fato psicanalítico

Ato e fato psicanalítico: o que são?

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Alguns anos atrás, vários eventos foram deflagrados no mundo todo, onde foram travados debates e discussões sobre o conceito de ato e fato psicanalítico embora um pouco focado e centrado em Jacques-Marie Émile Lacan (1901-1981) com base no seu seminário nº 15, sob título “O ato psicanalítico, (Lacan, 1967-1968)”, onde refletiram vários analistas buscando firmar o um conceito mais generalizado e universalizado de ato psicanalítico em que pese, não tinha ainda sido formulado didaticamente, por estar numa chamada ‘disjunção’ com o saber psicológico.

Entendendo o ato fato psicanalítico

E com relação ao conceito de fato psicanalítico já havia uma pré concepção de que era o mesmo objeto da Psicanálise, ou seja, o inconsciente. Paralelo também, havia uma reflexão sobre outros conceitos correlatos como o de método psicanalítico, de como colocar em marcha ou movimento para que uma análise pudesse ser levada adiante, pois, tinha o lado do chamado paciente ou analisando face a experiência da escuta especializada e da fala, diferentemente da cotidiana e de senso comum.

Trouxeram à tona o conceito de fato clínico, com base e o apoio na Medicina, o que para Psicanálise passaria a ser um fenômeno emprestado do olhar médico no paciente, buscando a relação causa-efeito e o lugar do sintoma, dentro da realidade e sua observação. Discutiam o que era o possível diagnóstico psicanalítico e de como poderia em teoria ser possível delimitar os conceitos e construir e situar ele, pois desejavam firmar e consolidar o diagnóstico psicanalítico diferencial do psicológico e do psiquiátrico e até do diagnóstico clínico geral.

As reflexões tentavam traçar um certo padrão, levando o analista como o operador da Psicanálise a saber interrogar o estatuto do inconsciente em relação à realidade concreta dos fatos psíquicos e que a Psicanálise deveria pelo menos, ‘em tese e a priori’, estabelecer diretrizes e marcos de uma relação do sujeito com o mundo mediada pela realidade psíquica.

Fato psicanalítico e o analisando

Discutiam também o conceito paciente, analisando, analisado, analista, o que seria ser um partilhante e a relação de confiança. E buscavam superar algumas incertezas conceituais como já supra referido com relação ao que mais preocupava, que seria o diagnóstico psicanalítico frente ao fato e ato psicanalíticos porque envolvia a observação da trajetória existencial da pessoa (analisando), sua historicidade pregressa, cultura, patologias, que muitas vezes era estereotipada e distorcida ou até sofismada pelo paciente e suas implicações frente a relação transferencial e a anamnese e nosografia, semiologia, sinais e sintomas tudo a partir da estrutura dinâmica e dos conflitos do analisando.

Paralelo ainda, buscavam em muitas reflexões o objeto da Psicanálise, já entendido como o inconsciente ser o fato psicanalítico. Isto precisa ser consolidado e aceito de forma universal e incorporado pela doutrina sistematizada.

Muitos analistas perceberam que precisavam entender o que seria o fato psicanalítico e se ele seria o real objeto primordial da Psicanálise, até porque na época definiam outras ciências e técnicas os seus objeto como por exemplo, a Sociologia propugnava que seu objeto era o fato social; a Psiquiatria postulava que o seu objeto era o fato psíquico; a Psicologia, que estava em conflito inicial com a Psiquiatria defendia o fato psicológico e os mecanismo de defesa como seu objeto.

O fato histórico

A História busca o fato histórico como seu objeto. Cada ciência, arte e técnica começava a buscar do seu objeto como ‘fato’, pois queriam delimitar suas atribuições. Muitas recorreram e foram buscar no meio jurídico o socorro até de leis. E era natural a indagação por uma questão de interfaces que começavam a florescer e foram se expandindo para outros campos do saber.

A Psicanálise também não se intimidou e passou a buscar e tentar universalizar e consolidar o que seria afinal fato e o ato psicanalítico no sua esfera de atribuições. E enfrentou acusações até de charlatanismo. Porque havia uma reflexão de que vencida essa etapa existiria no futuro um entendimento construído e muito melhor para puxar a reboque os demais conceitos.

A visão e a percepção, dos operadores da psicanálise de forma global, era de que de nada adiantaria consolidar, generalizar e universalizar conceitos isolados sem estabelecer os marcos e delimitações do que seria o fato psicanalítico e o atos psicanalíticos bem como o diagnóstico psicanalítico.

O inconsciente e o fato psicanalítico

Conceito como o inconsciente, trauma, castração, o fixação na fase psicossexual, o fálico e o genital, o complexo de Édipo entre outros ficariam como ponta soltas se não fosse bem delimitado o objeto da Psicanálise e se não fosse bem esclarecido o que seria realmente fato e o ato psicanalítico. Esta foi uma das grandes preocupações os analistas operadores da Psicanálise.

Era preciso ficar bem claro estes conceitos. E vale salientar que Lacan em meados de 1967 até 1968, como já supra citado, tinha preocupação de refletir sobre o tema em seus seminários. Alguns analistas passaram a apoiar a visão de que o objeto da Psicanálise é o fato psicanalítico que é em última análise o inconsciente. Isto ficou bem sacramentado.

Tudo na Psicanálise gira em torno do inconsciente diziam os analistas, bem diferente do fato psiquiátrico e psicológico, que possuem outros objetos. O fato psicológico seria o objeto primordial da Psicologia e ligado ao comportamental; e o fato psiquiátrico com a bioquímica cerebral seria da esfera da Psiquiatria e tinha que ter interface forte com a psicofarmacologia.

O fato psicológico

Faltava, portanto, delimitar o que seria o ‘ato psicanalítico’, pois enquanto o fato é o que advém do foco central da técnica ou método, que seria o inconsciente, o ato psicanalítico dependeria da volição e das escolhas da pessoa em se tratando de Psicanálise. O fato psicanalítico independe da pessoa, pois, é o inconsciente com sua linguagem e simbologias próprias que pode em teoria falar pelos sonhos, atos falhos, chistes, lapsos, enfim e tem seu ‘lócus’ no cérebro de cada pessoa.

Já o ato psicanalítico pode ser no sentido mais ‘stricto senso’ , como nascimento, a morte (óbito), o implemento de idades cronológicas,(aniversários), a doença, velhice; e no sentido mais ‘lato senso’ são os atos humanos em geral, as emoções, sentimentos, e suas expressões com o beijo, o sexo, o amor, a paixão, o sorriso contextualizado, uma fala, choro, gritos, brigas e rixas, contendas, lesão corporal enfim.

Devemos sempre que possível não confundir o fato psicanalítico, pois ‘fato’ vem de ‘factum’,( latim), e significa aquilo que é fixado e independe da pessoa, como a inconsciência em cada cérebro.

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    O inconsciente é um fato psicanalítico

    O cérebro sede da mente onde ocorre o pensamento, com as bioquímicas das sinapses celulares, onde reside o inconsciente, o id, ego, superego, é um fato psiquiátrico que contem o fato psicanalítico mas também o fato psicológico. Existe uma complexidade misturada. O comportamento humano e suas defesas são um fato psicológico.

    O ato é a capacidade para agir, para realizar alguma coisa ou a ação. Para um ser vivo, o movimento adaptado a um fim como, por exemplo, o ato instintivo que vem do ‘id’, do inconsciente, ou ato voluntário do ego, ou uma manifestação da vontade humana como o ato de bondade, de caridade estão vinculados a expressão do ato psicanalítico. O ato psicanalítico é o que impulsiona os homens e mulheres dia a dia em suas jornadas existenciais.

    Pinçando exemplos pragmáticos ou uma ‘práxis’, (teoria na prática) nas origens conforme relato bíblico, em Gênesis, no mundo pré-diluviano, Caim atraiu Abel para um lugar ermo e com uma vara o agrediu até desfalecer e cair e após, usando uma pedra esmagou seu crânio, onde viu seus miolos escorrerem, que é o cérebro, matando o irmão, o que motivou a irmã que viu o ato e foi correndo chorando contar ao pai e a mãe, (Adão e Eva) que Caim praticou um crime, ou seja, em última análise, seria um ato psicanalítico desatinado. A irmã correndo e chorando desesperada estava também em ato psicanalítico.

    Suicídio e o fato psicanalítico

    Depois, Deus (Yawed) vai até Caim e pergunta em sua mente, ‘Caim, onde está teu irmão ?’ Ele responde – ‘Não sei. Acaso sou eu o guarda dele ? Não sei.’ Mas, o inconsciente (o fato psicanalítico) era uma voz interna que lhe dizia, ‘você matou seu irmão’. Finalmente, ele tomado de remorso confessou à Deus, dizendo, ‘eu matei ele, Senhor’.

    O assassinato foi um ato psicanalítico, em que pese Deus seja onisciente, onipresente e onipotente, mas desejava vencer a ‘negação’ de Caim que tentou aplicar um mecanismo de defesa. Vale destacar que todo o homicídio bem como suicídio são atos psicanalíticos. O suicídio visa tentar destruir o fato psicanalítico (inconsciente) junto com os atos psicanalíticos, tem o foco de levar a reboque.

    O ato significa o momento em que se faz alguma coisa. O ato psicanalítico se reveste de várias configurações emocionais e sentimentais: ciúme, inveja, orgulho, soberba, arrogância, são exemplos típicos de atos psicanalíticos ‘lato senso’; os atos psicanalíticos ‘stricto senso’ são a doença, a morte, a crise, o nascimento, a velhice, a juventude enfim.

    A materialização do fato

    Com relação ao tempo cronológico ou estoque de tempo ele não é objeto ou fato psicanalítico. É um dado de métrica de realidade. A engenharia criou instrumentos para sua parametrização como o relógio, assim com para outros dados de realidade, como sensores, calendários para os dias, termômetros, barômetros, altímetros, bússolas, pluviômetros, velocímetros, tomógrafo, raios ‘X’, entre tantos outros.

    Exemplificando, um exame médico em ressonância ou tomografia apontando um câncer é um dado métrico de realidade. Mas, o câncer em si, a doença oncológica um ato psicanalítico. Não podemos confundir ferramentas ou instrumentos de parametrização cronobiológicos temporais que vão matematizar a jornada existencial com ato psicanalítico.

    Firmado os dois conceitos de fato e ato psicanalíticos tudo ficou bem mais claro. Ficou bem mais fácil fixar um diagnóstico psicanalítico e foram superados os conflitos com os conceitos diferenciais do campo e domínio da Psicologia e da Psiquiatria e demais vertentes.

    Considerações finais

    Portanto, rememorando literatura quando Caim assassinou Abel praticou um ato psicanalítico e foi confrontado pelo consciente (ego) e seu inconsciente, este o fato psicanalítico. O diagnóstico psicanalítico apontou que foi por ciúmes e inveja, duas emoções psicanalíticas sérias que nos afeta até dias atuais que levou Caim ao desatino.

    Por derradeiro concluímos que em tese nossas vidas são permeadas de atos psicanalíticos em concurso com o fato psicanalítico (inconsciente e suas simbologia e linguagem própria) mediado pelo superego.

    Firmar o fato e o ato psicanalítico foi um dos grandes desafios para os pesquisadores consagrados da Psicanálise

    O presente artigo foi escrito por Edson Fernando Lima de Oliveira ([email protected]) é licenciado em Filosofia e História. Possui PG em Ciências Políticas, realizando PG em Psicanálise e acadêmico e pesquisador de Psicanálise Clinica e Filosofia Clinica.

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