Escola produtora de traumas: criando crianças neuróticas

Hoje falaremos sobre a escola produtora de traumas. A criança tem seu espaço escolar como o primeiro contato com o meio social e isso causa certa insegurança a princípio. Conhecer novos amigos e professores, e ser aceito no grupo faz parte de suas preocupações logo cedo, já na educação infantil.

Sobre o espaço escolar e a escola produtora de traumas

Quando chegam ao ensino fundamental, surge uma mescla de sentimentos: ânimo por se sentirem quase adultos (pelo menos é o que pensam), insegurança por não saberem se terão amigos, medo relacionado aos professores (pois sempre tem aquele que é mais bravo) e aos novos desafios no que tange a aprendizagem e seus conteúdos.

Com todas essas questões a serem superadas a frase “você deve enfrentar seus medos” cai como uma avalanche. A exposição é a pior situação que um aluno introvertido pode ser submetido.

As avaliações de proficiência da leitura, os debates, as apresentações orais e até as chamadas orais, são grandes inimigas desses alunos. E qual é a saída? Enfrentar, é claro! Será mesmo?

A escola produtora de traumas, crianças e adolescentes

Será que expor uma criança ou adolescente, que tem dificuldade de falar em público, vai ajudá-lo a superar, ou vai criar um trauma, que poderá futuramente culminar em transtorno de ansiedade?

Será que criar espaços e situações competitivas onde sempre tem um ganhador e um perdedor irá fortalecer o ego desses alunos? Ou trará mais insegurança, criando rótulos para aqueles com maior dificuldade, com um olhar fatalista em seu futuro?

Entendendo nossa responsabilidade enquanto pais e professores

Esses questionamentos nos levam a refletir o quanto nós adultos (pais, professores e outras pessoas do convívio da criança) temos o poder de criar crianças neuróticas (no sentido patológico), sem ter a mínima ideia dessa possibilidade. Quando um professor obriga o aluno a falar em público, sem procurar em saber se o mesmo está preparado, ele está abrindo espaço para que um trauma se instale.

Lembrando que esse preparo pode estar relacionado ao tempo de maturidade e conquista de segurança de forma natural ou com auxílio de terapia.

Tive uma experiência de observar uma brincadeira, de alunos de 5° ano, de perguntas e respostas, como o famoso jogo “passa ou repassa” e percebi que alguns alunos estavam tensos, em vez de curtir a proposta e auxiliar os colegas durante as respostas. Isso se devia ao fato de a professora sortear os alunos que deveriam ir a frente da sala para responder em vez que criar um ambiente de alegria, entretenimento e participação espontânea.

Questões emocionais

Posso dizer, com toda a certeza, e com o tempo de experiência que tenho, que essa professora não conhecia seus alunos, desconsiderando qualquer observação acerca das questões emocionais (ou socioemocionais) apresentadas por eles.

Não se preocupou em criar um ambiente acolhedor, onde todos pudessem interagir e participar de acordo com suas habilidades, criando espaço para cada um exercer seu papel, seja sendo o representante do grupo, ficando a frente, seja dando suporte com possíveis respostas ou até torcendo e motivando a equipe.

Esse é o papel do professor, criar condições saudáveis de crescimento e aprendizagem.

Conclusão sobre a escola produtora de traumas

Não é incorreto ter de enfrentar os medos para superá-los; mas isso ocorrerá quando a pessoa estiver pronta. Ninguém é obrigado a passar por situações que lhe agridam emocionalmente. Ninguém deve ser exposto, também, a situações desagradáveis com a proposta de superação.

A criança, desde pequena, deve se sentir segura e acolhida nos ambientes que frequenta e entender que pode escolher participar ou não de brincadeiras ou atividades, sem deixar de interagir, aprendendo e trocando com seus colegas e com os adultos que tem contato, dentro de suas condições e possibilidades.

Criando um ambiente acolhedor que respeite a necessidade, especificidade e tempo de cada um o professor possibilitará um desenvolvimento psíquico saudável de seus alunos. É preciso que as crianças e adolescentes tenham liberdade de escolha, de decisão e de ação. Precisamos ficar atentos aos sinais que nos apresentam e mais do que isso, precisamos fazer do espaço escolar um ambiente rico em boas relações, respeito e trocas positivas, promovendo um desenvolvimento psíquico saudável dos alunos e não criando pessoas neuróticas, com questões emocionais que poderão levar a consequências devastadoras no futuro.

Artigo escrito por CRISTIANE CARMINTI MARICATO. Sou Pedagoga, Psicopedagoga, Neuropsicopedagoga, Psicomotricista e Especialista em Educação Especial. Tenho mestrado em Intervenção Psicológica no desenvolvimento e na educação e estou cursando o Doutorado em Psicanálise, além de estar concluindo o curso de Psicanálise Clínica pelo Instituto. Estou há mais de 8 anos na Coordenação de um Centro Municipal de Habilitação e Reabilitação, atrelado a Educação, que atende crianças com deficiência múltipla e quadro grave de saúde, além de alguns casos com questões psiquiátricas. Siga-me no instagram @criscmaricato