Vamos falar de dor nos relacionamentos humanos. O que esta dor fala sobre nós mesmos e sobre a pessoa amada?
Eu gostaria de iniciar este artigo, amigo leitor, com um trecho retirado da literatura do autor Paulo Coelho: “Existem certos sofrimentos que só podem ser esquecidos quando podemos flutuar por cima de nossas dores.” O autor discorre sobre o sofrimento, esquecer o sofrimento, conforme Paulo Coelho, é, digamos assim, flutuar, tomar um certo distanciamento da dor.
O Santuário da Dor nas Relações
Ninguém gosta da dor, ela provoca um mal-estar no sujeito, enfim, entretanto são noções que o ser humano possui sobre a dor. O ente está mais familiarizado com a dor corporal que é ocasionada por um ferimento. Mas e a dor psíquica?
Ela não necessita da epiderme humana, não, o desencadear da dor psíquica não depende da matéria humana. Quando o assunto dor emocional é mencionado, sua localização possui outros contornos, ou seja, é um rasgo na relação com o outro. É a disjunção entre o que ama e o que é amado, uma espécie de quebradura causada por um afeto.
O espaço imaterial é testemunha do rompimento, isto é, a dor psíquica. É como atravessar um limite repentinamente, uma desestruturação na ligação entre dois seres.
Dor psíquica
A dor psíquica proporciona um cenário brutal no sistema psíquico do ser humano, o prazer é suprimido e a comoção constitui extensões consideráveis no emocional. Tal dor não realiza movimentos silenciosos, porém a consciência busca elucidar tamanha dor.
Dor que se traduz em trauma, em outras palavras, uma experiência emocional desagradável. É torturante porque a dor é sentida pelo eu, ele sofre a agrura da intensidade abominosa do afeto.
O eu entra em desespero, no entanto enquanto eu escrevo este artigo, lembrei de Sigmund Freud, sobre o rompimento da relação amorosa, ele afirmou: “é a perda do ser amado ou do seu amor.” É o aniquilamento do bem- querer, em outras palavras, do amado.
Visto que do amado emana inúmeras branduras: proteção, cumplicidade, bem- estar, etc. É uma simultaneidade que tem por objetivo o resguardo diante das dores.
Entretanto a perda do ser amado provoca no sujeito uma profunda consternação, mas quando o amor do amado é perdido, uma ferida no psíquico é aberta, sensível aos ventos da pulsionalidade.
Significado de dor nos relacionamentos (segundo a psicanálise)
A dor é uma atitude reativa diante da atribulação. É o eu que constitui defesas perante à contrariedade que toma conta do espaço psíquico.
A dor é a tradução do sentimento de consternação e o eu, diante de tal cenário, procura elaborar a imagem do objeto ou do ser amado.
Sendo assim, a imagem elaborada pelo eu e a viva configuração do ser amado no psíquico produz a dor. A dor acontece porque o afastamento daquele que se ama é percebido. É interessante fazermos um adendo sobre o assunto dor, amigos leitores: quando a dor se manifesta no corpo da pessoa, ocorre uma intensidade de recursos na área machucada.
Mas quando a dor é de teor psíquico, ela incide na representação da pessoa que se ama, isto é, desaparecida ou afastada. O psíquico humano carrega inúmeras representações, todavia o sofrimento intenta o eu a focalizar somente na imagem do amado, deixando as demais imagens sem investimento.
Dilaceramento nas relações humanas
Diante das investidas sobre a imagem da pessoa que se ama, o eu fica dilacerado. Ele fica, de um lado, investindo no amor e, do outro lado, ele está ciente do amor que está perdido. Podemos chegar aqui numa conclusão, leitor: não existe nada mais dolorido do que amar e saber que tal ato de amar está perdido para sempre.
É como se o sujeito estivesse por entre a claridade e a escuridão; por entre a visão e a cegueira, enfim, ideal e real.
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Em certas circunstâncias, dependendo como a situação amorosa se desenrolou, o amor pela pessoa é essencial para o eu.
Ele não admite o desaparecimento do amado, ele fica revoltoso, ele coloca todos os seus recursos em imagens do seu amor que foi perdido. Porém o que é investido pelo eu, exponhamos assim, não são imagens, mas estímulos. Pois o eu nega o que foi perdido, ele não admite a partida do amor.
A dor nos relacionamentos e a pessoa amada
A pessoa amada é como um espectro na zona psíquica, ela vive como sendo parte autêntica no espaço do eu.
Os espectros ali passeiam porque eles são partes do desejo do eu. O eu almeja o retorno do amado, ou seja, é o psiquismo procurando descarregar uma tensão. É a instituição do prazer e desprazer, pois o aparelho psíquico sempre parte do desprazer.
Sendo assim, o ser humano procura investir na vida, busca pelo prazer. O homem é um ser carente que ambiciona pela vontade. E o amado é o regulador do desejo, ele assegura o andar do sistema psíquico do sujeito.
- Quando a pessoa está com o seu amado, o seu exterior é contemplado pelas delícias do seu parceiro.
- Mas quando o companheiro não está mais junto, ele passa a viver no interior, entre desejos e fantasias.
Visto que a fantasia tem um papel regulador no desejo, quer dizer, ela organiza o ir e o vir dos fluxos.
A dor ocasiona dramas na vida do indivíduo. É como um santuário, eu coloquei como título deste artigo, de outro modo e retirando o aspecto sacro, é o espaço das turbulências nas relações. Porque o ser humano está imerso em teias de estímulos e os mesmos constituem ações no interior do homem. E as ações exigem uma quantidade xis de energia do psiquismo.
O ser humano e os relacionamentos
O ser humano é um ser frágil, quando ele nasce, ele necessita do cuidado dos pais. Ele é incapaz de sobreviver sem o auxílio do meio externo, sem depender das ações de outros.
O bebê depende de ações para sua sobrevivência, ele precisa de assistência. Apesar disso o lactante esquematiza comunicações, comportamentos, para saciar suas demandas, o choro é um exemplo.
Enquanto que o nenê vai sendo atendido, seu inconsciente vai registrando as situações, não é apenas a perspicácia saciada, mas é a constituição de uma ordem simbólica. E todo esse cenário discorrido acerca do bebê apresenta o seu desamparo diante da vida.
O bebê também é um ente propenso para a dor, diante da hostilidade ele passa pelo processo e desprezar e provável descarga. A dor é parte da vida, é parte da vivência humana com o outro. A dor pode ser rápida ou duradoura, mas quando ela dura por um bom tempo, ela atinge e desorganiza a economia psíquica.
A dor nos relacionamentos com outra pessoa
A dor mostra que o outro, ser amado, é fonte de excitação. O outro é o sustentáculo para os desejos daquele que ama. O amado sustenta as fantasias, torna o sentimento vívido e pulsante no outro.
Ele é o amparo das imagens, uma força geradora de vida em abundância. E é importante frisar: assim como o amado possui inúmeros adjetivos provindos daquele que ama, ele também exerce sua adjetividade para o parceiro, ou seja, um ama o outro.
Mas diante da dor, Sigmund Freud deixou para a humanidade um valiosíssimo instrumento, a fala. É por meio da fala que o ser humano expurga traumas, sentimentos e vivências do passado. A fala produz cura, o que está recalcado vem à tona por meio da comunicação.
O falar psicanalítico é conhecido como catarse, isto é, falar daquilo que dói, o famoso colocar para fora. Porque a dor produz sintomas incômodos na vida do ser humano.
A sociedade possui inúmeros caminhos diante da dor, a psicanálise é um deles. O paciente é o indivíduo que traz suas dores como um novelo disforme, cheio de sintomas e bloqueios.
E o psicanalista procura dar forma para o novelo, ele vai constituindo ordem e corporatura para o passado do paciente. A dor é o novelo desordenado que precisa de configuração para chegar ao nó primordial, isto é, as dores primevas do indivíduo. Esquecer um sentimento é flutuar sobre as dores, assim mencionou Paulo Coelho.
Eu prefiro reorganizar da seguinte forma: Rever um sentimento é saber lidar com as dores.
Este conteúdo foi sobre a dor nos relacionamentos humanos foi escrito por Artur Charczuk ([email protected]), pastor luterano no Rio Grande do Sul, psicanalista em formação.
2 thoughts on “Significado de Dor nos Relacionamentos”
A dor relaciona-se ao apego, seja às coisas ou às pessoas. Quando o sujeito exercita a desinvidualização do eu, o desapego, cessa a dor. A felicidade não está no outro, mas no equilíbrio e na paz de espírito construídos dentro de si mesmo. A sociedade capitalista estimula o consumo de objetos e de pessoas em nome da felicidade mas, na verdade, trabalha em prol do desenvolvimento sociometabólico do capital.
Mas que texto encantador, psicanalítico, isto é, a dor como um repertório pretérito e guardado para as cicatrizes futuras. A dor é um eco do passado, o já sentido pede licença para o que vai sentir. É bem como Freud havia dito, Artur: “não há indivíduo, mas dividido.” O apego nada mais é do que cenas do passado, acho que estou vivendo, mas já vivi, não há novidade no mundo moderno, hehehe. Apego rima com desapego, em outras palavras, eu me apego, mas o pretérito me concede experiências de desapego no passado; me desapego com experiências do apego do passado. Nossa! Escrevi bastante. Acho que dói, mas a dor é de algo que já doeu, parece psicanálise com poesia. Aguardo o próximo texto, psi Artur.