidiano.
Neurose agora é o distúrbio neurótico. Vimos que, além do recalcamento, há as outras principais defesas do Ego, como a regressão, o deslocamento, a projeção, a chamada conversão orgânica, a racionalização, a forma reativa e a sublimação. Considerou-se a fobia, quando o contato ou a recordação de um determinado objeto pode causar reações inexplicáveis e desproporcionais de medo. A barata foi lembrada! Sustentou-se que uma outra importante psiconeurose é a obsessão-compulsão, com hábitos e rituais de natureza animista.
Derradeiramente, descreveu-se a histeria, a psiconeurose que deu início, por assim dizer, à Psicanálise de Freud, e que apresenta dois tipos, a de conversão, que é somática, e a dissociativa, com sensações de despersonalização. E ainda foi citado que o termo “neurose” foi duramente criticado e já na CID-10, em 1994, a nomenclatura passou a ser “distúrbio neurótico”.
Este artigo sobre o Funcionamento das Neuroses: mecanismos de defesa e características das neuroses foi escrito por Kurt V. Rodrigues exclusivamente para o blog do Instituto Brasileiro de Psicanálise Clínica.
One thought on “Funcionamento das Neuroses: mecanismos de defesa e características”
Parabéns! Uma síntese da teoria freudiana muito bem elaborada!