caso Schreber para Freud e a psicanálise

O caso Schreber na visão da Psicanálise

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O Caso Schreber trata-se de um complexo diagnóstico através da Psicanálise, uma vez que, assim como Sigmund Freud, somente temos contato com o paciente através de seu livro “As Memórias de um Doente dos Nervos”, publicado em 1903.

Dessa forma, o Caso será elucidado cronologicamente e, posteriormente, o texto trará um possível diagnóstico, baseando-se nos escritos do Pai da Psicanálise.

Para trabalharmos o Caso de uma forma mais rica, é necessário trazer algumas informações sobre a vida, não só de Schreber, mas de sua família.

A vida de Schreber

Daniel Paul Schreber nasceu em 1842, fruto de uma família protestante burguesa, em sua formação acadêmica, se tornou doutor em direito e juiz-presidente da Corte de Apelação da Saxônia; homem de família renomada, presidente da Corte de Apelação e com um histórico familiar amplo em relação à saúde mental, como veremos a seguir.

Seu pai era médico e professor, responsável por introduzir, na Alemanha, a Ginástica Médica, além de ter sido o promotor do movimento em prol dos loteamentos ajardinados para operários. O irmão mais velho de Daniel Paul Schreber, que sofria de uma psicose evolutiva, suicidou-se, com um tiro, aos 38 anos de idade. Sua irmã mais nova, Sidonie Schreber, morreu acometida por transtornos psíquicos.

Schreber Foi hospitalizado, pela primeira vez aos 42 anos, com uma crise que durou meses, ao fim foi qualificada como “hipocondria grave”. Aos 51 anos lhe ocorreu a ideia de que “seria muito bom ser uma mulher submetida a um coito”, mas prontamente esta ideia foi rechaçada por ele.

A origem do Caso Schreber

Meses depois de sua nomeação como Presidente da Corte de Apelação, Schreber foi acompanhado por insônias, que foram se agravando, e sensações de “amolecimento cerebral”. Depois apareceram ideias de perseguição e de morte iminente, assim como uma extrema sensibilidade ao barulho e luz.

Mais tarde surgiram alucinações visuais e auditivas: “ele se via morto e decomposto, atingido pela peste e pela lepra, com o corpo submetido a manipulações repugnantes e sofrendo os mais assustadores tratamentos”.

Schreber chegou a desejar a morte. Em várias ocasiões, tentou suicidar-se. Com o tempo, as ideias delirantes coloriram-se de misticismo: relações diretas com Deus e aparições milagrosas. Então, ele iniciou sua caminhada no misticismo através de sua própria concepção de ordem do universo.

Os sintomas de Schreber

Schreber dizia que o homem era um ser em dualidade, que se constituía de corpo e alma, alma essa situada nos nervos. Já Deus é, para ele, uma infinita massa de nervos, sendo assim, composto somente de alma.

Os nervos de Deus são denominados de “raios”, e são a partir deles que Deus consegue criar todas as coisas. Ele se destitui de parte de seus nervos e os molda à sua vontade, criando o que quiser a partir disso.

Ao homem, após sua morte, faz-se a reabsorção de seus nervos utilizados, nunca os perdendo. Ele se contentava com esse ciclo de molde e reabsorção de seus nervos divinos, apesar de hora ou outra se conectar com os homens atrás de sonhos e inspirações. Em tais casos, ele apenas se conectava a seus nervos, sem os absorver. Essas intervenções, boas ou más, eram chamadas de “milagres”.

Os parâmetros para a perseguição divina à Schreber se inicia em sua falha de modelo: em algumas circunstâncias, por motivos inexplicáveis, ocorre de os nervos do homem, devido à sua grandiosa excitação, atraírem para si os nervos de Deus, se conectando a ele de forma forçada e irreversível, comprometendo a própria existência de Deus.

A transformação física e psíquica

Em seus delírios, o mesmo se conectou de forma irreversível com Deus, absorvendo para si os seus conhecimentos. Percebendo tal feito, Deus conspira contra Schreber, para sua aniquilação física e mental, ou pelo menos a sua distração para que seus conhecimentos não se espalhem.

Por fim, para o bem da humanidade, consentiu em ser mulher de Deus. Sua transformação em mulher foi através da emasculação, e aos poucos ele realmente aceitou sua transformação em mulher, assim ele declarou que gozava da sensibilidade sexual de uma mulher e adotou atitude feminina.

Sua pele adquiriu maciez particular do corpo feminino, e os nervos da volúpia concentraram-se especialmente em seu peito, no lugar em que ficam os seios da mulher.

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    O paciente e sua visão do sagrado

    O objetivo de sagrado de Schreber ao aceitar ser mulher de Deus, foi um projeto de escala universal: a criação de uma nova humanidade, “uma nova raça de homens, nascida do espírito de Schreber.”

    Em 1993, oito anos depois ele teve nova crise. Essa crise constava de sonhos e delírios e o tratamento aconteceu, também, na clínica do professor Flechsig.

    Lá ele esteve internado por 8 anos e foi um período que não temos informações sobre o tratamento executado nem sob qual diagnóstico o professor o atendeu.

    Schreber cita o Dr. Flechsig como personagem dos seus delírios e o coloca como participante de um complô para destruí-lo. Se referindo a isso ele usa a expressão “assassinato da alma” e também insinua que as ideias de Flechsig, quanto a ele, não são puras, pois, segundo ele, Flechsig não conseguia mais olha-lo nos olhos.

    Essas são as referências que nos dão ideia do atendimento recebido por Schreber nesse período.

    Após a segunda internação e alta, por quatro anos, Schreber esteve sem tratamento e se mudou para outra cidade, mas teve uma última recaída que o levou à nova internação e que perdurou até a sua morte em 1911. Nada foi citado sobre o tipo de atendimento nesse período de internação.

    O caso Schreber e o inconsciente

    Os sintomas apresentados pelo paciente tratam-se de uma “comunicação” do inconsciente para com o contexto externo, interpretados como pistas para o alcance do diagnóstico.

    Sabe-se que as alucinações, paranoias e devaneios não “surgem” sem um motivo. Acontece que o material bruto pode ter sido recalcado, como um mecanismo de defesa das estruturas psíquicas.

    Sob essa perspectiva, Freud propôs a ideia de uma coerência específica a ser detectada num delírio. Através da teoria da libido, pode-se dizer que o paciente apresentava traços:

    • paranoicos (sentimento de perseguição e destruição) e
    • esquizofrênicos (alucinações e delírios abstratos): o que Freud chamou de “parafrenia”.

    O caso Schreber não teve qualquer tratamento por parte de Freud, que, apenas, posteriormente, considerou os escritos de Schreber como base para o desenvolvimento de seus estudos e teorias sobre Pulsões, Narcisismo e Psicose.

    Como se explica o caso Schreber?

    Todo delírio de Schreber é uma tentativa de compreensão. Seja pela sua projeção transgressora paterna ou a irrupção feminina. Seu delírio, embora aparente consolidar estruturas complexas, acaba por ser uma construção fictícia daquilo que se compreende com certeza absoluta.

    Diante disso, conclui-se que o caso de Schreber remete a uma regressão ao narcisismo primário. Pode-se apontar que o paciente rejeitara novas percepções do mundo externo e criara um mundo interno para atender os seus desejos inconscientes.

    A redenção da humanidade através da união com Deus passa a ser, para ele, o objetivo necessário, embora impossível de datar o prazo indeterminado que manteve o delírio presente em sua vida.

    Este artigo sobre o Caso Schereber foi escrito por Rita de Cássia Moreira Jubini, possui graduação em História pelo Centro Educacional São Camilo, Cachoeiro de Itapemirim, ES. É pós-graduada em História, pela FAVENI, ES, atualmente, é estudante de Psicanálise através do Instituto Brasileira de Psicanálise Clínica. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6176429932584022.

    2 thoughts on “O caso Schreber na visão da Psicanálise

    1. Gilberto Mazoco Jubini disse:

      Texto lucido e esclarecedor. Parabéns pelo excelente trabalho.

    2. Romulo Caixa Ferreira disse:

      Se o paciente não fosse religioso, como seriam seus delírios? Talvez nem tivesse delírios! Bom artigo!!!

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