Georges Canguilhem

Georges Canguilhem: sobre o normal e o patológico

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Conheça Georges Canguilhem. As considerações sobre o que pode ser tido como normal e como patológico são motivos de discussões continuadas em se tratando da clínica psicanalítica. É algo que imprime elaboração de critérios, redefinições conceituais, revisão de perspectivas.

A temática do livro de Georges Canguilhem

Em se tratando do âmbito das psicopatologias, um terreno aberto ao embate de ideias muito em função do impacto social do problema, essa questão apresenta-se ainda mais significativa devido ao seu caráter transversal.

O livro O normal e o patológico, de Georges Canguilhem, foi publicado em 1943, e o seu objetivo imediato foi o trabalhar com as diferentes versões, com os diferentes discursos, acerca do que viria a ser o saudável e a doença, bem como quais seriam as políticas terapêuticas demandadas por esse cenário.

O discurso verdadeiro de Georges Canguilhem

O livro é o resultado da sua tese de doutoramento em medicina. A ideia geral é a desnaturalização dos conceitos, tomados como naturais e como instrumentos de verdade, de normal e de patológico.

O seu olhar é, mesmo tendo se formado como médico, do epistemólogo, do analista do discurso, do filósofo da medicina.

O seu problema é o da prática terapêutica da instauração e da restauração do patológico, bem como dos discursos científicos produzidos a partir do par normal/patológico, pois eles implicam o estabelecimento de verdade e, consequentemente, uma disposição de saber-poder.

O problema de Georges Canguilhem

É um livro que critica a fácil dualidade normal x patológico, onde o primeiro polo se situaria numa posição de superioridade ante o segundo. O patológico, na visão de Canguilhem, não seria tão somente o avesso, ou uma variação, do normal.

A vida é marcada pela multiplicidade, por durações variadas e por contextos diversos, ou seja, o estabelecimento de normas rígidas para a delimitação dos padecimentos levaria apenas a consecução de modelos artificiais sem pregnância com a realidade.

O normal, a normalidade em geral, se transformaria numa idealização sem ancoragem com o mundo, ainda mais quando se passa a compreender os sujeitos em sua integralidade. A sacada do epistemólogo francês encontra-se na problematização da doença como uma realidade totalmente objetiva ante o discurso médico e alheia ao processo de vida das pessoas.

As normas, o normal e a normalidade

De acordo com o autor, existiria no discurso médico um reducionismo de marca positivista, que se vincularia à visão organicista para combater o vitalismo. Somado a isso teríamos os modos de intervenção terapêutica ante o patológico que se orientaria por uma perspectiva intervencionista sobre o patológico, que teria o intuito de restaurar as funções dos organismo diante daquilo que é tomado como culturalmente aceito.

A patologia teria a função de oferecer condições de possibilidade para o estabelecimento dos planos de normalidade, ou seja, para o socialmente tido enquanto verdadeiro. Cientificidade e construção social da realidade dialogariam abertamente no que tange à elaboração das normas, do normal e da normalidade.

A saúde como elogio à vida

O estado patológico não seria, nesse sentido, o oposto imediato da norma, porque sendo assim haveria a sua total interdição, o veto a sua discursividade, um movimento de exclusão social. Em última medida, o estado patológico também possui as suas normas, a sua racionalidade, sendo uma forma específica de se viver.

Isso nos parece importante, pois proporciona um novo olhar sobre a saúde, sendo mais do que sinônimo de normalidade, mas um dispositivo que aquele que passa por alguma forma de padecimento pode se utilizar para viver de forma adaptativa, respeitando as suas especificidades e dialogando com a realidade que o enreda.

A ideia da saúde como um sentimento de segurança na vida se mostra fundamental para compreender as ideias de Canguilhem, pois assim ela ao invés de cercear, de vetar o patológico, passa a não lhe impor nenhum limite.

O normal e o patológico percebidos por um olhar perspectivista

Canguilhem se vale, movendo a sua formação junto à epistemologia, do perspectivismo para compreender o normal e o patológico. Em um primeiro momento, o leitor percebe o par normal/patológico não estando limitado à esfera fisiológica. O que é normal para uma sociedade pode ser patológico para outra.

Isso é bastante importante porque o patológico passa a ser compreendido a partir da perspectivação, não trazendo uma essência anterior, uma existência em si, sendo assimilado sempre por meio dos agenciamentos, das relações e das combinações.

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    Atualidade de Georges Canguilhem

    Uma das grandes contribuições de Canguilhem, e que faz o seu pensamento ainda ser atual, é a de não tomar a norma por meio de uma abordagem quantitativa e estatística, porque assim, voltando-se para o individual, se torna possível reconhecer e valorizar as potencialidades das pessoas.

    É um elogio da individualidade, do sujeito, da pessoa. O problema das abordagens quantitativas é que elas não abrem margem para os desvios, para as individualidades, estas sim passíveis de serem assistidas.

    Referências:

    Canguilhem, Georges. O normal e o patológico. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002.

    Este artigo foi escrito por Piero Detoni([email protected]), Professor de História. Graduado e mestre em História pela UFOP. Doutor em História Social pela USP. Realiza pesquisa de pós-doutoramento na UNICAMP.

    2 thoughts on “Georges Canguilhem: sobre o normal e o patológico

    1. Isabelle de Fatima disse:

      Excelente artigo! Extremamente importante para a atual era da mercadorização da saúde mental e da tecnização da psicologia.
      Obrigada pelo texto!
      Abraço

    2. Maria Auxiliadora Carvalho Roma disse:

      Maravilhoso esse texto!! Profundo !! Nós traz um conhecimento importante da psicanálise!! Parabéns ao autor!!

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