Vamos entender neste artigo sobre a literatura e psicanálise. Começo este artigo com a certeza de que o campo clínico da Psicanálise apenas é o que é devido aos princípios expositivos da Literatura.
A Literatura enquanto técnica escrita está a muito mais tempo disseminando os seus efeitos e frutos que a própria Psicanálise. Freud (1856-1939) deixou bem claro em seus estudos e textos, o quanto ele aprendeu profundamente através da Literatura.
Freud, literatura e psicanálise
Ele disse que a maneira mais econômica e simples de se viajar pelo tempo é o indivíduo realmente conhecer as interpretações muito distintas da vida através da usabilidade literária. Facilmente percebemos o quanto a Literatura possui o efeito e poder que dificilmente encontraremos na Psicanálise.
Isso é dito tangenciando o interesse em pensar nas correlações existentes entre a própria Literatura e as mais diversas áreas de conhecimento, como a interface feita com as ciências sociais, economia, filosofia, política e religião. As contribuições e pressupostos que podem ser gerados através da unificação de duas áreas podem propiciar incríveis descobertas no âmbito acadêmico e, posteriormente, gerar valor à sociedade de forma generalizada.
A Literatura é o âmago da cultura humana e é exatamente isso que sempre interessou ao Freud. Lacan (1901-1981), outro psicanalista muito conhecido pelos seus pressupostos quanto a linguagem e o inconsciente, também tinha uma admiração enorme pela Literatura.
A influência
Evidente que muita influência se deu pelo seu próprio mentor, Freud, já que este a compreendia como o espelho da alma humana e afirmava que o trabalho de um bom escritor é conseguir ultrapassar a mesmice e as medidas convencionais, além de mostrar algo que consiga reverberar no coração de todo leitor. A melhor palavra que podemos utilizar pelo discurso psicanalítico é a sublimação.
Isso é uma abertura ao entendimento de como a Psicanálise entende a Literatura e de como o seu poder é um conteúdo mais acessível, interessante, rica e simples. Esse é um mecanismo extremante rico e que pode nos ajudar compreender o poder que a Literatura possui.
O que é sublimação?
Freud defende que somos seres movidos pela pulsão e que essa pulsão se organiza por meio daquilo que conhecemos como Complexo de Édipo (que é uma obra literária) e que Freud traz como metáfora para explicar esses acontecimentos pulsantes. Não se pode entender em seu sentido mais semântico, ou seja, literal, nem mesmo a própria história de Édipo deve ser entendida assim, mas sempre em um contexto literário ou psicanalítico. Isso porque a pulsão é aquilo que pulsa em nós, seres humanos.
É aquilo que nos faz andar ou mover. É aquilo que nos organiza e direciona. Vamos entender como aquilo que pulsa em nosso ser e que permite com que a tensão suba ou desça. Isso é a pulsão. Toda essa ideia se concentra na figura de Édipo e naquilo que normalmente conhecemos como libido. Apenas a título de conhecimento e para que não ocorra confusão no entendimento, a libido tem um teor sexual por um motivo.
A tensão que o órgão sexual produzirá é uma tensão muito forte, e o prazer está relacionado com o aumento dessa tensão e consequentemente com a queda desta. O sexo, por sua vez, produz muita tensão e a queda dessa tensão libera prazer. Ela se torna a normativa da vida humana. Toda pulsão se endereça a alguma coisa. Pode ser para a vida real, para um objeto. É endereçada com o intuito de se organizar. A ideia aqui é que há dois grandes processos existentes em nós.
O princípio do prazer, literatura e psicanálise
Vamos conhecê-los a seguir: Primeiro, o princípio do prazer. O intuito é gerar o encontro da paz, diminuir a tensão e retorná-la para mover este círculo com o intuito de metamorfosear a capacidade de regeneração do considerado viver bem. Segundo, o princípio da realidade. Esse é evidente que não conseguimos fazê-lo durante todo o tempo.
Conhecedores disso, temos a convicção de que o destino da pulsão falará muito de como o ser humano se desenvolveu e onde ele precisa se aprimorar. Dito de outra forma, é a forma de descobrirmos aquilo que em nós precisamos desatar e conduzir os nossos achados a uma constante melhora. Nesse ponto entra um desses destinos: a própria sublimação. Para Freud, a sublimação é uma das mais refinadas teorias.
É quando a pulsão não permanece apenas em um dado círculo, mas gera uma incorporação com tudo aquilo que representa o ser. Sublimação é aquilo que acende a chama pela vida. Então, podemos pensar que é quase uma experiência espiritual ou de transcendência.
Sublimação, literatura e psicanálise
Ainda em convergência com as pressuposições quanto a sublimação, contextualizamo-nos com a ideia de chegarmos até um consultório, poderia esta ser comparada com a entrada em um ensaio de uma grande apresentação e, naquele momento, houver a percepção de alguma coisa e confirmar que de fato aconteceu. Contextualizando, a imagem seria a de que “uau aconteceu mesmo” ou “você mudou”.
Passar por um linear onde não pode mais voltar. A sublimação é quando isso ocorre de tal maneira que a pessoa amadurece. A Literatura é um dos meios senão o melhor para que nós possamos alcançar esse crescimento. No consultório, o desenvolvimento de uma sublimação é muito trabalhoso.
Por exemplo, o leitor se depara com o ilustríssimo livro “O Idiota” de Fiódor Dostoiévski e é obrigado a sair completamente transformado através da perspectiva de uma compreensão completamente distinta do que era o amor ou do que era o romance. O leitor parte nessa jornada com o escritor, no qual é evidenciado a vida em um prisma mais real. Esse é o grande segredo de uma boa Literatura: trazer o leitor para o mundo real e não para a fantasia.
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A fantasia
A fantasia vende, mas é um livro que se finda. Não tem vida longa. Quando pegamos aquilo que realmente modifica o ser humano não é meramente um escrito. É uma obra de arte. Não é algo estético, mas traz o brilho de eternidade. Nesse contexto, a ideia principal do artigo é mostrar o quanto a sublimação é uma forma de transformar uma pulsão em algo socialmente aceito e, muitas vezes, reafirmado pela Literatura.
Eu acredito que qualquer obra literária de qualidade tem um feliz encontro entre forma e conteúdo. Freud e os grandes romancistas lidavam com o mesmo instrumento de trabalho, que é o discurso, a fala e a linguagem. Não há uma subordinação. No caso do romance, existe uma subordinação, quer dizer, a doença e o distúrbio surgem antes de haver o romance propriamente dito.
Gosto muito de citar o romance do nosso querido Machado de Assis, Dom Casmurro. Um romance que pode ser lido com um viés muito psicanalítico quanto a composição e formação das personagens. Como um senhor acredita e cogita a ideia de uma traição por parte de sua esposa que apresentou até então um amor sobremaneira e convicto de muito afeto e carinho.
Conclusão
Até que ponto a Literatura cria pontos de interface com a Psicanálise e com se torna engenho essa cumplicidade entre áreas de conhecimento quando bem utilizadas pelos escritores. Pensar nisso é fantástico! Indico como leitura dois ensaios de estudiosos desses campos: Dante Moreira Leite, com o livro Psicologia e Literatura, publicado em 1967 pela Editora Nacional e Ruth Silviano Brandão, livro Literatura e Psicanálise, publicado em 1996 pela Editora UFRGS.
Por fim reitero a ideia de que o romance, assim como a psicanálise, apenas existe quando estão sendo efetuadas em termos de linguagem e conteúdo. Aproveitem bastante as oportunidades libertadoras advindas da Literatura e o marco que é a nossa Psicanálise.
O presente artigo sobre a ideia de sublimação nas relações entre literatura e psicanálise foi escrito por Wallison Christian Soares Silva ([email protected]), Psicanalista, Economista, especialista em Neuropsicanálise e Gestão de Pessoas. Estudante de Letras e Literaturas.
1 thoughts on “Literatura e Psicanálise: ideias sobre a sublimação”
Muito bom artigo! O conhecimento é uns das maiores riquezas que adquirimos, quando nos empenhamos em conquistá-lo. A literatura é o melhor caminho!