Édipo Rei

Édipo Rei: o mito, a tragédia e a interpretação de Freud

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Neste artigo vamos falar sobre o Édipo Rei. Vamos refletir sobre a origem deste personagem ou mito da tragédia grega, bem como a forma como Freud interpretou o Édipo Rei para a criação do famoso “complexo de Édipo”.

Desde que foi constituída por Freud no início do século XX, a psicanálise trouxe à cena médica e psicológica ferramentas de interpretação do comportamento humano que modificaram fortemente a maneira de perceber as atitudes das pessoas e da sociedade.

O Édipo Rei e as relações humana de família

Nascida da própria clínica, a ciência de Freud foi capaz de contemplar muitos aspetos que a área médica não considerava e o colocou como um grande pensador que teve a coragem de quebrar o “acordo tácito” da sociedade, isto é, trazer à tona temas considerados tabus, mas sempre presentes na vida cotidiana mesmo de forma velada. Entre os desejos e pulsões típicas da teoria freudiana, as relações parentais e as investidas incestuosas foram temas centrais de seus estudos que culminaram em uma perspectiva de que essa relação deixa impressões psíquicas permanentes e regem a vida do sujeito.

O famoso Complexo de Édipo é um desses pontos centrais da formação de uma pessoa que podem determinar comportamentos prejudiciais à vida quando essa fase é mal solucionada. Neste artigo, teremos por foco não somente a concepção do Complexo de Édipo, mas como Freud interpretou essa história e a cientificou para o mundo através da psicanálise.

O Rei de Tebas: a história de Édipo Rei de Sófocles A história de Édipo Rei, do autor grego Sófocles é uma tragédia escrita por volta do ano 427 a.C tendo destaque pelo enredo enérgico e polêmico por envolver a questão incestuosa. Em termos literários, uma tragédia se configura pela exaltação da figura do herói e dos personagens que o rodeiam para que, ao final, o protagonista se envolva em um acontecimento fúnebre que pode trazer à cena a piedade e o fatalismo.

Édipo Rei e o fatalismo

Entendemos por fatalismo o que popularmente conhecemos como destino, ou seja, fato que já está consumado pelo universo e acontecerá independentemente dos caminhos a serem tomados.

Neste sentido, a peça teatral de Sófocles se enreda nessa perspectiva em que o personagem que dá nome à obra já nasce destinado a uma tragédia familiar: matar o próprio pai sem saber de sua filiação e casar-se com a própria mãe tendo filhos com ela ao mesmo tempo que se torna rei de Tebas.

Na tragédia, a profecia como inescapável ao humano

A história de Édipo segue um curso tumultuado com diversas pessoas tentando alterar o seu destino, porém, mesmo assim, a profecia do futuro rei é cumprida e resulta na grande tragédia proposta pela peça. Ao saber que seu filho estaria amaldiçoado pela profecia, o rei de Tebas, Laio, pai de Édipo, pede ao pastor do lugar que abandone a criança pendurando-o em uma árvore para que possa ser devorado pelas feras do monte Citerão.

Para que não houvesse possibilidade de fuga, os pés do menino haviam sido perfurados. Ao levar a criança ao seu fatídico destino, o pastor encarregado da cruel tarefa não consegue cumprir a ordem do rei e leva o bebê a sua própria casa para cuidar e protegê-lo.

Entretanto, por ser de origem humilde e não ter condições de criar uma criança, o pastor o entrega Políbio, rei de Corinto que cria o menino como seu próprio filho e a ele dá-lhe o nome de Édipo por conta de seus pés inchados.

O reencontro do futuro Édipo Rei com o seu destino

Édipo cresce e se torna um homem vigorosos e corajoso se destacando no exército e no combate, mas se sente comovido quando descobre de Políbio que era um filho adotado. Determinado a descobrir quem são seus verdadeiros pais, Édipo segue em direção a Tebas e, no caminho, encontra em uma encruzilhada seu pai biológico e sem reconhecê-lo, mata-o em um acesso de raiva cumprindo a primeira parte da profecia.

Ao chegar em Tebas, Édipo resolve o enigma da esfinge nunca antes solucionado e, por sua inteligência e sagacidade, é coroado rei de da província e se casa com Jocasta, sua mãe biológica, e com ela tem quatro filhos.

A descoberta e a autopunição de Édipo Rei

Como rei, a província de Tebas prospera e ama seu novo rei, porém o destino de Édipo o alcança e ao consultar o oráculo compreende que não escapou de sua fatídica tragédia: “Oh! Ai de mim! Tudo está claro! Ó luz, que eu te veja pela derradeira vez!

Todos sabem: tudo me era interdito: ser filho de quem sou, casar-me com quem me casei e eu matei aquele a quem eu não poderia matar!” Ao descobrir os fatos de sua própria história, Édipo perfura os próprios olhos e deixa o reino Tebas para viver em isolamento sendo cuidado por suas filhas durante sua vida idosa.

Édipo Rei e a psicanálise de Freud

Durante muitos séculos as grandes obras foram lidas e cultuadas pela sociedade sem que seus leitores se dessem conta de que a sociedade grega tratava de temas que eram (e são) vividos por todo ser humano. A peça de Sófocles retrata na realidade uma situação da relação pai, mãe e filho vivenciados por todos e dramatizados em forma de um enredo teatral para que fosse mais acessível ao grande público.

Vale destacar que muitos podem ler a peça como uma tragédia exclusiva da vida de Édipo uma vez que os leitores, independentemente da época, não conseguiriam pensar nesses fatos como uma concepção da própria vida particular. Sendo um grande apreciador da cultura grega antiga, Freud percebeu no tom dessas histórias a angústia humana impressa em formas de palavras e dramaticidade para compor sua teoria: a história de Édipo é uma história vivida por todos nós, sem exceção, e dela seremos constituídos como pessoas frente ao imenso fatalismo.

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    Ao observar durante a prática clínica a realidade psíquica e os comportamentos de seus pacientes, Freud entende a importância da presença dos pais na vida da pessoa e, a partir disso, formula a teoria do Complexo de Édipo destacando a importância das figuras paterna e materna.

    A formação da psique humana a partir do Édipo

    Em muitas de suas publicações, Freud recorreu a essa teorização para explicar diversos casos como o caso Schreber, o caso Dora, além de muitos outros. Ele interpretou a história do Édipo rei como sendo constituinte de nossa formação e transformou a tragédia em teoria sempre afirmando que não havia descoberto nada de novo, mas que apenas trazia ao mundo, um sentimento angustiante que os gregos já conheciam muitos antes de nós.

    Na concepção da teoria do Complexo de Édipo, as pulsões vindas do Id manifestam desejo e fixação na mãe por esta ser seu primeiro contato com o mundo e nela o bebê direciona seu afeto e seu objeto de desejo.

    A chamada figura materna é responsável por prover à criança a constituição do eu e do mundo externo enquanto a figura paterna aguarda sua entrada na relação preparando o ambiente para a entrada dessa criança ao meio externo.

    A dissolução do complexo de Édipo

    Vale destacar nesse ponto que o resultado esperado da dissolução (ou encerramento) do Complexo de Édipo ocorra na entrada do período de latência com a formação do superego em que a criança renuncia aos desejos incestuosos com mãe e perceba no pai a figura da autoridade direcionado seus desejos e seus enlaces afetivos a outros objetos do mundo.

    Para que esse complexo seja bem solucionado, ambas as figuras precisam ser efetivas e tomar seus papéis durante o desenvolvimento do filho já que se uma das figuras não estiver à altura de suas funções, isso poderá ocasionar uma passagem mais perturbada por essa fase e prejudicar a vida adulta. No entanto, vale destacar que quando consideramos a vida de uma pessoa sob a ótica da psicanálise, nenhuma história é previsível e encerrada de tal modo que não plausível que entreguemos à questão das figuras paterna e materna toda a responsabilidade do comportamento do sujeito que está participando da sociedade de um modo ou de outro.

    Existem diversas variáveis que devem ser consideradas no processo clínico que podem revelar aspectos da vida pessoal que colaboram para uma hipótese diagnóstica. Durante os últimos anos do século XX e entrada do século XXI, as teorias freudianas foram deixadas de lado em nome das novas tendências da psicologia e da psiquiatria com abordagens que destacavam menos os papéis dos pais na formação de seus filhos.

    Conclusão

    Porém, o que queremos trazer como reflexão neste artigo é que apesar de toda a mudança histórica e social ocorrida ao longo do tempo, não deixamos de ter a mesma constituição como seres humanos e da dependência de nossos pais na nossa formação.

    Por isso, uma retomada de teóricos clássicos como Freud bem como a formação de novos psicanalistas nessa vertente pode ajudar a enfrentar problemas graves da atual sociedade como diversos desejos irrefreáveis que vem perturbando a convivência das pessoas.

    Na fala de Freud: “Nada no mundo é mais importante que a figura protetora de um pai.” É importante termos a consciência que a história de Édipo também nos ocorreu e dela herdamos um fatalismo intenso que necessita da consciência para que não fiquemos a vagar pelo mundo cegos, deficientes e presos à nossa própria tragédia particular.

    Este artigo sobre Édipo Rei, a tragédia de Sófocles e a interpretação de Freud foi escrito por Renan Gaudencio Vale(renangaudencio@gmail.com), Professor, campineiro, linguista, mestre em semântica e futuro psicanalista, sempre tive intenso interesse pelo funcionamento da mente humana. Acredito que a linguagem é parte constitutiva do sujeito e a psicanálise a forma mais íntegra para a compreensão de nós mesmos.

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