Nesse artigo vamos abordar sobre o papel da psicanálise, um tema que nunca foi abandonado e vem por anos a fio tangenciando reflexões tanto dentro como fora da área da Psicanálise e que diz respeito também, a todos os demais campos dos saberes: a capilaridade e o papel da Psicanalise.
Vamos responder um quesito proposto por muitos analistas, qual seja: “Sob o prisma e a perspectiva social, qual é o maior e persistente desafio da Psicanálise na vigência da pós-modernidade dos tempos líquidos”? O tema esta no rol dos clássicos tremendamente atuais.
Introdução sobre o papel da psicanálise
Nesse ensaio (pequeno artigo) vamos fazer um enfoque sobre um dos temas do rol dos clássicos da Psicanálise que nunca foi abandonado e vem anos a fio tangenciando as reflexões tanto dentro como fora da área psicanalítica e diz respeito também, a todos os demais campos dos saberes: “a capilaridade e o papel da Psicanalise”.
Vamos entender e compreender bem o que é a capilaridade e sua batalha com as teses dos nichos blindados, a luta entre o sistema fechado e o sistema aberto ao tecido social, o papel histórico e o futuro (teleologia) do espírito das leis, a consciência dos operadores da Psicanálise. O contexto do despertar de Lacan (1901-1988) sobre o tema, a questão da modernidade e a emergente pós-modernidade, as interfaces que surgiram no horizonte, além das tradicionais, o Estado da demanda judicial e a linha rentista-monetarista com darwinismo social.
Por derradeiro do desfecho, na conclusão, vamos ofertar a resposta ao quesito proposto por muitos analistas “Sob o prisma e a perspectiva social, qual é o maior e persistente desafio da Psicanálise na vigência da pós-modernidade dos tempos líquidos”? O tema esta no rol dos clássicos tremendamente atuais. Vamos avançar entendendo primeiro o que seja a tal capilaridade social.
Papel da psicanálise e o que é a capilaridade social?
O termo ‘capilaridade’ é muito antigo. Vem do latim ‘capillaris’ que significa ‘do cabelo’; tal concepção remete que o cabelo da cabeça naquela época antiga era a menor unidade visível, onde chega a energia vital. O termo tem vários sinônimos e aplicações em diversas áreas, desde as áreas exatas até humanas. É uma condição do que tende a subir, a descer, a percolar, penetrar e por determinado meio, chegar em todas as pontas, se esparramando e se distribuindo uniformemente como um todo num tecido. O sangue é considerado um dos melhores exemplos de capilaridade partindo do singular para o coletivo.
A capilaridade começou a ser entendida mais tarde como uma característica de dividir, entretanto, estando em todos os pontos ao mesmo tempo. Pela via das diversas formas de interface (inter, pluri, multi, trans e poli disciplinares) migrou para ciências sociais e políticas, onde ser capilar é estar presente em todos os pontos. Capilaridade passa a ser concebida como “o todo para todos o máximo possível”, que chegue a todo o território e que tenha uma centralização sensível, ou seja, possa ser sentido onde chegar. É o máximo possível para todos. Também, significa o espaço ocupado por uma organização num território, por um povo, uma forma de abranger, visando ampliar o seu alcance e atingir o maior número possível de pessoas.
Ainda, tem um significado de mobilidade de grupos sociais sendo capilar o que chega em todos os pontos com capacidade de criar ações e processos e situações que impulsionem estratégias, políticas, táticas, operações, produtos ou serviços por níveis e estratos, desde os inferiores até os superiores em várias direções e superfícies. Não podemos confundir mobilidade social, com capilaridade social. Para exemplificar bem a capilaridade foi realizado anos atrás uma pesquisa de mercado para se saber qual o produto era mais capilar possível e qual sua taxa aproximada de capilaridade (distribuição). Água, sabão ou sabonete, sal, açúcar e farinha além de outros, como fósforos e bebidas foram considerados produtos bem capilares com uma taxa de capilaridade de aproximadamente 98% da população.
Outro exemplo sobre o papel da psicanálise
Outro exemplo, foi o sangue, onde uma pessoa pode se cortar em qualquer parte do corpo vai sangrar ou jorrar o sangue. Isso seria entendido por analogia como capilaridade. O sangue para o ser humano é praticamente 100% capilar. Uma epidemia poder ser altamente capilar como foi o ‘case’ da pandemia do vírus ‘Covid’ que raras pessoas não contraíram, com uma taxa de capilaridade de 99,7%. A capilaridade passa a ser entendida como o “máximo possível do todo, para o mais possível de todos”. A batalha longa entre a concepção ‘capilar’ versus nichos ‘fechados’ e blindados.
Até ser perfeitamente bem compreendido o conceito de capilaridade e seu transladado por interfaces para outros campos do saber, o termo ainda carecia de amplitude até ser bem adaptado aos estudos sociais e geográficos além de históricos, obtendo um melhor alcance. Isto somente até ao final do século XIX. A partir do limiar do século XX, o termo ‘capilaridade’ começa a se espraiar bem melhor nas análises sociais, ultrapassando as ciências biológicas, físicas e químicas. O termo ganha tração e dimensão de aplicação. Capilaridade passa a exercer um jogo dialético de tese contra tese (antítese) e chegando a uma síntese num ‘devir’ de linguagem quando antagoniza com o termo ‘nicho’, ou segmento fechado, o seu polo oposto ou contrário.
Criam-se dois polos, um fechado, que seria o nicho ou segmento blindado, geralmente por leis e um bem aberto, e de inspiração de muitos teóricos, que seria o capilar ou seja, o ‘para todos o máximo possível’, que passa a ser denominado de visão capilar e tem as aplicações finalmente nos demais campo sociais. A partir desse novo enfoque e com a consolidação da Sociologia e das Ciências Políticas o termo passa a ser de grande aplicação como antítese de nicho ou segmento fechado.
Segmentos blindados
O termo finalmente se consolida e passa a fazer parte de uma batalha longa com a percepção social de ser contra tudo o que é fechado, como os nichos e segmentos blindados. Com a estruturação das esquerdas, ser capilar vira uma obsessão, o termos ganha força motriz. Políticas públicas passam e precisam ser mais capilares possíveis. Libertar setores vira sinônimo de capilaridade.
O próprio chamado projeto libertador social comunista passa a desejar capilarizar tudo o máximo possível para todos. As constituições nacionais introduzem vários vieses de capilarização. Cidadania, integração e acesso a tudo por todos em termos de produtos e serviços, passa a ser algo capilar social.
O papel da Psicanálise na análise ‘teleológica’ do espírito das leis
A nova dimensão da concepção e percepção do alcance do conceito de capilaridade forçou vários atores sociais buscarem um ‘escudo protetor’ nas leis. As leis positivas e imperativas muitas das quais compulsórias e obrigatórias passam a ser usadas como instrumentos de controle social para barrar a capilaridade e garantir nichos fechados e blindados de grupos associados em conjuntos de interesses-alvos nas sociedades. A Sociologia e a História vão desvendar essa atitude, porém, a Psicanálise terá o papel de buscar a etiologia da situação.
Por isso surge a expressão blindados. As leis são usadas politicamente por Parlamentos com representantes de elites e do capital como guarda-chuvas protetor para evitar a abertura do que esta e deve, na visão desse segmentos ficar hermeticamente fechado mesmo tendo que administrar mecanismos de defesa como a culpa. A História tem demostrado que acabam abrindo ou capilarizando os sistemas fechados. Um dos exemplos bem típico foram os cursos EaD, e-learning, on line, síncronos e assíncronos que acabaram abrindo verdadeiro nichos muitos fechados e blindados que caíram.
Ainda temos (21) vinte um cursos blindados por leis políticas de grupos que negam o acesso capilar com argumentos fracos em plena pós-modernidade dos tempos líquidos da alta tecnologia. O papel da Psicanálise passa ser de ajudar a desvendar as motivações questionado em todos setores sociais e nas casas políticas e entendendo os espíritos teleológicos das leis, ou seja, o que poderemos esperar para o futuro com tais leis editadas por conflitos de interesses de nichos que negam o acesso capilar social. Muita dor e culpa. A consciência critica dos operadores da psicanálise clássica.
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O papel da psicanálise e Lacan
A macro visão e percepção capilar versus a visão e percepção de nichos ou segmentos, ou seja, o sistemas abertos contra o sistemas fechados aportou na Psicanálise pelas mãos de Jacques-Marie Émile Lacan (1901-1981), psicanalista francês, que estudou medicina, se orientou em direção a Psiquiatria e fez doutorado em 1932, com a tese sobre ‘Da Psicose Paranóica em suas Relações com a Personalidade’, onde ele conhecia muito o conceito de capilaridade. Lacan tira a Psicanálise do enfoque mais da nobreza e burguesia e encaminha para um acesso da pequena burguesia ou classes médias e populares. Evidente que o tema merece inclusive uma tese de mestrado, não foi totalmente na direção possivelmente que ele queria atingir bem mais as classes pop, mas ele levou para classe média francesa.
E depois foi se espalhando pelo planeta. Lacan num de seus seminários propõe mudanças fortes, inclusive do ‘passe’ que na visão dele iria qualificar mais a formação técnica do psicanalista. A partir de Lacan a Psicanálise adentrou forte nas classes médias do mundo todo. E isso foi importante para a consolidação de uma consciência crítica dos operadores da Psicanálise que já estava em curso em que pese ser ainda muito vinculada a Psicanalise clássica, ligados aos conceitos da primeira e segunda geração de psicanalistas a partir de seus sistematizador, Sigmund Freud (1865-1939). Jacques Lacan era da segunda geração tardia.
Percebemos bem pelos seus escritos de próprio punho que Lacan não rompe com o fundador e estruturador da Psicanálise, muito pelo contrário, ele reforça a consciência crítica dos operadores psicanalistas e aprofunda temas buscando uma máxima capilaridade possível na esfera de atuação dele. Não é temerário ser afirmado que Lacan lançou os pilares para uma Psicanálise mais capilar possível. Lacan possuía uma concepção e maior percepção da importância da Psicanálise ser mais capilarizada. Tanto é verdade, que ele propõe medidas práticas, sessões mais curtas, honorários mais leves, devoluções de impressões, sair das sessões rígidas, partilhar mais, dispensa do divã, sessão caminhada ao ar livre, uso da poltrona, entender as historicidades e enraizamentos, e tudo mais.
A linha rentista-monetarista
Foram atitudes com medidas práticas de fundo bem mais capilar possível. Lacan não defendia ser de graça a sessão obviamente, mas ser mais capilar possível conforme podemos depreender pelas suas fontes registradas (escritas) nos seus seminários que legou para novas gerações de psicanalistas. Ele tira aquela carapaça de caráter muito nobreza e burguesa da Psicanálise. Esta teria sido e continua sendo a grande preocupação dos operadores da Psicanalise, a linha rentista monetarista que chegou junto com a transição do ‘moderno’ para o ‘pós-moderno’ e ‘trans-moderno’ com todas suas demais vinculações tecnológicas, principalmente os algoritmos e mais a Neuropsicanálise.
Os analistas já possuem uma determinada convergência de que as ‘interfaces’ sejam elas inter, multi, pluri, trans e polidisciplinares não tem mais volta. A premissa de que a mente não é algo isolado, mas sim produzida pelo cérebro abalou de certa forma um corrente monista que entendia a mente como algo supremo sem causa geradora. Freud alertou num artigo produzido da importância de ser considerada a neurobiologia no futuro. Não estava equivocado. Entretanto, a linha rentista-monetarista tem sido preocupante bem como a batalha para barrar a capilaridade que o setor vem experimentando.
Nunca antes na História a Psicanalise conheceu um ‘boom’ como vem experimentando com as redes sociais. Isto é fruto direto da capilarização crescente da Psicanálise. Evidente que a pandemia do covid ajudou muito. Muitos pontos foram questionados, como a demanda judicial induzida por leis. A capilaridade vem colocando em xeque os diversos nichos fechados e blindados por leis, que não conseguem mais se manter fortes e firmes em razão da própria auto maturidade de muitas mentes que desejam capilarizar enxergando os riscos sérios de manter uma linha rentista-monetarista com uma grande massa de excluídos e desintegrados (fora das redes sociais).
Riscos e perigos
Operar um ‘darwinismo social’ virou sinônimo de riscos e perigos além de ameaças ao seres humanos que ficam a margem. Muitas pessoas preferem até romper com sistema e ir morar nos matos ou se retirar do que alimentar um sistema fechado e blindado presenciando a dor alheia e seus pares acabam cedendo à capilaridade.
Porque manter nichos fechados e blindados contra a capilaridade social não agrada mais ninguém. Para muitos a vida é curta e temos muitas doenças e não desejamos ver outros encapsulados em bolhas de mazelas e privados de acessos por causa da imposição de nichos fechados e privilégios.
Os cooptados pela linha rentista-monetarista e iludidos com o darwinismo social ainda insistem numa sociedade da demanda judicial e geradoras de profundas desigualdades, muita dor e ranger de dentes, falta de isonomias de direitos com inobservância de preceitos constitucionais. Cabe a Psicanálise desvendar e desatar esses nós.
Pós-modernidade e transmodernidade
Já existe uma consciência superior universal em andamento, independente do nível cognitivo e das classes de rendas, dos fenótipos e genótipos engendrados pelos DNA’s, de que estamos todos sem exceção, como passageiros transitórios, ligados pelo condão da morte, esperando cada um pelo seu ‘momento more’ num ‘carpe diem’ alguns ansiosos, outros deprimidos, muitos angustiados e em pânicos, com patologias e psicossomáticos e muito infelicidade geral aprisionados pela atmosfera, pois dependentes do oxigênio, a bordo numa bola de terra, ferro e muita água, com um núcleo incandescente vagando por um Universo imenso que ainda não sabemos se esta em expansão ou retração, com um sol que tem prazo de validade em busca de uma felicidade.
E já estamos numa grande transição da modernidade para a pós-modernidade dos tempos líquidos rumo a uma transmodernidade de forma mais acelerada ainda. O desafio, portanto, na concepção de muitos analistas será duas opções, ou a busca de uma maior capilaridade possível ou a tentativa de viver mais nicholados e segmentados aguentando as dores e sofrimentos dos sinais e sintomas. Eis o grande dilema humano.
Conclusão: sobre o papel da psicanálise
Diante de tudo o que foi acima exposto para consideração e reflexão, chegamos ao momento derradeiro de ofertar uma resposta ao questionamento que foi proposto: “Sob o prisma e a perspectiva social, qual é o maior e persistente desafio da Psicanálise na vigência da pós-modernidade os tempos líquidos?”. Entendemos que o maior desafio nessa transição do óbito da modernidade para a nascente e florescente pós-modernidade será de tornar a Psicanalise mais capilar possível; que seja de acesso a todos os extratos sociais, independente das rendas, status, posição de classe e cognição.
A Psicanálise vem se capilarizando de forma crescente, por passos e etapas, em que pese a linha rentista-monetarista ainda ser forte e pressionar para manter nichos fechados e blindados. A Filosofia não conseguiu o que a Psicanálise vem conseguindo junto ao tecido social, de conscientizar que formação de nichos, de darwinismo social, de demandas judiciais não tem mais razão de ser. A Psicanálise tem potencia para dar respostas plausíveis e confortos psíquicos temporais pelo menos até chegada do ‘momento more’ mais suave, diante de tantas mazelas, onde a depressão, câncer, drogas e demais patologias e mazelas sociais tem sido uma constante.
Ninguém imaginava que o planeta entraria em quase colapso pelos micro organismos (vírus, bactérias, protozoários, algas, germes) precisando de grande carga de imunologias por vacinas, e todos controlados por algoritmos e um custo de vida caro puxado pela linha rentista-monetarista irracional. Este, portanto, será o grande desafio puxado pela Psicanálise, de buscarem uma sociedade mais capilar possível, com o papel do Estado ativo na cidadania ou teremos que aceitar a autodestruição gradual com temperaturas elevadas, muitas doenças e meio-ambiente sendo degradado. A opção será apenas nossa, dos humanos.
Artigo escrito por Edson Fernando Lima de Oliveira, Licenciado em História e Filosofia. PG em Psicanálise. PG em Filosofia Clínica, PG em Farmácia Clínica e Prescrição Farmacêutica. Cursando Neuropsicanálise. Contato via e-mail: [email protected]
One thought on “Papel da psicanálise e sua capilaridade social”
Caros amigos e leitores desse prestigiado blog da PsicanáliseClinica.com. Este enfoque (pequeno artigo) foi concebido depois de um evento, onde alguns disseram, de forma sincera, e eram bem jovens, que não sabiam bem o que era a tal ‘capilaridade social’.E outros não imaginavam que havia um luta intestina entre os que desejam capilarizar mais a sociedade, em todos os sentidos, versus os que, consciente ou inconscientemente, querem manter os nichos fechado e blindados protegidos por ‘law fares,’ leis forjadas em benefício e conflitos de interesses de grupos e núcleos de poder. Pois bem, esperamos que tenha atingido o objetivo de esclarecer bem o que é a capilaridade. Pessoas que são adeptas da TLC, Teoria da luta de classes, dizem, olha, o motor da História é a luta de classes, ao passo que outros dizem, não, é capilaridade versus os nichos e o uso das leis (law fare).Outros ainda, dizem, não, é a ética versus a antiética, e por vai e tudo mais. Pois bem, a História é multifatorial, porém, o fator proeminente é o fator ético-moral, na visão e percepção de muitos. Já foi feito um texto anos atrás sobre esse tema que vamos reler e fazer ajustes finos e remeter para publicação a luz da Psicanálise. Era o que havia a expor e segue para consideração.