Freud e a Sociologia: como a Psicanálise vê a sociedade?

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Os estudos do psicanalista Sigmund Freud a respeito da natureza e do comportamento humano auxiliaram na compreensão da sociedade. A psicanálise de Freud e a sociologia acabaram tornando-se áreas correlatas, ao estudarmos alguns trabalhos seus sobre o comportamento humano. Afinal, como estudar as sociedades e civilizações e compreendê-las mais a fundo sem antes estudar o próprio homem?

Dessa forma, vemos que o campo de estudo de Freud foi muito além de um novo tipo de tratamento terapêutico. Seus estudos sobre o comportamento humano tornaram-se um modelo de análise sociológica. Freud e a sociologia, portanto, estão mais próximos do que podemos imaginar.

Até por que, principalmente após a divulgação da psicanálise durante a Primeira Grande Guerra, a humanidade passou a ser repensada. E isso propulsionou a ampliação das possibilidades de aplicação da psicanálise.

Apesar de sociologia e psicanálise serem duas disciplinas distintas, é possível estabelecer diálogos entre essas áreas. Sigmund Freud, por exemplo, utilizou conceitos sociológicos em seu trabalho e interpretou fatos da vida social e histórica. E, depois, a psicanálise teve influência em importantes correntes sociológicas.

O Livro Totem e Tabu    

Vemos isso na obra “Totem e Tabu: Alguns Pontos de Concordância entre a Vida Mental dos Selvagens e dos Neuróticos”. Lançado em 1913, o livro traz um exemplo para compreendermos melhor a relação entre Freud e a sociologia. Nesse livro, Freud aplica a psicanálise aos campos da arqueologia, da antropologia e também da religião.

O psicanalista procura utilizar indícios antropológicos para explicar de que forma a raça humana se desenvolveu. Assim, ele faz um panorama desde os povos primitivos até as civilizações mais complexas.

É como se, nessa obra, Freud empregasse a teoria de Édipo para realizar uma análise social. Principalmente quando ele discorre sobre o homem primitivo. O autor argumenta que os jovens machos se revoltam e matam o pai para conseguir as mulheres. Esse fator Freud coloca como preponderante para que tenha se dado início à civilização.

Após assassinar o próprio pai, o homem fica com uma grande sensação de culpa e sente a necessidade de eliminá-la. Assim, através do sacrifício e da criação de um Totem (uma espécie de religião), a culpa passa a ser controlada. Dessa forma, as relações sociais também passam a ser tornar possíveis.

Também é na culpa reprimida ou internalizada de se matar o próprio pai que se tem a origem do superego. Além disso, Freud também aborda a questão do importante papel de líder, então pai.

Esta hipótese, geralmente, é contestada pelo fato de não representar uma verdade histórica. Entretanto, ela pode ser considerada como uma metáfora a respeito da ordem social e das relações psicossexuais.

Totem e Tabu tornou-se muito conhecido, principalmente nos Estados Unidos, ao fim da Primeira Grande Guerra. Bastante polêmico em suas concepções ousadas, o livro acabou produzindo reações contrárias em muitos antropologistas da época.

Os sacrifícios para se viver em sociedade

Com sua alegoria ou metáfora, Freud traz à tona uma discussão sobre o modo do funcionamento dos grupos ou sociedades. Esse estudo também pode ser encontrado, direta ou indiretamente, em outros trabalhos seus. Freud relaciona a maneira como o homem se organiza com a forma como ele controla a sua sexualidade.

Ele expõe que, ao invés de a interação sexual ocorrer de forma direta, o grupo social se forma por meio de relações sublimadas. Principalmente as relações que envolvem a figura do pai ou líder do grupo.

De acordo com Freud e a sociologia de sua obra, é como se, para vivermos em sociedade, tivéssemos de recalcar parte de nossos desejos. Desejos iniciais ou primitivos. Nessa perspectiva, a relação de amor individual entre o filho e a mãe deve ser quebrada pelo pai. E o pai se torna uma espécie de terceiro.

Trata-se de três fases. Primeiramente, amamos a nós mesmos (narcisismo). Em seguida, amamos a nossa mãe, até percebermos que somos uma pessoa separada desse amor. Por fim, acabamos nos identificando com um grupo social mais amplo. Para tanto, é comum a doção de um ideal de ego, isto é, alguém que gostaríamos de ser.

O indivíduo e a civilização, segundo Freud

Freud pensava que a sociedade e a cultura desempenham um papel importante no desenvolvimento da personalidade humana. Então, haveria uma retroalimentação entre a vida psíquica individual e a psicologia social de uma época. Freud entendia que a civilização (sinônimo de cultura) restringe os desejos e impulsos naturais do sujeito, como se fosse um aprimoramento mais amplo do Complexo de Édipo experimentado pela criança junto a seus pais. Quando exagerado, o superego controlador que impõe normas sociais pode levar a conflitos internos e a problemas psicológicos.

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    O primeiro passo para compor esse meio social é a inibição de um estado instintivo inerente a todos os seres. Essa inibição acarreta em uma privação de características próprias do homem. E isso faz com que ele acabe alimentando certo descontentamento. Descontentamento esse que pode se refletir nos mais variados meios sociais.

    Neste sentido, para Freud e a sociologia, os homens ditos civilizados são sempre descontentes, em busca de sua felicidade. Por isso ele afirmou que o homem deveria abandonar a civilização e começar tudo do zero. Na obra “O mal-estar na civilização”, Freud expõe uma discussão de cunho filosófico-social, usando como base a sua teoria psicanalítica.

    Freud e a compreensão da sociedade atual

    Freud aponta que, na vida em sociedade, não há a possibilidade de se ter avanço sem perdas. Ele afirma no seu livro “O mal-estar na civilização” a ideia de que a sociedade é inimiga da satisfação dos instintos humanos. Para viver em sociedade, o homem tem que abdicar de sua natureza individual.

    Assim, ele passa a ser um indivíduo parte de um meio social, deixando um pouco de seu próprio ser. Para viver em sociedade, o homem precisa sacrificar alguns de seus instintos. Dentre eles, Freud cita a agressão e a sexualidade.

    Isso acaba criando um paradoxo, já que o homem precisa reprimir a si mesmo para viver numa sociedade considerada civilizada.  E esses impulsos que não podem ser satisfeitos no homem civilizado acabam causando nele a infelicidade e a neurose. É importante diferenciar:

    • barbárie: vale a lei do mais forte;
    • civilização (ou cultura): os constructos humanos (como as artes, as leis, as morais, as religiões, as escolas, as divisões sociais do trabalho etc.) que tentam reduzir a força do mais forte e dar uma “oportunidade” ao mais fraco, permitindo um convívio teoricamente menos “animalesco”.

    Entretanto, esta civilização cobra um preço, que é a impossibilidade do sujeito ceder ao seu prazer e às suas pulsões (como a agressividade e o sexo). Assim:

    • o id não pode realizar todos os seus desejos e pulsões, pois isso colocaria em risco a vida de outras pessoas e o convívio social;
    • o superego é a parte de nossa mente que vai introjetar essas regras sociais, como se fosse um “pai” evitando que cedamos às pulsões;
    • o ego será o “eu” que tentará uma mediação, isto é, dar um pouco de prazer ao id ao mesmo tento em que segue as imposições do superego.

    As aproximações entre psicanálise e sociologia

    Dessa forma, vemos como a obra de Freud e a sociologia nela presente pode ser identificada de forma clara e elucidativa. Além de a sociologia estar presente em sua obra de maneira mais explícita do que podemos imaginar. Assim, Freud contribui para compreendermos mais sobre o homem e a sociedade atual. Não apenas sobre o homem como indivíduo em si, mas sobre o homem civilizado e seu papel ou comportamento na sociedade.

    Por sua vez, algumas linhas da sociologia (como a Escola de Frankfurt) foram diretamente influenciadas pela psicanálise. Autores desta escola, como Max Horkheimer, Herbert Marcuse e Theodor Adorno, utilizaram conceitos psicanalíticos para analisar as dinâmicas sociais, tais como a alienação, a repressão e a influência da sociedade na formação da personalidade subjetiva.

    A psicanálise se concentra na vida emocional e psíquica do indivíduo. A sociologia estuda a vida em sociedade, ou seja, como “um e um” é mais que dois (isto é, a sociedade não é apenas uma soma de partes, mas tem também sua materialidade própria). Há muitos pontos de conexão entre as duas disciplinas, porque é parte delas a indagação sobre a natureza humana e sobre os fenômenos sociais.

    Não há como entender o que é psicanálise sem que se olhe para as relações interpessoais, que, no fundo, são relações sociais: o sujeito e a família, o sujeito e a escola, o sujeito e o Estado etc.

    Isso tudo talvez nos auxilia a compreender mais profundamente o caos social em que vivemos. E, além disso, a entender a busca – talvez incessante – dos homens por uma felicidade ainda distante de tantas sociedades.

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    2 thoughts on “Freud e a Sociologia: como a Psicanálise vê a sociedade?

    1. Salma Santos de Oliveira disse:

      Muito bom o conteúdo apresentado

    2. Mizael Carvalho disse:

      Gostei muito da explicação acerca da teoria freudiana (ID, SUPEREGO E O EGO), ficou de fácil compreensão. Parabéns!

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