O que é ser sujeito

O que é ser sujeito na linguística e na psicologia

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Você sabe o que é ser sujeito? Tornar-se sujeito é um processo contínuo de construção e desconstrução: constrói-se o ser-Eu desejado e se desconstrói a bagagem do que é Outro para nós.

Nesse sentido, o ser sujeito não é algo estanque, senão que se delimita em uma continuidade de processos. O Eu não é um Sujeito Real, mas um constante Potencial do que pode ou não vir a ser no futuro.

O Que é Ser Sujeito?

Ser Sujeito da própria vida significa, antes tudo, um esforço intelectual de escolher para si, entre tudo o que não se é, quem se deseja ser. Por isso, fazer-se Sujeito é um trabalho de escolha e decisão.

O que há Antes do que é ser Sujeito

Todos partilhamos de uma constituição mais ou menos universal em sua maneira de organizar-se: a família. Isto é, antes do Ego ser constituído no indivíduo, há uma estrutura de alteridade preparada ou não para receber esse sujeito.

Essa estrutura é um dos pontos de apoio sobre o qual o indivíduo irá se apoiar para ser quem é. Todavia, isso também implica assumir hereditariamente padrões de comportamento e maneiras de se colocar no mundo que são, antes de tudo, um elemento Alter para o Ego. Esses padrões podem ser positivos ou negativos, a depender dos resultados subjetivos que produzem.

O fato da família constituir um seio de alteridade significa igualmente que a semelhança e afinidade interpessoais são características circunstanciais e, de modo algum, inatas ou predeterminadas. Pelo contrário, segundo HANNS (2017), apenas uma parcela da personalidade individual é marcada por fatores genéticos. Assim, o peso de fatores sociais e familiares é destacado (incluso na medida em que faculta o desenvolvimento ou não determinadas características).

Quem é Sujeito

O lugar do sujeito é um não-lugar. Ontologicamente não há espaço para o sujeito moderno na lógica psicolinguística. O que se concebe é estanque, perene e singular. Isso não poderia ser mais distinto do que, de fato, é um sujeito; com ênfase no Sujeito Moderno.

A modernidade, com efeito, tornou etéreas e evanescentes muitos dos conceitos-base que orientaram as relações inter e intrapessoais ao longo da história. Por exemplo: a estabilidade dos relacionamentos afetivos foi posta em xeque diante da dinâmica moderna de vida social. Do mesmo modo, a concepção freudiana de Inconsciente (1915) rompeu com o paradigma racionalista de que o homem é, conscientemente, o autor de suas ações.

Hoje, de outro modo, já se percebe que as ações individuais mais têm a ver com as consequências das vivências passadas do indivíduo do que com um juízo crítico particular. Isso implica dizer, sobretudo, que o Ser é estranho a si mesmo. Ou seja, só é possível um indivíduo tornar-se quem é de fato após conhecer-se e compreender-se na medida de sua própria desconexão consigo mesmo.

Consciente, Inconsciente e o que é ser sujeito

Digo “desconexão” porque há uma barreira entre o que é Consciente e o que é Inconsciente. A essa instância, Freud nomeou Pré-Consciente. Trata-se de um patamar psíquico, uma área de transição entre o que se pode tornar consciente e o que não pode tornar-se consciente.

Ignorar essa organização é ignorar a si mesmo, pois, muito embora já hajam teorias mais adequadas ao nosso século, que tragam um olhar biológico para o funcionamento da psique humana, essa lógica freudiana ainda é um retrato preciso do humano.

A Lógica Linguística e o Lugar do Ego

A língua é um fato social que reflete o modo de pensar de um povo. Não compreendemos o mundo para explicá-lo com a língua, senão que o criamos através do idioma no qual fomos educados. A sintaxe, a morfologia, o modo de enunciação, os modos e os tempos verbais: tudo isso delimita a maneira como vai se operar o olhar do ser para o mundo que o rodeia, criando-o sob uma perspectiva X ou Y.

Línguas como o Finlandês, por exemplo, cuja gramática permite a divisão de sujeitos partitivos (nós como Eu e Tu ou nós como Eu e Elxs) se diferencia sobremaneira do português, que carece de sujeito partitivo. Além disso, a história agregada a cada sintagma linguístico carrega uma carga de significados importante, que pode representar preconceitos (ex. denegrir = tornar negro), perspectivas de olhar (ex. a sinházinha) memórias históricas (ex. para inglês ver = referência ao período de abolição da escravatura brasileira) e influências de outros povos cujos ancestrais travaram contato com os nossos (ex. Muleque, Jacaré, Guaraná, Pombagira, Cafuné etc).

Nesse sentido, a prerrogativa de um Eu como sujeito emissor de enunciados propende a gerar uma ideia de estabilidade individual. Isto é: de que o Ego permanece o mesmo do princípio ao fim da vida. Tal ideia gera uma discussão ampla que se pode definir a partir de uma perspectiva enunciativa. Essa perspectiva é abordada por GALVÃO (2019), que a define propondo um olhar hipotético: imaginemos que haja um ser humano que mudou radicalmente ao longo da vida.

O “observador” interno

Suas atitudes e padrões de ser cambiaram. Porém, o “observador” interno, seu Eu permaneceu o mesmo por detrás de todos os câmbios. Sem dúvidas, essa perspectiva é interessante e presente no pensar contemporâneo. Todavia, também é possível considerarmos que, quiçá, o que mudou não foi o Eu, mas sim a maneira como se lida com o mundo.

Isso implica dizermos que o Eu é a integralidade do sujeito enquanto que o Ego é apenas uma dentre as três instâncias psíquicas propostas por Sigmund Freud (2021) : Id, Ego e Superego. Ou seja, a integralidade não muda. Apenas alguns de seus aspectos cambiam completamente. No entanto, a dificuldade de mudança do Eu não é sinônimo de estabilidade, haja visto que, justamente por não ser um sujeito estático, o Eu não é capaz de mudar permanentemente, pois sua natureza já é, por si mesma, continuamente mutável.

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    O Fazer-se Sujeito na Relação Com o Outro O contato do Eu com o Outro é um contínuo estranhamento ansiogênico. A conformidade perfeita entre dois indivíduos é impossível, de modo que, quando parece ocorrer, podemos deduzir que haja algum elemento de fantasia nessa relação. Pode ser uma imagem idealizada que o Ego usa para não enxergar a realidade de quem é aquele outro indivíduo; ou uma persona narcísica que o outro cria para ser visto pelo Ego. Em ambos os casos, a consonância perfeita é mentirosa e gera desapontamentos e sofrimento para os envolvidos.

    Perfeição, harmonia e o que é ser sujeito

    Isso também abre espaço para um diálogo interessante acerca da perda identitária de cada um que se envolve em relações desse tipo, pois, para vivenciar tal fantasia é preciso abrir mão da própria identidade individual para sustentá-la. Ou seja, o preço para se ter a “pessoa perfeita” é a própria identidade. É um paradoxo, pois é impossível haver perfeição e harmonia em uma relação sem uma base saudável.

    Porém, também é um fato que relacionamentos com esse matiz ocorrem com frequência. É, precisamente, a partir dessa perspectiva de relação ansiogênica que se parte para uma reflexão assertiva sobre o contato entre dois sujeitos. É preciso, pois, que haja uma construção intrínseca de identidade para que o contato seja menos doloroso.

    Afinal, o toque simbólico que ocorre quando duas pessoas, cuja existência coexistiu separada até então, têm seus caminhos cruzados e momentaneamente convivem em um mesmo “espaço” (em uma concepção mais ampla do que lugar físico, me refiro a um lugar na vida uma da outra) há uma troca de vivências que altera em parte a individualidade de cada uma. Isso representa também uma causa da ansiedade de contato, pois mudar e viver novas coisas implica o abandono daquilo que é conhecido.

    Como o Ser se torna Sujeito?

    Como dissemos, o Eu é permanentemente mutável e, por isso, ele não muda sua natureza. Compreendo aqui Eu como um conjunto de potencialidades desenvolvidas, em desenvolvimento e passíveis de serem desenvolvidas. Por essa razão, a mudança é impossível, uma vez que o que se chama mudança nada mais seria do que um efetivar de algo que já se era em potência.

    Entender que o ser é uma potencialidade em aberto implica que percebamos a insuficiência de uma ideia de vida teleológica, isto é: orientada por um fim e não para um fim. Ou seja, é preciso questionarmo-nos se discursos pautados em “destino” ou numa “preconcepção” de Eu são suficientes para lidar com as demandas do humano moderno.

    Contudo, isso não significa dizermos que o Eu é per se um Sujeito separado de outros. Tornar-se sujeito, pelo contrário, é fazer-se quem se deseja ser. Quiçá, fazer-se quem se é, pois trata-se de uma escolha pessoal e um esforço particular. Para nos tornarmos quem somos temos dois caminhos fundamentais: escolher entre possibilidades viáveis o que queremos ou não e decidirmos a partir daí ou deixarmo-nos escolher por outrem.

    O resultado psíquico e o que é ser sujeito

    Esse outrem pode ser desde uma figura familiar até uma ideia de alteridade presente na vida individual. O que, de fato, impacta o ser é o resultado psíquico dessa escolha.

    Optar por sermos quem somos é um caminho de julgamentos incessantes e contínua dor pelo fato de sermos nós os responsáveis por tudo o que nos ocorre a partir daí.

    No entanto, a contraparte dessa hipótese é ainda mais dura justamente por fazer com que o Ser não seja o protagonista da sua própria existência. É exatamente esse processo que fomenta a ausência de identidade geradora de ansiedade no trato com outrem.

    A Beleza do Percurso

    Embora não se possa afirmar que o processo de tornar-se um Sujeito seja desprovido de sofrimento, podemos perceber que tal processo gera menos sofrimento para o indivíduo do que a aceitação dos valores e ideais de outrem para si.

    Além disso, parece ser imanente à condição humana a busca perene pela identidade e, provavelmente, seja esse o ponto de significado da própria existência. Afinal, dentro de uma perspectiva de normalidade neurótica, isto é, dentro de um lugar de : “(…) fenômenos gerados por um conflito psíquico, envolvendo a frustração de um impulso instintivo.

    Além disso, podemos entender como neurose o resultado de nossas experiências. Sejam elas vivências, traumas ou recalques, conforme pontua a psicanálise. E também é entendida como problemas relacionados à fixação da libido e à fixação problemática.” (PSICANÁLISE CLÍNICA, 2017).

    Compreender a si mesmo sobre que é ser sujeito

    A completa compreensão de si mesmo talvez signifique uma descoberta mais traumática do que satisfatória. Assim sendo, a melhor maneira de se compreender o movimento que é tornar-se quem se é se baseia no fato de que todo ser humano é um ser em construção e a própria razão de ser do processo é o processo.

    Ou seja, caso não fosse necessário a construção de um Eu particular, seja por ausência de conhecimento ou por já o termos constituído, a vida não seria dotada de um sentido orientador. Assim, construir quem se deseja ser é, acima de tudo, também um ato direcionador da existência.

    Isso envolve compreensão e protagonismo, pois o abandono de um senso teleológico da vida significa ao mesmo tempo o abraçar de uma responsabilidade, que é cuidar de si mesmo. É um caminho árduo, mas, o único possível para uma vida saudável.

    Referências Bibliográficas

    FREUD, S. Cinco Lições de Psicanálise. [Online]. Disponível em: https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&url=https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php%3Fid%3D1636878&ved=2ahUKEwjI0M3Au7HzAhUIq5UCHZgzBo0QFnoECC4QAQ&usg=AOvVaw0kNV2Pay7ZHg5iiDoAaKe0 . Acesso em: 03 de Outubro de 2021.

    FREUD, S. O Inconsciente. 1915. [Online]. Disponível em: https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&url=https://joaocamillopenna.files.wordpress.com/2016/04/freud-o-inconsciente.pdf&ved=2ahUKEwjfwMectrHzAhXBqpUCHVVdA7gQFnoECDcQAQ&usg=AOvVaw2yygHL7kMeetUE-UrbX3k0>. Acesso em: 03 de Outubro de 2021.

    GALVÃO, L.H. Voz ou Ego? Ideias Próprias ou Opinião?. 2019. [Online]. Disponível em: https://youtu.be/FJ92REVzkOg. Acesso em 03 de Outubro de 2021. HANNS, L.A. O Que Você Consegue (ou Não) Mudar em Si Mesmo. 2017. [Online]. Disponível em: <https://youtu.be/EK1VjrNMfjA>. Acesso : 02 de Outubro de 2021.

    PSICANÁLISE CLÍNICA, O Que é Neurose Para a Psicanálise?. 2017. [Online]. Disponível em: https://www.psicanaliseclinica.com/o-que-e-neurose/. Acesso em 05 de Outubro de 2021.

    Esse artigo foi escrito por Gabriel Montes, psicanalista egresso do IBPC e acadêmico de Letras e História. Sua área de pesquisa aborda Literatura, Psicanálise, História e Feminilidade. Também atua com atendimento virtual. Contato: [email protected]

    One thought on “O que é ser sujeito na linguística e na psicologia

    1. Mizael Carvalho disse:

      Muito bom artigo! Precisamos nos conhecer, o que adianta como psicanalista; conhecermos as pessoas (pacientes) e nós mesmo, somos estranho a nós! O filósofo Sócrates diz:
      “Conhece-te a ti mesmo,torna-te consciente de tua ignorância e será sábio.”

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