o farol

O Farol (2019): resumo e análise do filme

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O filme o farol é todo em preto e branco, em formato de tela quadrangular, com uma espécie de sujeira – certo chuvisco na câmera que mostra toda a imperfeição da época, dos fatos, das cenas, dos personagens, de tudo.

Nada mais perfeito para essa análise do que utilizar a antiga arte que está sendo esquecida nos dias atuais: a escrita.

Entendendo sobre o filme o farol

Para mim, tudo se passa na cabeça de alguém, processos mentais de apenas uma pessoa, um indivíduo jovem – maduro, que atormenta-se com fatos do seu passado, a presença interiorizada de um pai autoritário e castrador, os conflitos com seus desejos e possível saudade de alguém que ficou para trás.

Além disso, seu desespero perante a vida e as responsabilidades que para ele são insuportáveis, a presença terrível de uma figura mais velha, que representa tanto o que ele considera o seu futuro, quanto uma força interna que o reprime e o atormenta impedindo-o de “ver a luz”, de aceitar e perceber a realidade a sua volta, o Real.

Vou denominar duas presenças neste enredo: o Jovem e o Velho. O Jovem embarca em mais uma aventura de autodescobrimento e ao mesmo tempo de fuga, suas falas entremeadas de culpas e conflitos do passado, do trabalho nas florestas, daquilo que supostamente aconteceu com alguém.

 O filme o farol e a masculinidade

Tem a companhia do Velho, uma figura que o lembra de seu pai, seu autoritarismo e que o impede de ver a luz do farol, e de subir até o topo da estrutura. Em outras palavras, isso tudo que o impede de assumir a sua masculinidade, ao mesmo tempo que uma polaridade sua é impedida de se manifestar, a luz, a consciência unificadora não pode ser vista. Tanto o lado masculino quanto o feminino precisam ser vistos e possibilitados de existirem em sincronia e união.

Quanto mais o Jovem tenta impor a sua vontade, mais o Velho o atormenta, manipula e o alcooliza, pelo Jovem estar preso a ideias e crenças de respeito aos mais velhos, e o sincronismo do Velho com seu próprio pai, este Jovem sempre se cala e se permite entrar no jogo autodestrutivo do Velho – no caso seu algoz interior, o dono da lâmpada, da luz da verdade.

Em si, o Velho procura consumir o Jovem, destruí-lo enquanto é tempo, antes do Jovem poder se impor e tomar o seu espaço. O Velho tem uma relação simbiótica e neurótica com a luz do farol, se coloca em sua presença como um gozo, ou adoração religiosa, ao mesmo tempo que o Jovem não pode alcançá-la, ele mesmo, o Velho desconhece o que seja esta luz de fato, a consciência superior, completa.

A esperança

A esperança de que uma saída, um navio retornaria a buscá-los no prazo se esvai, então seja lá o que este indivíduo buscou como saída, fuga ou cura, não mais funcionou, e a desesperança de assistir o seu conflito “pegando fogo”, e aos poucos tanto o Jovem quanto o Velho entrando em rota de oposição e colapso.

Os desejos não realizados do Jovem o atormentam na presença fantasmagórica da sereia e seus gritos, o Velho que se aproveita destas mesmas neuroses para consumir o Jovem em seu desespero, o livro que o Velho carrega anotando mentiras em relação ao Jovem, uma cartela de auto boicotes que mostrariam a ele sua insignificância, preguiça, indolência, falsidade etc.

Talvez não necessariamente mentiras, mas as sombras que a consciência não admite possuir. A bebida, no caso da água transparente, a água do poço só libera água suja, da mesma cor dos excrementos, da terra, a única água “limpa”, transparente, é a da bebida que embriaga e mostra a “verdade”, a suposta saída para o desespero íntimo e avassalador.

Centro da luz sonhada no filme o farol

O bote, a tentativa do Jovem de escapar da ilha e do Velho, a perseguição do Velho, do futuro sombrio, quebrando o bote e impedindo a fuga. A descoberta que os dois têm o mesmo nome, são o mesmo ser.

No final, quando a dor e o desespero do Jovem o forçam a lutar contra o Velho, a destroná-lo do trono imaginário da consciência, em que o Jovem o enterra vivo, tenta calá-lo em suas mentiras e perseguições. A suposta ressurreição final do Velho e tentativa de novamente, calar o Jovem, em que este o mata definitivamente, decepa sua cabeça, e se encaminha para o topo do farol.

Este ao chegar ao centro da luz sonhada, mas não tendo condições mínimas a suportar esta luz, de compreendê-la em sua consciência mais elevada, tendo então uma espécie de orgasmo existencial, um samadhi temporário com esta luz, que ao final o joga para o chão, para o rolar das escadas, até o chão raiz. Este, quebrado e rompido, sucumbe com as gaivotas consumindo suas entranhas.

A consciência exterior

A gaivota, para mim a consciência exterior que aparece como guia, como uma tentativa de comunicação, despertar e auxílio nesta cilada que é a ilha, tentativas de mostrar o caminho.

O jovem, ao não querer ouvi-la, primeiro joga uma pedra na direção desta consciência amiga e a retira do caminho, na próxima mata esta consciência e a rejeita, tendo uma morta no buraco da fossa; as advertências do Velho para que não as mate, pois isso seria a ruína, a perda real do caminho a seguir.

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    Em relação aos maus augúrios, a cena em que o Velho, possuidor do tempo passado, invoca toda a força do inconsciente, dos mares em fúria, de Poseidon, em direção ao Jovem, propiciando depois um maremoto dentro da própria casa, arrastando móveis, lembranças e desejos, tanto o Jovem quanto o Velho, “limpando a casa”, antes da morte do Velho e a presença do Jovem.

    A desesperança no filme o farol

    É um filme denso, desesperançoso, sem um final feliz, é o retrato do que seria uma busca infrutífera por caminhos ruins, do querer seguir sem ouvir a voz da intuição superior (gaivota – aquela que voa mais alto, que tem a visão de cima, mensageira dos deuses, traz sorte para os marinheiros pois indica a presença de terra firme próxima).

    De querer caminhar pelo próprio orgulho sem se conectar com as raízes, com o solo, a terra firme e seca. Também o perigo de não curar as feridas do passado, as feridas antigas da “casa”, dos laços familiares, e como estes laços não curados nos perseguem indefinidamente; e de procurar unificar os opostos que nos habitam, de fazer as pazes conosco.

    A cena final das gaivotas consumindo as entranhas do Jovem, propiciando uma transformação, uma nova chance futura, ou renascimento posterior, já que este não obteve o sucesso e a realização pretendida. Talvez o segredo deste, e todo e qualquer Farol, seja que o núcleo de sua luz não se encontra em seu topo – este mostra o aspecto visível exterior – mas sim em seu subsolo, na escadaria abaixo da escadaria, por dentro da Terra…

    Este artigo sobre o filme O Farol foi escrito por Jorge C. Neves (Instagram: @jorgecnterapeuta), terapeuta e psicanalista, artista, escritor e interessado em divulgar o que a alma sente e a mente deseja descobrir…

     

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