neuroses contemporâneas

Verdades, subjetividades e neuroses contemporâneas

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O tema “verdade” e neuroses contemporâneas quase sempre está muito vinculado às questões morais, mas também a ouvimos de modo exaustivo em outras áreas como na política e nas mais diversas religiões.

A palavra verdade amplia-se também nas redes sociais. As mídias digitais não só popularizaram uma forma de entretenimento, mas o modo como as pessoas buscam ouvir àquilo que buscam ouvir e, portanto, vão construindo para si concepções de verdades que mais lhe respondem as questões do cotidiano.

Neuroses contemporâneas e a ciência

A própria ciência que tem como objetivo maior o conhecimento, que em seu diálogo – seja entre pares ou adversários – traz a ideia de verdade, ou seja, aquilo que ela se propõe a estudar e/ou produzir é o elemento que apresenta uma perspectiva única e que, portanto, não pode ser questionada – ainda mais quando vem de fora de sua redoma de proteção. Essa questão me leva a pensar o seguinte: Se todos estão com “a verdade” ou se procuramos “a verdade” qual seria o sentido de nos questionarmos e buscarmos as razões de nossos problemas no passado?

Talvez, a própria ideia de resolver “problemas” – no caso da psicanálise, nossas neuroses – não caiba a perspectiva do que chamamos “verdade”. No mundo moderno essa ideia não é a mesma que o próprio Freud coloca ao falar sobre a psicanálise. Essa concepção em Freud vem com o sentido de nos libertar. Portanto, nos liberta de quê? O amor à verdade em Freud está no reconhecimento de que somos muito mais que uma razão instrumental.

Esse tema pode nos levar por várias perspectivas. Neste caso, quero pensar o tema da verdade relacionado com a ideia de cultura. Freud vai dá uma atenção especial a cultura por ver que grande parte de nossas neuroses e angústias tem sua origem nas demandas da cultura, ou seja, no modelo de sociedade, nas exigências que se impõe ao homem como condição de viver um projeto civilizacional que não está mais na ordem dos desejos, mas no campo da moral. Um dos relatos interessantes sobre essa questão está na livro “Totem e Tabu”.

Neuroses contemporâneas e questões morais

O tabu do incesto, a recordação do parricídio (morte do pai) e a união dos irmãos revelam o conflito no âmbito das questões morais. A partir daí vai se estabelecendo costumes que dão lugar aos instintos mais primitivos. Fica estabelecido uma moral que não é apenas de natureza sexual (ou da sexualidade), mas da própria condição da cultura. Em outro escrito de Freud, em “Mal está da civilização”.

Neste ensaio Freud não só retoma questões como a ideia de prazer e desprazer, mas explica as fontes de sofrimento deste homem civilizado: “Já demos a resposta ai indicarmos as três fontes donde provém nosso sofrimento: o poder superior da natureza, a fragilidade de nosso próprio corpo e a deficiência das disposições que regulam os relacionamentos dos seres humanos na família, no Estado e na Sociedade.” (Freud, O mal-estar na cultura).

Em outro trecho Freud acrescenta: “[…] uma grande parte da culpa pelo nossa miséria é de nossa chamada cultura; seríamos muito mais felizes se desistíssemos dela e retornássemos às condições primitivas.” (idem) Freud não faz uma defesa ao retorno a uma condição inicial de nossa existência, ou seja, a condição primitiva, porém começa a indicar que naquele passado remoto estava um elemento de vivência muito mais adaptável a condição humana do sujeito.

Totem e Tabu

A voltarmos para Totem e Tabu o que vemos não é apenas uma disputa que termina com a morte do pai, mas o inicio de uma questão que vai se perpetuar pela própria existência da regra. O controle dos desejos irá passar pelo crivo visível daquilo que a sociedade (no projeto de civilização) vai determinando como sendo como correto. Pensando nessas questões o que devemos definir como “verdade”? Confesso que não tenho uma definição, porém, na psicanálise e no processo analítico o que se discute é a verdade do sujeito.

Os conflitos que veem do nosso inconsciente, não é algo que está numa subjetividade no qual o elemento palpável não existe. Pelo contrário. Ele é real (as neuroses) porquê é vivenciado pelo sujeito como uma condição que muitas vezes o oprime. As exigências da cultura entram em choque direto com as questões interiores. Muitas vezes, por mais que haja a sublimação, nem sempre é possível se evitar que em algum momento o sujeito venha a sofrer consequências mais graves de suas neuroses.

Podemos ver isso nos inúmeros casos de alcoolismo (e nas mais diversas formas de dependência química) ou nos casos de jovens mulheres que adoecem e muitas vezes chegam a perder a própria vida em decorrência de medicamentos para emagrecer, na busca do corpo perfeito. Freud ressalta no “Mal-estar da Civilização” que chegamos a um ponto desenvolvimento científico e tecnológico que em muito veio a facilitar a ampliar nossa vida, inclusive nos tirando grande parte do sofrimento físico, no entanto, isso não bastou para que alcancemos um conhecimento profundo de nossa condição humana.

Considerações sobre as neuroses contemporâneas

Se transpormos essas questões a nossa contemporaneidade vemos que ainda continuamos inquietos com nossa existência. Por mais que tenhamos transformado a natureza em nossa volta e, também, parte de nossa natureza, continuamos ainda mais com esse “mal-estar”. O medo do futuro, nossa insatisfação com o próprio corpo, necessidade de sermos escravos de nossas vaidades, continuam por não preencher plenamente nossa existência. Ainda não conseguimos estabelecer uma nova moral que nos permita alcançar o autoconhecimento.

As metas culturais da contemporaneidade ao invés de unir o sujeito tem o tornado cada vez mais alienado de sua própria existência. Neste sentido, a psicanálise ainda tem muito a contribuir com esse processo de autoconhecimento. Daí a necessidade de uma leitura de Freud para vermos que grande parte do que a cultura tem colocado como algo dado como verdade, são apenas construções de um tempo presente e que os conflitos que essas necessidades gerem podem e devem ser problematizados a luz de uma psicanálise que nos mostre a pulsão de vida.

O projeto civilizatório não pode perder esse referencial. Não podemos retroceder a uma condição primitiva, mas também podemos ter uma cultura que nos traga mais o sentimento de pulsão de morte do que a pulsão de vida. Pelo visto, há um longo caminho a se percorrer.

O presente artigo foi escrito por Jorge Alexandro Barbosa. Professor. Estudante Psicanálise do Ibpc. Cientista Social – UFPE. Mestre em Ciências Sociais – FUNDAJ.

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    One thought on “Verdades, subjetividades e neuroses contemporâneas

    1. Mizael Carvalho disse:

      Muito bom artigo! A palavra certa é a “INSATISFAÇÃO ” , o ser humano é um ser complexo, que têm constantemente um conflito interior.

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