estoque de tempo

Estoque de tempo humano: uma reflexão da Psicanálise

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Entre os temas emergentes, que a Psicanálise esta sendo desafiada a lidar, um deles se refere ao estoque de tempo humano. As pessoas a partir de meados de 1999, quando aguardavam ansiosas e angustiadas a ‘virada’ para o ano 2000, começaram a se preocupar com o estoque de tempo.

E o tempo, considerado como um ativo intangível invisível virou uma preocupação psicológica e epistemológica. Muitas pessoas passaram a se autoquestionar: qual será meu prazo de validade ? Quantos tempos ainda têm?

Para muitos jovens de todas as classes sociais passou a ser uma obsessão matematizar seu estoque de tempo. E a pandemia do corona-vírus 19 com um saldo grande de óbitos agravou mais ainda a questão.

Estoque de tempo humano

Pessoas começaram a colocar na ordem dos seus dias, que precisam mais do que nunca viver o ‘aqui-e-agora comigo-e-contigo. O ‘já-provisório’ se transformou num vetor de muitas considerações. A pressa passou a ser motivo até de acirramentos de conflitos mesmo que seja considerada inimiga da perfeição. A meta passou a ser não perder mais tempo e se tiver que perder que seja o mínimo dos mínimos possível.

Algumas pessoas adotaram uma visão polivalente, tentar fazer tudo ao mesmo tempo para não perder justamente tempo. Frequentemente, pessoas são questionadas: “Afinal, querem mais taxa de atenção ou tempo ?! A resposta nunca tarda sendo praticamente unânime: ‘queremos tempo’. O tempo a que se referem é o tempo vivo, do ritmo da vida, o tempo da natureza das pessoas, considerado como um tempo qualitativo e quantitativo.

Mas, também, um tempo psicológico, de como se relacionam com o que estão vivenciando na prática concreta da realidade do dia-a-dia. Um tempo chamado de ‘tempo-eu-e-meu’, que é um tempo livre e especial da pessoa. Não raro ouvimos seguidamente alguém expressar, ‘estão ‘roubando’ ou ‘furtando’ o meu tempo’.

Estoque de tempo cronológico

O tempo a que referem é um tempo de parâmetro cronológico que esta sendo drenado, seja numa espera de fila, seja numa expectativa de uma solução. Não é um tempo meramente histórico e já pregresso, mas um tempo presente, fluindo, um tempo subjetivo da pessoa que sente os dias e as noites se dissipando. Um tempo que é monitorado pelo relógio moderno (de pulso) e pós moderno (na tela do celular), um tempo líquido que vai se vaporizando e gerando suas marcas indeléveis.

Não é um tempo que mensura apenas eventos e fatos sociais, nem um tempo envolvido em produção e descanso. Um tempo que as crianças servem de parâmetro, pois comum a expressão: ”querem ver o tempo fluir e passar de verdade, coloquem uma criança dentro de suas casas!”. As pessoas pós modernas não estão interessadas em fazer um relógio de sol no seu pátio e nem se ligam no relógio atômico sideral ou numa ampulheta do século VIII, de areia. Elas estão interessadas no tempo subjetivo cronológico e psicológico que repercutem no seu biológico.

Muitas pessoas falam que além de sentirem que estão ‘roubando’ seu precioso tempo esta ficando de cabelos brancos. O tempo acaba assumindo muitas dimensões, uma delas, a questão do tempo usado como instrumento de opressão. Muitas decisões postergadas com a visão de projeção do tempo. ‘Deixem tempo passar que até talvez poderemos nem ter que arcar com certas obrigações’, expressam alguns. É o tempo usado como arma psicológica.

Ainda sobre o estoque de tempo

Pessoas de má-fé usam de caso pensado o tempo para tentar derrogar e decair situações dos outros. E existem situações de que somente o tempo cura como dizem outras pessoas no jargão social, o que para muitos é um mero pré-juízo (uma concepção) de valor meramente subjetivo. Será que realmente o tempo cura tudo ?! O tempo usado como remédio! O sol tem sido usado como antibiótico mas o tempo como remédio ?, questionam muitos.

Porém, o tempo que as pessoas usam é o tempo hoje, o tempo primeiro e cedo, ou ainda, numa conotação de tempo agora, do já-provisório, do não poder mais esperar, do imediato e sucessivo. O ainda-não não esta mais nos horizontes porque implica um exercício angustiante de longa espera. Muitas pessoas ansiosas, angustiadas, exasperadas e aflitas começam a ‘matematizar’ o tempo.

Ora o dia tem 24 horas, dizem; uma semana tem 168 horas; um mês tem 720 horas. Metade dessas horas estão subsumidas no meu sono, estão sendo queimadas ‘dormindo’ e que poderemos então fazer com 12 horas por dia, com 84 horas por semana e apenas 360 horas por mês ? pré-questionam! Entram em desespero. Alguns tentam trocar o dia pela noite se transformando em notívagos, pessoas da noite, para tentarem usar as horas, com ego egoísta que sacrifica o próprio descanso.

A consciência e inconsciência das pessoas.

Por incrível que possa até parecer em cidades grandes pessoas obsessivas com o tempo usam cronômetro como marcador calculando quanto tempo levam para tomar um banho, usar um transporte coletivo, caminhar até trabalho, colocar um veículo na garagem. E para passar o tempo no trabalho caminham devagar, fazem tudo lento e tão logo acaba o tempo-trabalho disparam em si um marcador desesperado, um ponteiro segundero imaginário que não para e mentalizaram que mesmo repousando, o tempo não para. Cada segundo passa ser um tormento.

O tempo tornou-se uma espécie de energia que vai se esvaindo. Embora alguns digam, ‘o tempo é uma ilusão’ na realidade estamos envelhecendo. A natureza não nos engana, mas cobra seu preço. Existe em todas as pessoas um cronômetro psicoativo e somático, biopsicossocial inescapável. O olhar-se no espelho é um dos indicadores. A fotografia e o vídeo passaram a ser parte do arcabouço da angústia. Muitos nem gostam de fotografias. E o tempo-clima sazonal (meteorológico) cíclico também, estão presentes na consciência e inconsciência das pessoas.

Em razão dessas percepções é que se fala já na pós-modernidade em estoque de tempo. As pessoas tem um estoque de tempo. Algumas dizem: ‘não aceito pensar assim’, e negam que tenham um estoque de tempo e um prazo de validade e de que estão reféns de ciclos vitais mas, recordam como foram abandonando seus corpos passados. O corpo-criança cede para o corpo adolescente; este para o corpo adulto e este ao corpo envelhecido. As pessoas vão perdendo seus corpos.

Estoque de tempo, lembranças e saudades

O calendário só ajuda a lembrar de que o tempo esta passando, dia-a-dia, semana-a-semana, mês-a-mês e ano-a-ano, décadas que alguns referem como perdidas ou ganhadas. O tempo vai passando e só restam as lembranças e saudades. Até o momento que a pessoa vai se despedir do planeta, deixará de existir. E este é o conteúdo da Psicanálise por excelência.

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    Quando diziam que a Psicanálise estava em crise e ia desaparecer não se davam conta da tamanha impostura porque a Psicanálise esta intimamente ligada num elo fortíssimo com o tempo e com as emoções e sentimentos num liame com seu objeto, o inconsciente. A morte é um conteúdo psicanalítico de grande expressão. Quando Caim matou Abel, no mundo pré-diluviano por inveja e ciúme e desobediência isso de per si, expressa uma carga psicanalítica imensa.

    É essencialmente psicanalítico e faz parte da memória dos tempos passados. Tempo entendido como um ativo intangível e invisível passou a ser algo desafiador na pós-modernidade para a Psicanálise que terá que entender e compreender melhor essa categoria. Por fim, para concluir, o poema O Tempo, do poeta Mario Quintana (1906-1994): “A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa. Quando se vê, já são seis horas! Quando de vê, já é sexta-feira!

    Conclusão

    Quando se vê, já é natal… Quando se vê, já terminou o ano… Quando se vê perdemos o amor da nossa vida. Quando se vê passaram 50 anos! Agora é tarde demais para ser reprovado… Se me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio.

    Seguiria sempre em frente e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas… Seguraria o amor que está a minha frente e diria que eu o amo… E tem mais: não deixe de fazer algo de que gosta devido à falta de tempo.

    Não deixe de ter pessoas ao seu lado por puro medo de ser feliz. A única falta que terá será a desse tempo que, infelizmente, nunca mais voltará.”

    O presente artigo foi escrito por Edson Fernando Lima de Oliveira ([email protected]) é licenciado em Filosofia e História. Possui PG em Ciências Políticas, realizando PG em Psicanálise e acadêmico e pesquisador de Psicanálise Clinica e Filosofia Clinica.

     

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