Você já ouviu falar em Tempos Líquidos ? A partir da virada do século XX para o XXI, precisamente em meados de 1999 para 2000, chamado de ‘bug do milênio’ diariamente ficou comum aparecerem debates tanto na academia como rádio e televisão e nos jornais e revistas com artigos e entrevistas focadas e bem pontuais sobre afinal, o que seria a pós-modernidade?
A pós-modernidade dos tempos líquidos
No contexto antes exposto, questionamentos eram apresentados se já estávamos ou não na pós-modernidade? Se existia de fato a pós-modernidade? E a pergunta mais incisiva: o que era afinal a pós-modernidade e como reconhecer a sua transparência? Por outro prisma, muitos intelectuais divergentes diziam que não existia a pós-modernidade e sim, uma mera visão e percepção pós-industrial com um amadurecimento tecnológico
Que a pós-modernidade era uma mera falácia e uma ficção social. As discussões foram acaloradas. Até que trouxeram num debate no RS, no evento Fronteiras do Pensamento (UFRGS) entre outros, o filósofo e sociólogo Zygmunt Baurman, (n. Polônia, 19/11/1925 – f. Reino Unido, 19/11/2017) autor de várias obras sobre a pós-modernidade e suas intersecções com muitos temas emergentes.
Bauman esclareceu o que era a modernidade e a pós-modernidade. Nada melhor do que o genitor do conceito sociológico traçar as linhas dos dados divisórios. Em palestras e conversações Bauman deu um panorama do que seria a modernidades já em declínio e como a pós-modernidade estava aos poucos florescendo e aflorando principalmente no tecido social do mundo ocidental.
Tempos Líquidos para Bauman
A maior linha dos dados divisórios da modernidade com a pós-modernidade era o romantismo e o simbolismo que começava a desaparecer. E realmente era um fato social inegável. A existência centrada em propósitos, projetos e hierarquias e ligada ao princípio do ainda-não, ou seja, do adiar satisfações e se preocupar com ser alguém e ter uma carreira e renda e construir uma vida a dois estava desaparecendo cedendo espaços para uma visão disjuntiva, da busca monetária desenfreada, do ‘princípio do já-provisório’.
Nada de adiar satisfações. A filosofia do tempo do prazo de validade da vida ganhava espaços. A onda era viver o ‘princípio do aqui-e-agora-comigo’. Muitas coisas começavam a desmoronar, como a fronteira entre gêneros, os paradigmas, fim a profundeza nas coisas. A metafísica começava a dizer adeus.
Transcendência e a determinação cediam espaços paulatinamente para a indeterminação e ironias. Entrava em cena o poliamor, o desejo desenfreado e desconstrução de tudo. Os jovens começavam a viver o acaso, a espontaneidade e deflagraram a descriação do possível. Tudo teria que ter um revisionismo e quem saber reescrever ate a História.
A evolução moderna e os tempos líquidos
A pós-modernidade começava a dar seus primeiros passos a partir de meados de 1995, como um novo período histórico, sendo a condição pós-moderna uma consequência da evolução moderna. Já em 1945 estava lançando bases até meados de 1960. A partir dos anos 1970 até 1980 tudo começou a se transformar.
O que era antes uma seleção começava a ser uma combinação, uma busca por sinergia. Nada mais passaria a ter significado. As pessoas já não queriam mais saber da origem e causa, mas apenas tentar lidar com os sintomas de forma bem superficial. Começava uma fase de esquizofrenia geral o que ativou muita ansiedade, pânico, angustia existencial.
A depressão explodiu e passou a ser o vetor e numa busca frenética pela medicalização. Prozac ganhou notoriedade. O genital e fálico cederam para uma situação polimorfa andrógina. Nas escolas não se falava mais em ‘disritmias’ dos jovens mas, na ‘hiperatividade’ que precisava ser medicada e estabilizado.
A relação com a tecnologia
A tecnologia começa a evoluir engendrando uma escola pré-moderna, um professor resistente da modernidade, mas apegada a visão analógica e um aluno pós-moderno digital. Um quadro de inversão de valores se instalou e tudo foi se horizontalizando. O aluno como um rebelde passou a agredir os professores. Emerge o professor Google, proibido pelos analógicos.
Um jovem entra numa livraria e passa a levar num pdrive uma prateleira de livros debaixo do braço ou no bolso. O tablete e quadro eletrônico viram reivindicação nas escolas de classes medias. Explodem as crises e o fim das relações conservadoras nas famílias. Entram as adições (drogas) e luta pela liberação não só do poliamor, mas do aborto e drogas.
Os movimentos LGBT’s afloram em várias nações e surge o movimento social libertário no âmago das sociedades. A presença dá lugar à ausência. Emerge a celebração do mercado e as relações de consumo e o dinheiro começa a se impor para ser o novo Deus.
Tempos Líquidos e a liberdade individual
Bauman discorre em suas análises que a marca da pós-modernidade é a própria vontade de liberdade individual e da livre opção, operando no tecido social o princípio do aqui-e-agora e do já-provisório, onde o ainda-não é deixando de lado, porque não era mais o foco uma segurança projetada em torno de uma vida estável, sólida e de estruturas sociais rígidas e inflexíveis que caracterizam a modernidade.
Não era mais possível esperar passar longos estoque de tempo chamado de ‘perdidos’ O homem e a mulher líquidos emergem refletindo a fluidez, a ausência de formas definidas, como pessoas mais velozes, com mobilidade, porém, mais inconsistentes que querem viver o agora. Estoque de tempo passa a ser uma preocupação.
Para o pós-moderno o tempo voa, não dá para esperar. Os conflitos surgem na medida em que as sociedades não conseguem lidar com os estoques de tempo de forma célere e geram frustrações. E as novas mentes pós-modernas tudo passa a ser frágil, fugaz e maleáveis, como os líquidos. Tudo o que é sólido se dissolve no ar.
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O lúdico e o hedonismo
O foco é a escolha, a opção, O lúdico e o hedonismo descontraído é procurado, em festas. Passa a valer a história de vida, o fragmento, a descentralização e o ‘ficar’, com um individualismo e um holismo levado as últimas consequências, a externalidade da realidade, a anarquia, o silêncio, o caos e fim da visão de espirito santo ou salvação messiânica nos corações dos jovens. Deus passa a ser a ciência e o dinheiro. Tudo passa a ser um jogo.
A situação pós-moderna recebe um reforço da ideologia da linha rentista monetarista que vai se instalando nas sociedades dos boletos. As pessoas querem ganhar dinheiro e se divertir e o resto que venha a reboque tudo encaixado no princípio do aqui-e-agora-comigo. O jovem expressa que precisa viver, que a vida é curta, que tem poucos anos pela frente e tudo o que encurta caminho ganha alta taxa de atenção.
A grande aposta passou ser os tradutores de línguas simultâneo para que possa se aventurar pelo mundo antes de morrer. O celular passou a ser o ponto da essência do espírito dos jovens pós-modernos, e no embalo entraram a reboque os mais maduros e idosos.
Considerações finais
Temos o case da senhora que pede numa sala em silêncio aos berros que falem com ela e parem de mexer no celular, mas diante do silêncio sepulcral cruel e castigador da ausência da fala, resolve entrar na onda, compra uma celular e aprende a manejar e num grupo arruma um namorado e a idosa sai de casa e vai viajar e almoçar e jantar fora.
É a dialética pós-moderna dos tempos líquidos que parece ser um paradoxo, mas é um novo paradigma. A televisão cede para celular na palma da mão. Nos restaurantes, o jovem usa uma mão para se alimentar com garfo e a outra para manejar seu celular. Bauman, portanto desvela o que seja a pós-modernidade dos tempos líquidos, mas não deixa de expor que a esperança não foi ainda afetada.
Existe esperança de algo acima da pós-modernidade, quem sabe a ultra ou trans-modernidade seja melhor? A pós-modernidade vem transformando o planeta. Porém, vale destacar o Nikos Kazantzakis (1883-1957) poeta e pensador grego que expressou: “Conquiste a última, a maior tentação de todas: a esperança.” Vamos ter que esperar o que virá depois da pós-modernidade.
O presente artigo foi escrito por Edson Fernando Lima de Oliveira ([email protected]) é licenciado em Filosofia e História. Possui PG em Ciências Políticas, realizando PG em Psicanálise e acadêmico e pesquisador de Psicanálise Clinica e Filosofia Clinica, cursando no IBPC e Instituto Pacter.