origem da depressão

A Origem da Depressão: da Antiguidade à Contemporaneidade

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Vamos refletir sobre a origem da depressão, ou seja, a Gênese da Depressão. Como era concebida no decorrer dos séculos, da Antiguidade à Contemporaneidade?

A origem da depressão

A tristeza é companheira do homem desde sua origem, se remontarmos aos mitos predecessores, eles tiveram um importante papel de trabalhar com as obscuridades humanas. Sendo assim, o mito, do grego, “mythós” e significa: relato, lenda, tinha como função de dar sentido para as contradições da existência, ou seja, o mito era antecedido pela lógica, ele extraía acepções para os seres humanos. Que Eva tenha sido criada para afastar de Adão a sua solidão, e que o casal tenha submergido, pelas vias do pecado original, na culpa e no remorso tão presentes entre os melancólicos, é hipótese freqüentemente evocada. Fato é que a origem da depressão, podemos afirmar, faz parte da própria estrutura humana (PERES, 2006, p. 12).

Depressão é uma dor que busca por sentido, um sofrimento difícil de ser simbolizado. Embora o homem seja um ser simbólico desde os primórdios, mitos, a depressão vem como um vazio do exisitir, o indivíduo é ofuscado por um sentimento que inibe a capacidade de dar ou receber afeição. Ela desconstrói qualquer tipo de lógica, colocando o sujeito numa profunda dor de desamparo, isto é, qualquer empreendimento emocional é parco diante de um pesar desproporcional ocasionado pelo sentimento da origem da origem da depressão. Portanto, ela só pode ser associada com alegorias e metáforas, devido à sua característica de desencanto absoluto. As fontes históricas situam no canto VI da Ilíada de Homero (versos 200-203), pela descrição dos sofrimentos de seu herói Belerofonte – condenado pelo ódio dos deuses a vaguear solitário na planície de Aleão, submergido no desespero e solidão -, uma das primeiras análises desse mal-estar que atravessou os tempos e se faz tão presente na atualidade (PERES, 2006, p. 12).

Como expressa Peres (2006, p. 13), em relação à origem da depressão, Homero foi o primeiro a fazer referência sobre uma medicação produzida pelo ser humano com o objetivo de buscar alívio ao mal- estar. Hipócrates, pai da medicina, IV a. C., sistematizou as ocorrências melancólicas e pontuou passos mais elaborados acerca da história da depressão no mundo ocidental. De acordo com Monteiro (2017), Hipócrates assinalou o termo melancolia a partir de duas outras palavras do grego: “mêlas”, negro e “kholê”, “melankholia”. Melancolia significa: bile negra, na teoria de Hipócrates, o ser humano seria constituído por quatro tipos de humores: melancolia, bile negra, origem no baço; bile amarela, origem no fígado; sangue, origem no coração e fleuma, origem no sistema respiratório. Monteiro (2017), no texto intitulado Da Natureza do Homem, Hipócrates (ou seu genro Polibeu, não se sabe ao certo) estabeleceu uma correspondência entre os quatro humores, as quatro estações do ano e as quatro características fundamentais da matéria (quente, fria, seca e úmida). A cada um dos humores ele relacionou um sintoma psicológico.

Ainda sobre a origem da depressão

Em seu estado normal, o homem teria os quatro bem equilibrados. Assim expressa Monteiro (2017), “se a tristeza e a angústia não passam, o estado é melancólico, disse Hipócrates em seus Aforismas.” O problema se daria em casos de excesso de um ou de outro: bile amarela demais causaria um temperamento raivoso, bile negra em abundância provocaria a depressão. De acordo com Peres (2006, p. 14), “contudo, é atribuído a Aristóteles, ainda que sem certeza absoluta, o primeiro tratado sobre melancolia, que prevalecerá por toda a Antigüidade.” A melancolia, uma neurose narcísica, perpassou por estudos médicos e filosóficos, tanto que o filósofo Aristóteles intitulou a melancolia como o estado proveniente da bílis negra. Como afirma Peres (2006, p. 14), “a Problemata 30 nos fala da relação entre a genialidade e a loucura.” A melancolia seria uma predisposição natural do indivíduo à origem da depressão, entretanto, nem todos seriam portadores do sentimento melancólico.

Somente os homens, de acordo com Aristóteles, sábios é que possuíam características melancólicas: filósofos, poetas, políticos, matemáticos, em síntese, todo homem de exceção era detentor da melancolia, dotado de especial poder imaginativo. Na assertiva de Peres (2006, p. 15), “ciência e misticismo se reúnem, o calor – princípio regulador do organismo – e a mesotes – equilíbrio entre energias opostas – são responsáveis pelo humor.” O filósofo compreendia a melancolia como um atributo patológico e desejável. A melancolia deixa de ser uma doença e se insere na própria natureza. É provável que Aristóteles tenha recebido a influência de um ensaio de Theophastus, Peri melancolias, que se extraviou. Empédoeles, Sócrates, Platão, muitos poetas e homens ilustres são considerados portadores de melancolia, assim como os heróis míticos Hércules, Belerofonte, Aiace e Lisandro (PERES, 2006, p. 15).

A melancolia é a própria natureza do gênio, onde o mesmo comportava humores inclinados ao conhecimento e curiosidade empírica. A tristeza é a força motriz para a compreensão do mundo, seres ou dados objetos. Que a melancolia seja a condição da genialidade, do pensamento, da filosofia e da literatura é uma concepção que fascina, e muitos a defendem até os dias de hoje. A origem da depressão e criação ficam indissociáveis; o homem triste é também o homem profundo, a alegria é superficial (PERES, 2006, p. 15). Genialidade e melancolia como instâncias indispensáveis para a produção de novos conhecimentos, melhor dizendo, o indivíduo que é gênio é detentor de qualidades que excedem sobremaneira a medida necessária para o comum desempenho da vontade. Tais qualidades são avizinhadas com a melancolia, um estado de esperança, uma psiconeurose narcísica, a perda da libido devido a um objeto ou ser que partiu. Enfim, cada época possui suas características particulares. E estas são sempre determinadas pelas condições de seu tempo.

A melancolia

O tempo presente apresenta registros simbólicos e socioculturais que permitem exprimir novos tipos de configurações culturais e sociais. Já na Idade Média, no raciocínio de Peres (2006, p. 15), a Escola de Salerno buscou compreender o temperamento melancólico, escola representada por Constantinus Africanus . A melancolia estaria atrelada ao excesso de um elemento seco e frio no organismo do ser humano. Peres (2006, p. 15), “o médico e alquimista suíço Paracelso defende a teoria médica baseada na concepção alquimista das correspondências ou analogias entre as diferentes partes do corpo (microcosmo) e aquelas do universo na sua totalidade (macrocosmo).” No dizer de Peres (2006, p. 15), Paracelso compreendia a melancolia a partir de substâncias carregadas por Adão e Eva. Adão tinha contido em si a tristeza, Eva a alegria. Adão e Eva misturaram as substâncias e geraram o equilíbrio, também ocorrendo com a violência, tirania, ira, convergidas com a doçura, modéstia e virtude.

Como enfatiza Peres (2006, p. 16), “ainda na Idade Média, através da ciência árabe, a teoria dos humores vai se ligar à astrologia.” Peres (2006, p. 16), os sentimentos melancólicos e da origem da depressão estariam ligados às forças astrais e suas doutrinas. O melancólico estaria sob a governança do astro Saturno, o mesmo cuidaria somente dos seres geniais e extirparia os limitados. Monteiro (2017), Tomás de Aquino (1227-1274), grande filósofo do cristianismo, compreendeu a melancolia como uma devastadora tristeza produzida no espírito humano, onde ele não tem mais vontade de fazer nada. O Ocidente Médio, digamos assim, constituiu uma nova etimologia para o termo melancolia. Seu significado foi direcionado para o que é mal ou doente. Na citação de Monteiro (2017), “ora, não haviam muitas opções. Ou escondia o pecado, ou rezava para tentar banir o abominado sentimento de sua alma” O homem medievo não possuía uma sistematização acerca da melancolia, ele não tinha muito o que fazer com o sentimento melancólico.

As orações e pedidos a Deus eram o caminho mais profícuo para a época. Mendes, Viana e Bara (2014, p. 2), “antes mesmo do fim do século XVI, há uma desmistificação dos prestígios relacionados à melancolia.” Os males e consequências da melancolia começam a ser dissecados, tanto que ela é apontada como traços patogênicos e necessário tratamento. Genialidade e imaginação são dissociadas da melancolia, ela não é mais tida como uma característica original, mas um mal. No Renascimento predomina a distinção entre a melancolia sublime e a melancolia vulgar, teoria atribuída a Marsilius Ficinus, médico florentino, autor de Da vita triplice. Ficinus foi também fascinado pela astrologia; o seu tratado reúne quatro tradições de pensamento: a hipocrática (teoria dos humores), a platônica (poesia e furor), a astrológica (Saturno e melancolia) e, por fim, a aristotélica, que vincula melancolia e genialidade. (PERES, 2006, p. 16).

Platão, Aristóteles e a origem da depressão

A melancolia, para Marsilius, era uma grande desordem nos humores do homem, mas também uma excelente oportunidade para o ser humano avançar nos aspectos científicos. O advento da Renascença é marcado pelo retorno dos autores Platão e Aristóteles. Mendes, Viana e Bara (2014, p. 2), “de acordo com Földényi (2012) para Platão o delírio está associado ao poder divino.” A melancolia é o acesso para Deus, o escolhido tem passagem para o outro mundo, sendo capaz de desvendar o futuro dos homens. Peres (2006, p. 17), “nos séculos XVI, XVII e XVIII, período que corresponde ao classicismo, para Michel Foucault, produz-se uma passagem de uma causalidade sustentada pelas substâncias- ainda a teoria dos humores – para uma causalidade das qualidades.” No pensamento de Peres (2006, p. 17), é o período em que surge o entendimento sobre a transmissão da qualidade do corpo para a alma, dos órgãos para o comportamento, do humor para as ideias, entre outros.

Na explicação de Peres (2006, p. 17), “no século XVIII, a análise da melancolia está cada vez mais dirigida para a ênfase nas qualidades – solidão, inibição, amargura e tristeza.” O século XVIII é marcado por duas concepções acerca da melancolia, por meio dos estudos de A. C. Lorry. Peres (2006, p. 17), Lorry estipulou duas determinações acerca do estado melancólico: humoral e nervosa. No conceito de Peres (2006, p. 17),“contrações excessivas das fibras do sistema nervoso, por um grande espasmo, se fariam seguir por uma atonia, languidez, que explicaria as alternâncias de paroxismos e desfalecimentos no comportamento melancólico.” Tudo desenvolvido para o avanço humano acerca do estudo dos humores e suas reações na personalidade . Phillipe Pinel , final do século XVIII, realizou um profundo estudo sobre as perturbações mentais. Peres (2006, p.17), “Pinel baseava-se, sobretudo, na observação clínica, procurando agrupar sintomas em síndromes, porém sem uma preocupação teórica maior.”

Peres (2006, p. 17), Pinel sistematizou os sintomas melancólicos e da origem da depressão, atribuindo como um delírio dirigido para um objeto ou um conjunto, com abatimento, morosidade e uma leve inclinação ao desespero. A melancolia seria um errôneo julgamento do indivíduo com relação ao seu próprio corpo. Os trabalhos de Pinel foram desenvolvidos pelo seu discípulo Esquirol, que se empenhou em descrições clínicas detalhadas e mais precisas. Esquirol destacou uma nova classe, as monomanias, que agrupava por um lado a mania sem delírio de Pinel e uma parte da melancolia, e por outro, a lipemania. (PERES, 2006, p. 18). Esquirol , na perspectiva de Peres (2006, p. 18), em 1818, definiu a melancolia como uma monomania, isto é, uma ideia fixa acompanhada por delírios, tristezas e desgostos pela vida. A melancolia tem seu significado reformado a partir do século XIX.

A origem da depressão e a fraqueza mental

O sentimento entendido como fraqueza mental é visto como glamour e vislumbre romântico. Apesar de todo peso psíquico, a literatura romântica e inglesa via os traços melancólicos como fontes lúcidas e cristalinas de produções literárias, ou seja, a dor produz arte. O pensamento romântico e melancólico influenciou vários escritores de outros países. Como frisa Monteiro (2017) “o tuberculoso e taciturno Álvares de Azevedo (183-1852), autor de A Lira dos Vinte Anos, é o escritor brasileiro que melhor incorpora a linha.” Os escritores melancólicos traziam em seus escritos, palavras que apontavam para o estilo melancólico: morte, tempestade, anoitecer, sono eterno e assim por diante. Diante disso, os médicos passam a olhar para a melancolia como uma doença que precisa ser mapeada e tratada. Poesias e filosofias não mais preenchem tal dor humana.

Mendes, Viana e Bara (2014, p. 3), “para Esquirol, a monomania é mais frequentemente de origem hereditária, sendo fortificada pelos vícios da educação, e também por causas morais (Clair, 2005).” Cada vez mais, por meio de estudiosos e cientistas, os sintomas melancólicos vão sendo desmitificados. As fontes hereditárias e culturais são apontadas como gatilhos para a melancolia. Esse fato marca o início da substituição, e consequentemente, confusão dos termos melancolia e depressão. De acordo com Berrios (2012), o que facilitou a remodelação da melancolia e a predominância do conceito de doença depressiva foram os estudos de Esquirol, que ao fazer a distinção entre melancolia e depressão, enfatizou a natureza afetiva primária da doença. Na citação dos autores Mendes, Viana e Bara (2014, p. 3), “a palavra depressão já aparece nos dicionários médicos em 1860.” Eis que a depressão começa a emergir com características próprias e estruturadas.

Na ideia de Peres (2006, p. 18), “o século XIX fecha terminantemente a teoria dos humores, e nesse movimento de repúdio a designação de melancolia também perde terreno. Surge a expressão monomania triste: ou lipemania.” Peres (2006, p. 18) a psiquiatria mantém uma direção para psicose maníaco- depressiva, recebendo de Email Kraepelin uma descrição completa do quadro clínico: delírios e acessos depressivos. De alguma maneira, o surgimento dos asilos muito contribui para a “transformação de uma doença da grandeza da alma e do gênio em miséria afetiva’: Verdadeiramente, o caráter “sublime” da melancolia entra em declínio (PERES, 2006, p. 19). E a partir do século XIX, a fadiga melancólica ganha espaço na humanidade como a doença da modernidade. No final do século XIX, a neurastenia ganha a dimensão de “doença da modernidade’: O acelerado desenvolvimento industrial, a agitação dos grandes centros urbanos, as novas condições de vida disseminam uma fadiga generalizada. O operário e a operária são símbolos do homem e da mulher extenuados (PERES, 2006, p. 19).

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    Os padrões sociais e culturais

    Georg Beard organizou uma etiologia para o sofrimento mental. Os padrões culturais e sociais são introduzidos como fontes de adoecimento emocional. Peres (2006, p. 19), “surge então uma nova causalidade, distante dos padrões tradicionais da medicina. Um acontecimento que gere uma reação patológica pode assumir a dimensão de um trauma e ser o fator desencadeante.” Os nervos agora são parte dos estudos da medicina, o campo investigativo é ampliado para compreender o porquê dos sintomas e reações. As abordagens para a busca das causas sociais não são mais suficientes. Cabe a Charcot, nesse momento, um importante papel. Contrariando a opinião mais aceita, ele questiona a maior incidência da neurastenia nas classes trabalhadoras e eleva a noção de trauma como elemento da maior importância entre os fatores etiológicos, que podem acontecer a qualquer um (PERES, 2006, p. 19)

    Jean-Martin Charcot descortinou para a humanidade os sintomas histéricos, ou seja, sofrimentos que não são justificados através do físico. Observando o pensamento de Peres (2006, p. 20) “a histeria masculina é preferencialmente atribuída a acidentes e causas tóxicas, enquanto a feminina é sobretudo provocada por emoções.” Para Peres (2006, p. 20) ,Charcot constitui o conceito contemporâneo de neurose, assim dizendo, uma doença provinda das vias mentais e sem envolvimento de ordem orgânica, mas ela é ocasionada por um trauma. Sigmund Freud fez um distanciamento entre melancolia e depressão. A primeira está ligada com a ausência de desejo sexual, enquanto a segunda está próxima de uma neurose constituída por angústia. A origem da depressão brota de um dado evento traumático e real, ocorrendo o desinteresse pela realidade. O desinteresse acontece pelo fato da elaboração tencionar toda energia psíquica para ela, com o objetivo de solucionar o trauma. Já o sujeito melancólico está perdido em seu objeto, uma perda narcísica, ausência do eu. Mendes, Viana e Bara (2014, p. 7), “assim como a melancolia foi uma forma de expressão do mal-estar no século XIX, a depressão tem sido considerada o mal-estar do século XXI.”

    O mal estar do século XXI seduz o indivíduo para uma vida individualista e de descompassos sociais. O próximo capítulo abordará uma breve biografia de Sigmund Freud. SIGMUND FREUD: UMA BREVE BIOGRAFIA Sigmund Freud nasceu em 06 de maio de 1856, na cidade de Freiberg, atual República Checa, região da Morávia. Na linha de Matos (2021), Freud nasceu em berço judaico e aos quatros anos foi morar em Viena, no colégio Gymnasium. A teoria da evolução de Darwin despertou um profundo interesse em Freud, sendo assim, ouvindo o professor Carl Bruhl, Freud decide fazer a faculdade de medicina. No pensar de Matos (2021), e no ano de 1873, Sigmund Freud ingressou para o mundo universitário, sendo, aliás, um notável aluno. Matos (2021), “dentro das mais variadas áreas da medicina, Freud se interessava exclusivamente pela psiquiatria. Recebeu seu diploma em medicina em 1881, o que considerava tardiamente.”

    Estudos de Freud e a origem da depressão

    Por possuir uma realidade financeira precária, ele deixou sua carreira de cunho teórico para ingressar no Hospital Geral. Na citação de Matos (2021) “[…] como assistente clínico sob orientação do professor de psiquiatria Meynert e cujo trabalho sobre personalidade o interessava.” Como explicita Matos (2021), durante alguns anos, Freud trabalhou como estagiário e realizou uma série de artigos sobre o sistema nervoso e suas doenças orgânicas. Segundo Matos (2021), “no ano de 1886, Freud passa a morar em Viena e se casa com Martha Bernays.” Matos (2021), Freud conhece o doutor Josef Breuer e compartilha seus estudos científicos com ele. Em seguida, separou-se de Breuer, abandonou a hipnose e se dedicou a novos estudos, e consequentemente a novas descobertas. Se dedicou a entender como os pacientes esquecem acontecimentos de sua vida, e entendeu que de certa forma o que fora esquecido era conflitante ou vergonhoso para ele (MATOS, 2021). Ao longo de aprofundamentos e estudos, Freud percebeu um mecanismo de resistência no ser humano, portanto, ele constituiu a teoria da resistência .

    Para vencer a essa resistência, em vez de estimular o paciente a falar sobre algo específico, ele pediu que o paciente falasse o que viesse a sua cabeça, praticando o processo da associação livre (MATOS, 2021). Na linha do raciocínio de Matos (2021), Freud não era um exímio hipnotizador, então ele colocou em prática o método da associação livre. Matos (2021), “[…] ele pedia ao paciente que deitasse no divã e pressionava a fronte com seus dedos, ele acreditava que dessa forma o paciente se lembraria do trauma ocorrido, trauma que estaria esquecido devido à repressão.” Na explicação de Matos (2021), a paciente Elisabeth Von R. pediu que Freud parasse de pressionar sua fronte, para que ela pudesse falar livremente, isto é, eis o nascedouro da associação livre. Matos (2021), “Freud então percebeu que as barreiras contra o recordar e associar provinham de forças mais profundas, inconscientes, e que funcionavam como verdadeiras resistências involuntárias.” Sigmund Freud começa a dar os primeiros passos no que tange as instituições psíquicas.

    Na citação de Matos (2021), “após o afastamento de Breuer, Freud ficou sozinho, foi evitado e criticado por seus estudos psicanalíticos.” Matos (2021), o isolamento chega ao seu final e Freud começa a ter reuniões com um renomado grupo, alguns deles: Steckel , Ferenczi , etc. Ainda Matos (2021), com a sequência de encontros, foi fundada a Sociedade Psicanalítica de Viena. Com as vivências científicas latentes, Freud elaborou três instâncias na mente humana, primeira tópica: inconsciente, pré- consciente e consciente. Mais tarde, reelaborando as instâncias, segunda tópica, Sigmund Freud dividiu a mente do homem em id, superego e ego. Sigmund Freud veio a falecer no dia 23 de setembro de 1939, decorrência de um câncer de laringe. O capítulo seguinte abordará Sigmund Freud e a civilização e a depressão na atualidade.

    Freud e a civilização e depressão na atualidade

    Em todos os séculos da História, os seres humanos produziram sistemas de valores, padrões, regras sociais, tendências culturais, moralidade, ética, conduta, leis, comportamentos, etc. Por meio de tais dispositivos, produziram-se determinadas estruturas de subjetividades: individuais e coletivas. Peres (2006, p. 20), “Freud, em seu texto magistral O mal-estar na civilização, afirma muito claramente que só podemos desfrutar a felicidade como um “fenômeno episódico”: pois somos limitados em nossa capacidade de senti-Ia.” De acordo com Freud, o ser humano tende a experimentar a infelicidade de uma maneira mais fácil do que a felicidade: o primeiro é o corpo, ou seja, ele envelhece e vai sinalizando doenças e desgastes; o outro é o mundo, com seus rompantes beligerantes e o outro são as relações com outros seres humanos e suas tantas decepções.

    Assim, a busca da felicidade acaba por se transformar, apenas, em um esforço para evitar a infelicidade: buscar o isolamento para evitar os conflitos com os semelhantes, tentar proteger-se das intempéries da natureza, procurando agir sobre a própria natureza, e, por último, agir sobre o próprio organismo, quando ele mesmo faz parte dessa natureza (PERES, 2006, p. 21). Peres (2006, p. 21), as relações entre os seres humanos são fontes de mal- estar. A hostilização é parte da natureza do homem, tanto que Freud sugeriu uma análise mais profunda da História da humanidade para obter respostas acerca do homem e sua tendência destrutiva. No conceito de Peres (2006, p. 21), “afastado da natureza, o indivíduo é submetido a uma série de frustra- ções, na procura de atingir um ideal culturalmente estabelecido, e é dessa situação que vai surgir a sua neurose.”

    Mesmo com os avanços da tecnologia, da cultura, o homem não é feliz. Peres (2006, p. 21), “ele pode sentir-se onipotente, qual um “Deus de Prótese” com todos os apetrechos que criou, porém verdadeiramente nada faz parte dele.” Sigmund Freud observou que o ser humano carrega uma culpa consequente do avanço civilizatório. O progresso tecnológico gera decrescimento emocional. No pensamento de Peres (2006, p. 22), “quais sejam, que nossa civilização atua de uma maneira que favorece a depressão. As grandes modificações sociais, as alterações nas relações entre o homem e a sociedade, sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial, falam- nos do incremento desse sofrimento.” Eis que o ser humano está debaixo da velocidade do tempo, aliás, Freud já havia mencionado tal assunto, isto é, a efemeridade é traço do viver do sujeito.

    Da depressão à liberdade

    O homem também está em tempos áureos de liberdade, decidindo situações por conta própria, entretanto, ele está atravessando o advento da desreferencialização, melhor dizendo, a carência de modelos. De nortes que o impulsione na certeza de suas escolhas. O indivíduo social está constituindo sua vida a partir da insegurança, ou seja, o externo, paradigmas, não mais o auxilia, portanto, ele busca suas decisões no interno, em si próprio. As referências de identificação são necessárias, principalmente neste tempo de pós- modernidade , transitoriedade, que o ser humano atravessa. Peres (2006, p. 22), “a depressão pode, sob esse viés, ser considerada uma “patologia das mudanças.” Em vez de uma verdade estática, tudo não passa de uma construção provisória, passível de desconstrução. O pensamento do ser humano é configurado de acordo com a sua cultura. Cada acervo cultural tem suas interpretações, heranças coloniais, entre outros.

    A pós- modernidade não representa apenas uma linha de pensamento contemporâneo, mas uma condição de várias correntes de pensamento que se cruzam. O ser humano conquista a liberdade para tornar-se artífice de seu próprio destino, livre do peso das tradições e poderes arbitrários e garantido por uma série de direitos. Ele tem a liberdade de construir a própria vida. Contudo essa liberdade, se por um lado garante a possibilidade de construção de uma vida independente, também gera insegurança e desamparo (PERES, 2006, p. 24). A sociedade atual exige do ser humano perfeição, sucesso, carreira sólida, entretanto, nem sempre isso acontece.

    Porque estamos na chamada felicidade institucionalizada, em outros termos, o indivíduo precisa transparecer felicidade o tempo inteiro. A felicidade institucionalizada, digamos assim, é um contentamento tóxico, pois o sujeito não é sincero consigo próprio, ele precisa esconder a dor e mostrar uma vida perfeita. Ainda mais: quando a pessoa não alcança o status que os paradigmas sociais exigem, ela é excluída. Sendo excluída, a pessoa fica por entre os sentimentos de desamparo e inferioridade. O ser humano vive um momento em que a homogeneização, a padronização, a globalização e promessas ilusórias de condições igualitárias de vida conduzem a uma maneira de estar no mundo em que a singularidade de cada indivíduo encontra pouco espaço de sobrevivência (PERES, 2006, p. 57).

    Conclusão sobre a origem da depressão

    As configurações atuais, pós- modernidade, constituem uma precondição para o sentimento de desamparo. A conjuntura não é fixa, por conseguinte, fixar uma identidade é algo bastante complicado. A estabilidade é algo raro no cenário atual, ocasionando angústia no indivíduo. A contemporaneidade está carregada de contínuas performances, exigindo do sujeito agilidade diante das transformações. Em um mundo desterritorializado, sem fronteiras, liquido e individualista, o sujeito tem dificuldade de significar suas experiências devido ao esvaziamento de referências.

    A ideia do bem comum foi banida com o advento da demolição das referências estáticas. E com tal entendimento, seres humanos vão sendo constituídos com o peso da nulidade, assim dizendo, pessoas esvaziadas de sentido ou sem papel no sistema social. Não havendo tais alicerces, o homem colapsa com o vazio, ou seja, a depressão. A saúde mental na contemporaneidade é uma área de grande importância e cuidado. O cuidado pode ocorrer por inúmeras formas: alimentação, uma boa noite de sono, exercícios físicos, a busca pelo prazer, psicoterapia, psicanálise, e medicação adequada, caso seja necessário. Em suma, há vários meios utilizáveis para tratar à depressão, ela é uma realidade que precisa ser tratada com seriedade.

    A origem da depressão é uma realidade, realidade que merece cuidado. Com tantas transformações, o ser humano esquece de olhar para si, para dentro de si. Devido à velocidade que o ambiente social exige, a humanidade está adoecida, precisando de amor e cuidado. O homem não é uma máquina, mas é um organismo vivo e que necessita amparo. A depressão é um esvaziamento de sentido, no entanto, ela pode ser cuidada, ou seja, existe uma luz no fim do túnel. Sim, este artigo é um convite para uma profunda reflexão no que tange acerca da Contemporaneidade. Do quanto é importante cuidar de si, ter uma vida saudável e prazerosa. A sociedade reflete um humano triste e que clama por socorro por causa da origem da depressão. Enfim, já é tempo de ouvir esse clamor, clamor que é ouvido por meio do amor.

    REFERÊNCIAS

    BERRIOS, German E. Melancolia e depressão durante o século XIX: uma história conceitual. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/274870003_Melancolia_e_depressao_durante_o_seculo_XIX_uma_historia_conceitual. Acesso em 11 de agosto de 2021. MATOS, Elaine. Quem foi Sigmund Freud. Disponível em: https://www.psicanaliseclinica.com/quem-foi-sigmund-freud/. Acesso em 10 de agosto de 2021 MENDES, E. D.; VIANA, T E CLOPES E BARA, O. Melancolia e Depressão: Um Estudo Psicanalítico. Revista Psicologia: Teoria e Pesquisa. V. 30, n° 4, p. 423- 431, 2014. MONTEIRO, Lúcia. Depressão: ou você tem ou você pode ajudar quem tem. Disponível em: https://super.abril.com.br/depressao/. Acesso em 13 de agosto de 2021. Sem autor: Psicanálise como terapia: depressão? Disponível em: https://www.psicanaliseclinica.com/o-que-e-depressao/. Acesso em 14 de agosto de 2021. TOURINHO PERES, Urania. Depressão e Melancolia. Janeiro: Jorge Zahar, 2006. 63 p., il.

    O presente artigo foi escrito por Artur Charczuk. Formado em Letras, com ênfase em português e literatura (2010) pela Universidade Luterana do Brasil, ULBRA. Possui especialização em Línguas, Literaturas e Mídias (2011) pela Universidade Luterana do Brasil, ULBRA. Formado em Teologia (2015) pela Universidade Luterana do Brasil, ULBRA. Especializado em Ministério Pastoral (2017) pela mesma instituição. É psicanalista (2019) pelo Instituto Brasileiro de Psicanálise Clínica, IBPC. É especializado em Tópicos Avançados em Psicanálise (2020) pelo Instituto Brasileiro de Psicanálise Clínica, IBPC. Também é formado em Filosofia (2020) pelo Instituto Mineiro de Formação Continuada, ZAYN. Possui especialização em Aconselhamento Pastoral (2020) pelo Instituto Mineiro de Formação Continuada, ZAYN. Pós- graduado em Psicanálise (2021) pelo Instituto Mineiro de Formação Continuada, ZAYN. Também possui especialização em Psicanálise com ênfase em Psicologia Social (2021) pela mesma instituição. É psicanalista e pastor nas congregações Martinho Lutero e Cristo Redentor, São Leopoldo, RS. E-mail: [email protected].

    2 thoughts on “A Origem da Depressão: da Antiguidade à Contemporaneidade

    1. Mizael Carvalho disse:

      Parabéns pelo belíssimo trabalho! Realmente o ser humano precisa se cuidar e sair da caverna ou seja, do isolamento e voltar a se relacionar de novo com pessoas.

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